Viva a voz do samba

No ostracismo há quatro anos, devido à depressão causada pela viuvez, o cantor Roberto Silva retorna com o CD Volta por Cima, um elegante trabalho do produtor José Milton para a Universal Music. Este é seu primeiro disco para a gravadora, após ser fiel à extinta Copacabana de 1944 a 1988, quando gravou trinta elepês.

Roberto Silva, hoje com 82 anos e atarefado em entrevistas para todo o País, na verdade, foi relançado pela gravadora EMI, herdeira do acervo da Copacabana. Há dois anos surgiu o CD com as regravações “e aos poucos fui sendo lembrado”, diz ele do outro lado da linha do telefone. Na prosa e na canção, sua voz está irretocável. Voz de príncipe.

Carioca e com título de cidadão de João Pessoa, ganho no ano passado, Roberto Silva é personagem ilustre da história do samba. Fez seu nome na década de 40 e é ídolo confesso do bossanovista João Gilberto e de seu fiel escudeiro, Caetano Veloso. Volta por Cima, inclusive, traz um dueto de Roberto Silva e Caetano na histórica música Juracy, que Antônio Almeida e Cyro de Souza compuseram e Vassourinha imortalizou em 1941.

Outro fã de carteirinha é Zeca Pagodinho, que no encarte do CD assina o seguinte: “Dos grandes mestres que me foram mostrados em forma de canção, uma das jóias raras ainda se apresenta viva entre nós. Autêntica, intacta, brasileira. Falo de Roberto Silva”.

Outro sangue nobre do samba, Paulinho da Viola, está na lista dos admiradores. “Sou ídolo dessa rapaziada, quando nos encontramos é aquela alegria”, observa o príncipe, refeito da depressão.

“Andei afastado pela morte da minha esposa, com quem vivi por 58 anos”, revela. E atribui sua superação a outro grande amor, a profissão de cantor.

O produtor José Milton aproveitou a deixa e concebeu Volta por Cima, que a Universal vem tratando com muito carinho. “O CD é requintadamente simples”, repara Roberto Moura, doutorando em Música pela Unirio. “Tem arranjos assinados por músicos do calibre de Cristóvão Bastos, Leandro Braga e João Lyra. E tem, nos acompanhamentos, músicos da estatura de um Alceu Maia, um Dirceu Leitte, um Pedro Amorim. Mais que grandes músicos, são cidadãos que fazem questão de preservar o compromisso com a brasilidade – uma brasilidade que não se esgota nas comemorações do penta pelas ruas do País. Quer dizer, se a retaguarda está garantida, a tarefa de ilustrar o quanto há de permanência e vitalidade no samba fica fácil. Quer dizer, fica fácil quando ela está entregue a um príncipe.”

Repertório do CD

1. Notícia (Alcides Caminha, Nourival Bahia e Nelson Cavaquinho), gravação do próprio Roberto Silva, em 1961.

2. Volta por cima (Paulo Vanzolini), original de Noite Ilustrada, 1963.

3. A Rita (Chico Buarque), gravação do autor em 1966.

4. Gosto que me enrosco (Sinhô), por Mário Reis, em 1928.

5. Da cor do pecado (Bororó), gravada por Sílvio Caldas, em 1939.

6. A primeira vez (Alcebíades Barcellos e Armando Marçal), por Orlando Silva, em 1940.

7. Inquietação (Ary Barroso), outro original de Sílvio Caldas, de 1935.

8. Normélia (Raymundo Olavo e Norberto Martins), sucesso de Roberto Silva, em 1949.

9. Meu sonho é você (Altamiro Carrilho e Átila Nunes), com Chiquinho do Acordeon, em 1952.

10. Quem mente perde a razão (Zé da Zilda e Edgard Nunes), gravada por Nelson Gonçalves, em 1942.

11. Bohêmio (Ataulfo Alves, J. Pereira e Orlando Portela), lançamento de Orlando Silva, em 1937.

12. Nova ilusão (Pedro Caetano e Claudionor Cruz), original de Lúcio Alves, em 1953.

13. Juracy (Antônio Almeida e Cyro de Souza), lançada por Vassourinha, em 1941.

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