As multas do orçamento

Dizendo ter a certeza de que o próximo prefeito terá “um orçamento digno e em conformidade com os interesses da população”, o prefeito Cassio Taniguchi encaminhou à Câmara Municipal de Curitiba a proposta orçamentária do município para 2005. Segundo o documento que vai agora à análise dos vereadores, a previsão é de que entrem nos cofres públicos por diversos caminhos a importância de R$ 2 bilhões e 425 milhões, que serão gastos em importantes obras para a cidade. A área social – como é moda dizer – estará no centro de tudo.

Na divulgação do encaminhamento feito, a atual administração fez questão de enumerar com riqueza de detalhes as obras previstas para execução no próximo (e demais próximos) ano, com destaque para o Eixo Metropolitano de Transporte – saudado como a maior avenida de Curitiba, que ocupará o trecho urbano da BR-476 (ex-BR-116), com 22 quilômetros e passando por 23 bairros. A maior parte dos custos desta obra será coberta com dinheiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID. Na peça encaminhada à Câmara, Taniguchi incorporou, segundo mandou divulgar, boa parte das 2.100 sugestões levantadas pela população durante audiência pública para elaboração do orçamento realizada nas oito regionais da cidade.

Quase coincidente com o debate sobre o novo orçamento, foram também divulgadas novas normas para o pagamento do IPTU do próximo exercício, que, se feito logo no início do ano e de uma só vez, gozará de desconto de 20% sobre os valores lançados. Entretanto, os contribuintes precisam ficar de olho na data de 20 de novembro: quem não estiver em dia com o imposto até lá, relativamente ao atual exercício ou anteriores, ficará impedido de gozar do desconto oferecido para 2005. A regra vale para os 530 mil imóveis residenciais e não residenciais de Curitiba, excetuando-se os mais de 58 mil isentos do IPTU, imposto que, segundo a proposta orçamentária, seria responsável pela arrecadação de cerca de R$ 180 milhões.

É aqui que surge uma intrigante curiosidade que, inclusive, já chamou a atenção de alguns vereadores, como o veterano Jorge Bernardi (PDT): enquanto o IPTU – um imposto tradicional que, ao lado do ISS – Imposto sobre Serviços, está entre os de maior peso na composição do orçamento, não chega a duzentos milhões de reais, só em multas (e aí entram com maior peso as multas de trânsito) a peça orçamentária prevê uma arrecadação em torno de setenta milhões de reais. Tal valor dividido pelos 365 dias do ano, dá uma média de R$ 190 mil por dia, importância que representa quase 5% da arrecadação direta do município e é obtida de forma nem sempre fora de contestação por parte das vítimas-contribuintes.

Nem se analise aqui o fato de um recurso incerto e não sabido (diferentemente do IPTU, que todos os proprietários de imóveis são obrigados a pagar, uma multa é, sempre, algo imprevisível) já ter passado ao rotineiro status de “receita orçamentária”. Fique-se apenas no montante que a rubrica representa frente a outras rubricas como esta do IPTU, de cujo valor estimado significa quase a metade. E se imagine quantas vezes já se tem dito e reafirmado, inclusive em campanhas políticas como a última que passou, que é preciso acabar com a “indústria das multas”, principalmente as do trânsito.

De duas, uma: ou a população está atingindo altos níveis de desobediência às normas estabelecidas, ou, como é mais fácil supor diante do que já é público e notório, está havendo abuso do poder público na imposição do castigo, com a finalidade principal de arrecadar e não de educar, como é sempre de sua obrigação. Neste caso espera-se que a peça orçamentária, realizada antes de conhecidos os resultados eleitorais, seja profundamente analisada para ser adaptada aos novos tempos. Afinal, uma das promessas do novo prefeito é acabar exatamente com essa “indústria das multas” com radares postados estrategicamente para apanhar incautos, nem sempre transgressores ou cidadãos que procurem colocar a sua e a vida dos outros em risco. Isso também é – para estar na moda – propugnar pelo social, interesse maior da população que exprimiu seus anseios através do voto ainda fresco.

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