Sem prazo de validade

Cada vez mais aproveitadas na teledramaturgia, atrizes acima dos 40 anos ganham força e vencem barreiras que eram ultrapassadas apenas pelos galãs. Se antes, nessa faixa etária, só os personagens masculinos tinham direito a grandes conflitos amorosos – quase sempre com parceiras mais jovens -, hoje a situação é diferente. Em Duas Caras, da Globo, Betty Faria vive Bárbara, uma governanta cinqüentona que se envolve com o marginal Ronildo, de Rodrigo Hilbert, que tem 26 anos. Já em Amor e Intrigas, as cinqüentonas Denise Del Vecchio e Manuelita Lustosa disputam a atenção de Anselmo, vivido por Luís Guilherme. Nos primeiros capítulos de Beleza Pura, trama voltada para questões estéticas, Norma, de Carolina Ferraz, não suportava o fato de Guilherme, de Edson Celulari, tentar conquistar Sônia, interpretada por Christiane Torloni. Sendo que Carolina já completou 40 anos e Christiane, 51. ?As mulheres acima de 40 hoje em dia têm vida própria. São jovens, produtivas e desejáveis. A sociedade brasileira supervaloriza a juventude física?, defende Andréa Maltarolli, autora da história.

Betty Faria concorda com Andréa e se inclui nesse estilo de mulher. A atriz, que se orgulha em ostentar sua excelente forma física aos 66 anos, enxerga como normal o envolvimento amoroso de sua personagem. Mas entende que isso deve ser tratado com seriedade na tela. ?É bom quando fica natural, sem qualquer vulgaridade?, opina. Ricardo Linhares, que assinou com Gilberto Braga a autoria de Paraíso Tropical, na Globo, vai além. ?Quando você coloca uma mulher de 50 anos vivendo conflitos amorosos relativos à sua idade consegue emocionar e ser verdadeiro?, justifica.

Para Fernanda Montenegro, não é novidade ver uma personagem sua longe do padrão de dona-de-casa ou avó que antigamente era dado a uma mulher de 78 anos. Mas a atriz, que interpreta a atirada Iraci na minissérie Queridos Amigos, acredita que uma história como a de sua personagem, em uma trama que tem como pano de fundo a ditadura, adquire um significado especial. ?A mulher venceu vários obstáculos e muitos deles na época da ditadura. Não podemos correr o risco de cair nessa desgraça de novo?, afirma. Eliane Giardini, de 55 anos, engrossa o coro, creditando à sua própria geração muitas das transformações ocorridas hoje na sociedade e na tevê. ?As mulheres da minha idade fizeram uma revolução, quebraram vários valores. É natural que hoje consigamos chegar à maturidade com benefícios. Acho contemporâneo descobrir que existe vida afetiva depois dos 50?, diz a atriz, que viveu a doce Pérola em Eterna Magia, da Globo.

Essa abertura para desenvolver histórias de mulheres mais velhas acaba favorecendo vários autores. Para muitos, é mais fácil desenvolver tramas a partir dos conflitos femininos. Autora de Amor e Intrigas, da Record, Gisele Joras enxerga inúmeras possibilidades para uma mulher de meia-idade. ?As pessoas se juntam, se separam, ganham outros interesses pessoais, amorosos e profissionais?, exemplifica. Gilberto Braga, que se intitula um feminista, também aproveita bem esse espaço em suas obras. Isso sem contar com Manoel Carlos, que quase sempre reserva uma atriz experiente para interpretar a protagonista Helena em suas novelas. ?Nas tramas do Maneco quase todas as cenas são das mulheres. Elas são as verdadeiras estrelas?, explica Regina Duarte, sua última escolhida, em Páginas da Vida.

Mas nem todas as atrizes se sentem agraciadas com essa mudança. Para algumas, as transformações ainda não são suficientes para deixar a sociedade menos machista. Carla Marins, que interpretou a romântica Dorinha em Pé na Jaca, aos 40 anos, reflete sobre isso. ?Homem mais velho é galã, mas a mulher não. A situação já melhorou, mais ainda falta muito. E o nosso trabalho é um espelho da realidade?, contesta. Beth Goulart, que interpretou a amargurada Neli em Paraíso Tropical, também pensa assim, mas acha que a tendência é esse jogo virar. ?A mulher já participa de tantos cargos importantes. Acho que hoje em dia as personagens mais interessantes já são as mais velhas. Não ficam só focadas em questões puramente amorosas?, justifica.

Vaidade artística

Com a idade subindo e a vaidade falando mais alto, algumas atrizes não estão dispostas a envelhecerem para interpretarem determinados papéis. E vão além: desejam ser retratadas como mais jovens em cena. ?Às vezes é complicado convencer algumas mulheres de que elas não podem mais fazer papel de menininhas?, conta a autora Ana Maria Moretzsohn, que escreveu Luz do Sol para a Record no ano passado.

Ricardo Linhares deixa bem clara sua postura sobre o assunto. ?Cada idade tem seus parâmetros e suas limitações. Aos 40 anos, uma atriz não pode se comportar como se tivesse 20?, diz, taxativo. Para Elizabeth Jhin, autora de Eterna Magia, exibida pela Globo no ano passado, o importante é que as mulheres assumam sua idade e se aproveitem bem dela. ?Elas não devem se preocupar em perder os lugares de mocinhas porque seus papéis são até mais estimulantes?, sugere. 

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