Caso Richthofen: todos condenados

Foto: Marcelo Alves/Futura Press

Suzane von Richthofen: de jovem rica a condenada.

Depois de 3 anos, 8 meses e 22 dias do assassinato de Manfred e Marísia von Richthofen e de mais de 50 horas de julgamento dos acusados do crime, o juiz Alberto Anderson Filho, do 1.º Tribunal do Júri, leu as oito páginas da sentença às 2h09 de ontem. A filha do casal, Suzane, foi condenada a 39 anos e 6 meses de prisão (19 anos e 6 meses pela morte do pai e o mesmo tempo pela morte da mãe) e 6 meses por fraude processual (revirou a casa para simular um latrocínio). O ex-namorado dela, Daniel Cravinhos, foi condenado à mesma pena. E o irmão dele, Cristian, terá de cumprir 38 anos e 6 meses de prisão – 18 anos e 6 meses por assassinato, 1 ano pelo furto de jóias do casal e 6 meses pela fraude.

Em relação à morte de Manfred, os jurados quase absolveram Suzane, condenada por 4 votos a 3. Quanto à de Marísia, o placar foi de 6 a 1. Os Cravinhos foram condenados por unanimidade nos dois casos. Jurados reconheceram as três qualificadoras para todos os réus – motivo torpe (Suzane queria a herança dos pais e os Cravinhos, dinheiro), meio cruel (barras de ferro e asfixia de Marísia) e recurso que impossibilitou a defesa da vítima (o casal dormia quando foi atacado). Entenderam também que havia circunstâncias atenuantes para os três: eles confessaram o crime e Suzane tinha menos de 21 anos na época do assassinato.

Após o julgamento, os Cravinhos foram para a Penitenciária 2 de Tremembé. Os pais, Astrogildo e Nadja, foram falar com o juiz. ?O resultado foi melhor do que eu esperava. Muito obrigada?, disse a mãe. ?Força para os senhores?, respondeu Anderson. ?Eles fizeram uma grande besteira, mas posteriormente são pessoas que se acertam?, completou. ?É, um dia passa?, suspirou Nadja.

Réus confessos, os três permaneceram impassíveis durante o veredicto. Ao lado do juiz, a pesquisadora de homicídios Ilana Casoy ficou de frente para os réus. ?Ninguém esboçou reação. Estavam respeitosos, de cabeça baixa.? Segundo Ilana, a posição dos três foi simbólica. ?Há quase quatro anos, Daniel sempre ficava no meio de Suzane e Cristian. Em todas as audiências, tudo. O momento da sentença foi a primeira vez em que Cristian estava no meio. O casal, finalmente, quebrou.?

Suzane foi para o Centro de Ressocialização de Rio Claro, onde cumprirá pena. Antes de sair do fórum, despediu-se do advogado e protetor, Denivaldo Barni. ?Você vai me visitar logo??, perguntou. ?Vou, daqui a algumas horas?, respondeu Barni, referindo-se ao dia de visitas, hoje. Segundo o advogado Alberto Toron, assistente de acusação, o tio de Suzane, Miguel Abdalla, sentiu-se ?confortável? com a condenação.

?Pensei que ia ser absolvida?

São Paulo (AE) – O crime que abalou o País teve um julgamento à altura. Durante cinco dias, Suzane von Richthofen, a garota loira que confessou ter tramado a morte dos pais a golpes de barras de ferro junto ao ex-namorado, Daniel, e o irmão dele, Cristian, ficou sentada numa cadeira com os cabelos no rosto, a cabeça baixa, os pulsos algemados e um rosário nas mãos. Diante de promotores que a acusavam de ser uma mulher fria, o cérebro por trás de um crime macabro, e de uma defesa disposta a mostrá-la como uma moça ingênua exposta às más influências do ex-namorado, Suzane foi dissecada.

Na manhã de ontem, Mauro Otávio Nacif, o advogado que defendeu Suzane no júri, contou detalhes da reação de sua cliente nos bastidores. Acompanhe o comportamento da jovem na sexta-feira – o quinto e último dia do julgamento.

