Sob o domínio da maldade

Zezé Polessa coleciona tipos cômicos. Ela até já fez uma vilã em teledramaturgia. Mas a amarga Firma, da minissérie Memorial de Maria Moura, não chega aos pés de sua atual personagem em A Lua Me Disse no quesito maldade. Enquanto Ester solta, literalmente, os cachorros em cima da mocinha Heloísa, de Adriana Esteves, o máximo que Firma conseguia era atrapalhar um pouco a vida da batalhadora Maria Moura, de Glória Pires. ?A Firma tinha um lado ridículo, era meio caipira e pequena nas maldades. Já Ester é realmente capaz de grandes vilanias?, compara, orgulhosa por estar interpretando, pela primeira vez, uma verdadeira antagonista.

Apesar da empolgação com o papel, Zezé admite que o primeiro contato com a notícia de que faria a vilã-mor da trama não foi tão simples assim. Quando recebeu o convite para a nova novela das sete, a atriz acreditava piamente que iria interpretar, mais uma vez, uma personagem engraçada na tevê. Até porque estar em uma trama de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa é quase sinônimo de personagens para lá de escrachados. Mesmo sabendo que faria uma vilã, ela jurava que a personagem teria pelo menos uma pitada de humor. Expectativa que se desfez com uma simples pergunta para Miguel: ?Em algum momento a Ester vai ficar engraçada, né??. O autor imediatamente respondeu: ?Não. Ela é séria e muito má?. Foi uma grande novidade para mim. Até em termos dramatúrgicos mesmo, pois eu não tenho muitas referências de como fazer uma vilã?, confessa.

 Mesmo com pouca experiência no ramo das atrocidades, Zezé tem razões consideráveis para se dedicar a essa personagem. Ester rompe uma seqüência de personagens leves e extrovertidas na carreira da atriz, como a suburbana Marinelza, de Salsa e Merengue e a perua emergente Amapola, de Porto dos Milagres. E o reconhecimento dessa outra faceta não demorou a aparecer. ?Logo que a novela estreou, minha faxineira disse: ?Nem dormi direito. Fiquei pensando se era você mesma na tevê. Não imaginei que você sabia fazer tantas maldades?, recorda, toda prosa.

P – Como é ser a vilã em uma trama essencialmente cômica?

R – Essa foi justamente a minha maior preocupação. Desde que recebi o convite, fiquei pensando de que maneira a Ester iria entrar no meio de personagens tão excêntricos e engraçados. Confesso que no início do processo de composição sou sempre muito dramática, me sinto no olho de um furacão até conseguir encontrar o tom do personagem. Dessa vez foi ainda pior, pois eu ficava pensando em como inserir a maldade sem destoar do contexto cômico da trama. Por isso, acabei me envolvendo muito com a novela como um todo, como nunca havia feito antes. Leio os capítulos por inteiro e não apenas as minhas cenas ou as cenas do meu núcleo. Mas o que está me ajudando mesmo e me deixando muito confortável é que os autores, nessa novela, estão criando inúmeras situações para a vilã. Ela está realmente atrapalhando a mocinha e muitos outros personagens. Estamos todos indo por um novo caminho.

P – Você gosta de fazer laboratórios para compor suas personagens. Como você se preparou para viver a Ester?

R – É no vilão que a gente faz uma catarse das nossas próprias maldades. É claro que eu não tenho a coleção de vilanias da Ester, mas percebi algumas semelhanças, mesmo que remotas, com ela. A relação com meu filho João, de 23 anos, serviu, de certa forma, como um laboratório. Percebi que faço com ele algumas coisas parecidas com o que a Ester faz com o Gustavo. Também gosto de controlá-lo, de saber onde ele vai, que horas volta. Sei que ele já é um homem, mas muitas vezes não consigo deixar de fazer essas perguntas. Ele, óbvio, não gosta muito de responder. Então, digo que me inspirei em mim mesma para compor a Ester. Além disso, assisti a vários filmes da Bette Davis, como A Malvada e O Que Terá Acontecido a Baby Jane?

Na brincadeira infantil, um sonho por trás do riso

Firma, de Memorial
de Maria…

Zezé Polessa começou a fazer teatro ainda criança. No colégio, encenava peças em datas comemorativas como dia das mães e dos pais ou no final do ano. Na época, Maria José de Castro Polessa ainda não sabia que gostaria de ser atriz, mas já levava a atuação muito a sério. ?As outras crianças achavam que era brincadeira, mas eu sabia que estava fazendo teatro mesmo?, recorda. Zezé nunca mais abandonou o teatro. Fez seguidos cursos de interpretação e atuou em inúmeras peças amadoras e profissionais.

 A entrada na tevê, no entanto, só aconteceu em 1985, na minissérie Tudo em Cima, na extinta Manchete. Esse ano, aliás, foi decisivo para Zezé. Ela descobriu seu talento para a comédia graças ao dramaturgo Mauro Rasi que a convidou para integrar o elenco da peça Família Titanic, de sua autoria. Desde então, a atriz coleciona personagens leves e engraçadas em seu currículo. No mesmo ano, ela participou do humorístico Tamanho Família, também na Manchete.

 Embora não se considere uma comediante, Zezé adora interpretar papéis cômicos. Tanto que, para ela, um dos seus trabalhos mais marcantes na tevê foi uma rápida participação no episódio A Casa Errada, do programa Brava Gente, como a empregada doméstica Francelina. ?Ela era muito engraçada. Entrava na casa errada para trabalhar e imitava personagens da novela O Clone?, relembra, aos risos. A atriz também tem um carinho muito especial pela perua emergente Amapola, de Porto dos Milagres. ?Ela tinha valores totalmente errados e estava longe de ser um exemplo. Mas era muito simpática e espirituosa?, valoriza.

Desviando do caminho

Apesar do gosto pelo teatro, o destino quase levou Zezé para caminhos bem distantes da interpretação. Seus pais queriam que ela estudasse e se formasse e nem sequer consideravam a possibilidade de ter uma filha artista. Quando terminou o colégio, Zezé foi para a Escola Normal. Ela queria ser professora, já que adorava ensinar e lidar com crianças. Mas logo percebeu que aquela não era exatamente a carreira que gostaria de seguir para o resto da vida. ?Queria uma formação mais profunda do que a que eu estava tendo lá. Fiquei meio perdidona?, confessa.

Influenciada por uma amiga que queria estudar Medicina e por um tio médico, Zezé optou por prestar vestibular para Medicina. Começou a estudar, em 1972, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mas, em paralelo ao curso, ela continuou estudando teatro e encenando peças. No quarto ano, resolveu largar a faculdade para se dedicar à atuação mas, como já era de se esperar, foi desencorajada pelos parentes. ?O apelo da minha família para que eu me formasse foi muito forte e eu acabei cedendo. Terminei o curso e hoje acho que foi uma boa coisa?, avalia.

Apesar de ter se formado, não houve quem convencesse Zezé a exercer a profissão. A opção por ser atriz veio alguns anos depois de formada e coincidiu com a gravidez de João Dantas, hoje com 23 anos. ?Foi uma decisão madura baseada no tipo de vida que eu queria, em que atmosfera eu gostaria de viver e com que tipo de pessoas queria estar?, esclarece.

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