Algemas no orçamento

Colocar algemas nos orçamentos da União, dos estados e dos municípios pode ser uma eficiente providência para reduzir os desvios e negociatas com o dinheiro do povo. A idéia surge com força, impulsionada por muitos dos poucos políticos honestos que ainda existem, principalmente pela candidata à Presidência da República pelo PSOL, senadora Heloísa Helena. Ela não usa sua idéia como discurso de campanha e sim como intervenção de representante do povo no Congresso, o que lhe dá maior credibilidade. E outros políticos, de outras agremiações, inclusive seus adversários, abraçam a mesma idéia.

A proposta é que se legisle de forma a que o orçamento seja uma lei de meios única, que estime a receita e fixe a despesa e que, na forma (e no quantum) em que for aprovado, seja obedecido. É lei e, muito embora a receita seja uma mera estimativa, a verdade é que a despesa consignada flui desde a elaboração até a aplicação dessa lei de meios, atendendo com facilidade e irresponsabilidade a apetites eleitoreiros e interesses escusos de parlamentares que a emendam.

Votado e promulgado, o orçamento é uma lei e como tal precisa ser algemado, para que não fuja aqui e ali dos objetivos para os quais foi feito. O que acontece no Brasil, e desde sempre, é que nos orçamentos cabem emendas de parlamentares que atendem aos seus interesses paroquiais ou eleitoreiros. O parlamentar apresenta uma emenda destinando tanto de dinheiro do orçamento, portanto do povo, para uma prefeitura, um órgão, uma entidade ou seja lá o que for que lhe interesse para obter apoios político-eleitorais. Ou faz, como se verificou no escândalo dos anões do orçamento, emendas que não têm outro objetivo que embolsar o dinheiro do povo, sob o pretexto de ajudar esta ou aquela instituição, este ou aquele projeto. A grande maioria dessas emendas parlamentares sequer se transforma em realidade. Desde que apresentadas e até que sejam aprovadas, servem para uma descarada propaganda política. Mente-se ao eleitorado que se está trabalhando por ações e obras públicas que não serão realizadas.

O caso mais recente e ainda presente é o espantoso e gigantesco escândalo da máfia dos sanguessugas. Nele, através de emendas geralmente frias, mal-intencionadas e instrumento de maracutaias, praticou-se enorme negociata com a compra superfaturada de ambulâncias para quase mil prefeituras e outras entidades. E, nesse caso, o dinheiro saiu do orçamento da União, dos bolsos do povo, pois não é atualmente engessado. Saiu porque a empresa fornecedora das ambulâncias, os parlamentares que apresentaram as emendas, funcionários corruptos e corrompidos, prefeitos e outros mais pertencentes ao bando, embolsaram dinheiro.

O engessamento do orçamento, como lei que tem de ser cumprida na íntegra, inadmissíveis emendas interesseiras de parlamentares, penduricalhos quase sempre desonestos e facilitadores da corrupção, vai tornar tais negociatas praticamente impossíveis. Impossíveis pelo menos por esse caminho facilitado por um sistema tão mole, pantanoso, como o da elaboração da nossa lei de meios.

Voltar ao topo