Antes de entrar no plenário, Suzane abraçava os advogados e os integrantes da família de Barni. Sentada na cama de sua cela, puxou a beca de Nacif e disse em seu ouvido: ?Me faz voltar para casa??. Ouviu a resposta: ?Tudo o que for possível será feito, Suzane?. Depois de pentear os cabelos, foi levada para o plenário. O julgamento começou e, ao ver que teria que mudar para o meio do plenário, chamou Nacif e disse: ?Vão me levar lá para o meio! O senhor fica do meu lado??. O advogado respondeu que não seria preciso, porque ele queria ficar no lugar reservado à defesa estudando o que os promotores diziam. A acusação começou sua fala. Quando o promotor Nadir de Campos começou a levantar a voz com Daniel, até fazê-lo chorar, Suzane olhou para o advogado e fez um sinal com as mãos algemadas, chamando por ele. Nacif andou pelo plenário, ficou ao lado da cliente a abraçou a cabeça dela. Suzane o puxou pela toga e disse em seu ouvido: ?Tá vendo? Tá vendo??. Depois que Daniel, aos prantos, deixou o plenário, o promotor olhou para Suzane, mas não disse nada. Ela cochichou mais uma vez para o promotor: ?Obrigada?. O assistente de acusação, Alberto Toron, começou sua fala. Suzane chamou outra vez o advogado e disse: ?Ai, doutor, me deixa voltar para casa…?. No intervalo, Suzane repassou com a equipe de defesa o argumento de que ela era apaixonada por Daniel até o dia 4 de julho de 2003, quando os dois foram levados para a mesma carceragem do Fórum e Daniel teria a chamado da outra cela para instruí-la a dizer que ela havia sido estuprada pelo pai. De acordo com Nacif, foi a própria Suzane quem insistiu para que essa história fosse contada aos sete jurados que decidiriam seu destino. O advogado tentou mostrar ao júri um mapa da carceragem rabiscado em um quadro. Depois dos protestos da acusação, o juiz Alberto Anderson Filho permitiu apenas o relato do caso. Nacif começou a contar como Daniel teria dito a frase e pediu um tempo para perguntar a Suzane durante quanto tempo ela ficou na carceragem. ?Meia hora, doutor!?, disse ela, animada, ao seu ouvido. Nacif perguntou aos jurados se eles queriam ir até a carceragem checar se o diálogo seria possível. Um deles disse que sim, A sessão foi temporariamente suspensa e Suzane levada de volta à sua cela. No caminho, passou por Barni e murmurou: ?Valeu! Valeu!?. Na volta da inspeção, Nacif encerrou a defesa citando uma relação de coisas que Suzane diz que pagava para Daniel – como uma das provas de que ela teria situação de submissão com o ex-namorado. Suzane fez um sinal de aprovação. Já em sua cela, disse a Barni e Nacif: ?Viu como eu tinha razão na carceragem??, e ficou animada com o fato de um dos integrantes do júri ter topado ir até o lugar conferir a sua versão. Depois da fala da defesa, os promotores não pediram réplica – fato raro nos julgamentos de repercussão – e os os sete jurados foram para uma sala ao lado decidir o destino dos acusados.

A decisão do júri durou pouco menos de uma hora. Assim que foram informados do resultado, os advogados de Suzane cruzaram o plenário e foram até a cela onde ela estava esperando de pé. Recebeu a notícia com um choro compulsivo. A cela foi enchendo de gente. Além dos três advogados e da estagiária que ajudou na defesa, chegaram os dois filhos de Barni e uma amiga da família. Todos ficaram alguns minutos em silêncio, enquanto Suzane perguntava: ?E agora??. Ao ser avisado do tempo da pena (39 anos e seis meses), Suzane caiu outra vez em um choro compulsivo. Já sabendo do veredicto, ela foi levada a plenário para ouvir a pena, perfilada ao lado de Cristian e Daniel. De pé, de cabeça baixa e com os cabelos caindo sobre o rosto, não chorou. De volta à cela, pouco antes de ser levada para o presídio de Rio Claro, disse: ?Pensei que ia ser absolvida?.

