A medicina piorou?

O Conselho Federal de Medicina divulgou uma pesquisa que realizou em 2002, a maior que já fez, consultando 14.405 médicos. A primeira e importante conclusão é que 62,1% dos médicos brasileiros trabalham nas capitais, embora nelas vivam apenas 23,8% da população do País. Sob o ponto de vista da assistência à saúde, os números confirmam que as faculdades de Medicina derramam no mercado profissionais que vão ficando nas grandes cidades, não trocando o seu conforto pela numerosa clientela desassistida do imenso interior brasileiro. E isso embora nas grandes capitais a remuneração dos médicos venha minguando, obrigando a maioria dos profissionais a se sujeitar a dois ou até mais empregos. A mesma pesquisa revela que médicos entre 45 e 49 anos de idade, 41,2% do total, preferem viver no interior, decisão que foi interpretada como procura de uma vida mais tranqüila que a das grandes metrópoles. Isso é verdade para a maioria das capitais. Mas não é verdade para estados como Acre, Amapá, Roraima e Sergipe. Tocantins, por outro lado, aparece como bastante atraente.

O subdesenvolvimento dessas regiões pioneiras, à exceção do Tocantins, que já revela célere ritmo de desenvolvimento, desencoraja os profissionais da medicina. Sergipe (a pesquisa não explica) talvez não goze da preferência dos médicos por ser um dos estados mais pobres do País.

A análise da pesquisa revela que o SUS (Sistema Único de Saúde) teria gerado mais efeitos negativos que positivos para os entrevistados. Eles apontam piora nas condições de trabalho, em seus rendimentos, na qualidade e na organização dos serviços oferecidos à população. O grande defeito do sistema é que remunera com valores ridículos os médicos. E oferece, à população, uma assistência geralmente menor que a demanda, ocasionando, em grandes centros, falta de serviços ou filas intermináveis para o atendimento.

Embora as críticas dos médicos sejam verdadeiras, o lado mais importante do trabalho é o que trata da situação da clientela.

O Brasil era, é e parece que ainda será por muito tempo um país em desenvolvimento, com largas faixas da população em subdesenvolvimento ou até mesmo na miséria. Há ainda má difusão do bem-estar social, com regiões verdadeiramente pobres. É evidente que interessa a situação dos médicos e quanto melhor se sintam no exercício da profissão e mais sejam remunerados, melhor será a medicina que praticarão. Mas o que interessa primacialmente é a situação dos assistidos e, mais ainda, dos desassistidos, que são em grande número.

Ser médico já foi uma condição de prestígio e status profissional e social. Há algumas décadas, era sempre um homem considerado rico, com ganhos bem acima da maioria dos profissionais. Tal situação conflitava com a miséria da clientela, em especial do interior e das periferias das grandes cidades. Essa situação, enquanto não se desenvolve a medicina social que o SUS intenta, continua, resultando em médicos insatisfeitos e doentes desassistidos ou muito mal assistidos. Isso acontece aqui mesmo, nos arredores e bairros de Curitiba. Não é preciso invocar a situação de Sergipe ou dos estados amazônicos.

O importante é bem atender a toda a população, com maior atenção para os pobres. E isso o SUS, aperfeiçoado, pode resolver. E no seu aperfeiçoamento, cabe seguramente uma melhor remuneração para os médicos e uma mais adequada distribuição espacial dos profissionais da medicina.

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