Servidores enfurecidos apedrejam o Congresso

Brasília – Brasília foi tomada ontem por uma multidão de 50 mil servidores enfurecidos contra a reforma da Previdência, aprovada pela Câmara em primeiro turno, na madrugada. Eles fizeram o enterro simbólico do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, promoveram cenas de violência, tentaram invadir o Congresso Nacional e apedrejaram suas vidraças.

A marcha dos servidores contra a reforma da Previdência foi aberta de manhã por filiados à Federação das Associações dos Servidores das Universidades Federais, que carregavam dois caixões, simulando enterro simbólico do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um segundo caixão tinha as fotos dos ministros da Fazenda, Antônio Palocci, da Previdência, Ricardo Berzoini, do Secretario de Comunicação, Luiz Gushiken, e do chefe da Casa Civil, José Dirceu.

A multidão se aproximou do prédio do Congresso Nacional por volta das 14h, quando subiu a rampa para invadir a Câmara. Do alto de um carro de som, o comando dos servidores tentou contê-la. A tropa de choque da Polícia Militar se posicionou para evitar a invasão. Simultaneamente, os manifestantes quebraram vidros com pedras e cabos de bandeira, depois correram para o gramado que cerca o Congresso. Os manifestantes que conseguiram entrar na Câmara foram barrados pela segurança da Casa, quando chegaram ao Salão Negro. No confronto, dois seguranças da Casa e dois manifestantes saíram feridos. Um fotógrafo também se feriu.

A Polícia Militar destacou 1.500 homens para patrulhar a marcha. Após expulsar os manifestantes da rampa, a PM colocou uma grade e fez um cordão de isolamento para impedir novas invasões. A PM estima que cerca de 50 mil pessoas participaram da marcha. Os deputados federais Luciana Genro (PT-RS) e Babá (PT-PA) subiram em um dos três trios elétricos presentes. “O dia de ontem foi o mais triste para a população brasileira”, disse Babá, após manifestar surpresa por uma votação “na calada da noite, para não enfrentar a manifestação dos servidores”.

Depois dos tumultos, em pronunciamento antes da abertura da sessão no plenário, o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), classificou o quebra-quebra do Salão Negro do Congresso de crime intolerável e antidemocrático. João Paulo disse que o ato foi praticado por um grupo de servidores desgarrado da marcha contra a reforma da Previdência. “Este poder não pode se calar diante de minorias, muitas vezes histéricas e descontroladas”, disse. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também se manifestou, classificando de “vandalismo irresponsável” a tentativa de invasão do Congresso Nacional e a quebra de vidraças do prédio por parte de um grupo de servidores públicos. Ele disse que esse tipo de ação tem de ser “rechaçada com vigor”. Por meio do porta-voz André Singer, Lula manifestou “solidariedade ao Congresso Nacional”.

Base apressa itens polêmicos

Brasília

– Os pontos polêmicos que não foram definidos na votação da madrugada de ontem e que estavam previstos para serem avaliados na semana que vem, seriam votados ainda ontem. Pelo menos esta era a intenção do governo. Os destaques e as emendas aglutinativas visam alterar pontos específicos da reforma da Previdência. A decisão foi tomada após reunião dos líderes da base e o ministro da Casa Civil, José Dirceu, no Palácio do Planalto.

Dirceu e os líderes decidiram que iniciariam a votação pelas emendas aglutinativas. O motivo é que nesse tipo de votação, cabe aos opositores da reforma conseguirem os 308 votos para aprovar as emendas. Foram apresentados 13 destaques e cinco emendas aglutinadoras. A maioria trata dos pontos polêmicos da reforma. O PL, que integra a base, defende a elevação do subteto para o Judiciário. Os tucanos querem mudar a regra de transição para a nova idade mínima.

O líder do PSB, Eduardo Campos, afirmou que a aceleração da votação dos destaques seria uma resposta aos atos de violência praticados ontem pelos servidores contra o Congresso. “Vamos começar pelas emendas aglutinativas e, se possível, concluir todo o processo de votação de hoje para amanhã (hoje). Essa é a disposição da base. Nós vamos dar uma resposta aos atos de violência com a votação no Congresso”, disse.

O líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), confirmou a intenção de encerrar a votação na noite de ontem ou na madrugada de hoje. “Se houver tempo hábil, encerraremos a votação nesta noite”, afirmou. A pressa dos líderes era tanta que alguns chegaram a literalmente correr em direção ao Congresso para iniciar logo o processo de votação. No entanto, antes de votar, eles ainda fariam uma nova reunião, desta vez na Câmara.

O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), suspendeu por uma hora, no início da noite, a ordem do dia para realizar a reunião. Havia também uma forte disposição da base parlamentar do governo de ceder de vez aos magistrados, para evitar que a reforma encalhe no STF. Um dos destaques mais polêmicos é o que determina um subteto do Judiciário estadual de 90,25% do salário de um ministro do STF. A proposta aprovada na madrugada de ontem definia um percentual de 85,5%. Outra emenda que desagrada ao governo é a que isenta os servidores inativos da taxação de 11%, na faixa acima de R$ 1,2 mil.

STJ: “Palavra final é do Judiciário”

Brasília – O presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Nilson Naves, disse ontem que “a última palavra sobre a reforma previdenciária será do Judiciário”. O magistrado disse também estar preocupado com o texto aprovado na madrugada de ontem pelo Congresso porque ele poderá ser contestado pelo Supremo Tribunal Federal. “Um coisa é certa: ao final e ao cabo, quem dirá a última palavra sobre a reforma é o poder Judiciário”, disse, ao comentar a polêmica do subteto para o Judiciário nos estados, fixado em 85,5% da remuneração de um ministro do STF. Os juízes reivindicam elevação desse percentual para 90,25%.

“Fixando esses vencimentos em 85,5% irá acontecer uma situação estranha, anômala e até exótica porque um juiz federal poderá ganhar mais do que um desembargador”, afirmou. Após criticar o texto da reforma, o presidente do STJ disse esperar que ele seja modificado no Congresso por meio dos destaques e emendas aglutinativas, que deveriam ser votados ainda ontem.

“Nós esperamos e confiamos no Parlamento brasileiro. Nós não podemos perder a fé neles de maneira nenhuma e não vamos perder. A nossa crença e a nossa esperança está depositada lá. Nós sabemos perfeitamente que não seremos decepcionados”, disse. Naves evitou, no entanto, comentar a constitucionalidade do texto. Também negou que uma decisão do Judiciário sobre um assunto seria um favorecimento, uma vez que haveria o julgamento de ação de interesse do próprio poder.

O presidente do STJ disse também que foi quebrado um acordo verbal com ministros das áreas econômica e política pela manutenção do subteto em 90,25%. “Isso é preocupante porque não podemos desajustar a magistratura dos Estados. Isso leva a um desequilíbrio”, disse.

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