Em 2009, trio pode ir para o semi-aberto

São Paulo (AE) – Suzane von Richthofen já cumpriu pena de 3 anos e 9 meses, assim como os irmãos Cravinhos. Em tese, eles terão direito a pedir para progredir para o regime semi-aberto após o cumprimento de um sexto da pena. No caso, faltariam 2 anos e 7 meses. Muitos juízes paulistas, no entanto, não têm concedido o benefício para autores de crimes hediondos, como é o caso deles. É impossível prever. Se o juiz negar o pedido, eles poderão recorrer ao Tribunal de Justiça, depois ao Superior Tribunal de Justiça e, por último, ao Supremo Tribunal Federal. O promotor Nadir de Campos explicou que autores de crime hediondo só têm a saída da cadeia garantida depois de cumprirem dois terços da pena.

Havia uma preocupação de que a defesa pudesse pedir a anulação do julgamento. Mas o advogado da jovem, Mauro Otávio Nacif, garantiu que vai apelar da sentença apenas para pedir a diminuição da pena. ?Não tem novo júri (desse caso) nunca?, disse, enfático. Os defensores afirmaram que o tempo de defesa de seus clientes foi insuficiente para provar suas teses. ?O tempo foi decisivo. Foram três horas de acusação e nós só tivemos uma hora e meia. Se tivéssemos mais tempo, conseguiríamos a absolvição?, disse o advogado Mário Sérgio de Oliveira. A advogada Gislaine Jabur, representante dos Cravinhos, admitiu que a condenação era prevista, mas também reclamou. ?Só sinto que meu pai (Geraldo Jabur) perdeu 45 minutos da fala dele para o dr. Nacif. No fim prejudicou bastante.?

?Eu esperava mais?, disse o promotor Roberto Tardelli sobre o tamanho da pena. Perguntado se vai recorrer, disse que vai ?avaliar a relação custo-benefício?. ?A sociedade pode voltar a dormir em paz, tranqüila, porque a assassina está atrás das grades?, disse Nadir. Sobre a reação da jovem à condenação, disse que ela é ?praticamente alheia à realidade?.

Nadir disse que ficou convencido do arrependimento dos Cravinhos ?A reação é daqueles jovens que percebem que mesmo primários, sem antecedentes, fizeram uma besteira: um por causa de amor e outro por causa de dinheiro.?

Para irmãos, as punições foram justas

São Paulo (AE) – O advogado Geraldo Jabour, que defendeu Daniel e Cristian Cravinhos, revelou que os irmãos foram transferidos ontem, sob escolta policial, para a Penitenciária de Tremembé, no interior do estado, onde deverão cumprir a condenação. Em relação à reação dos réus, o advogado dos Cravinhos afirmou que seus clientes ?agradeceram ao trabalho dos dois advogados e entenderam que essa punição era justa?.

Já o advogado de Suzane, Mário Sérgio de Oliveira, alegou que a defesa teve apenas uma hora e meia de espaço de explanação enquanto a acusação explanou durante 3 horas. ?Se a defesa tivesse o mesmo tempo, com certeza, ela (Suzane) seria absolvida?, afirmou.

Preso cumpre no máximo 30 anos no Brasil

São Paulo (AE) – O julgamento de Suzane von Richthofen e dos irmãos Daniel e Christian Cravinhos, réus confessos do assassinato do casal Marísia e Manfred von Richthofen, que durou cinco longos dias, é apenas um dos parâmetros para saber quanto tempo eles permanecerão presos. Por maior que seja a sentença, no Brasil uma pessoa pode ficar presa por, no máximo, 30 anos em cada condenação.

Mesmo em se tratando de crime hediondo, ainda há meios de reduzir o tempo de cadeia a dois terços do decidido pelo juiz. Dessa conta final, ainda serão deduzidos 3 anos e 9 meses que os três já cumpriram desde que confessaram o assassinato dos pais da garota, incluindo os meses – um ano, no caso de Suzane – que foram passados em casa, em prisão domiciliar. ?Pena é diferente de tempo na cadeia?, explica o criminalista Sergei Cobra Arbex, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Depois que os condenados vão para a prisão, os advogados podem pedir a progressão da pena para regimes mais amenos. Em um crime comum, com apenas um sexto da pena cumprida, o criminoso pode conseguir evoluir para o regime semi-aberto, em que sai para trabalhar durante o dia e volta para o presídio para dormir. Com um terço, o benefício pode ser a liberdade condicional. Em crimes hediondos, a progressão é permitida só após dois terços do tempo atrás das grades. O sentenciado tem de comprovar bom comportamento.

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