São Jorge de Variedades mescla artes em ‘Fausto’

No início desta semana, as diretoras Georgette Fadel e Claudia Schapira quebravam suas cabeças, junto ao cenógrafo Rogério Tarifa, para fazer Fausto se adaptar ao teatro do Sesc Pompeia. A peça, que teve pré-estreia na primeira quinzena do mês no Sesc Santos, durante o festival Mirada, estreia para o público nesta sexta-feira, 26, na casa projetada por Lina Bo Bardi. Cada detalhe era de extrema importância: Georgette se preocupava, por exemplo, com o aspecto do ciclorama (superfície onde se projetam vídeos durante a encenação). “Fausto traz um espírito ‘fáustico'”, diz a diretora, relacionando seu próprio rigor ao comportamento do personagem.

A vontade de montar o clássico do alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749 – 1832) surgiu há cerca de dois anos, quando Georgette leu os esboços e o poema Fausto, Uma Tragédia e teve uma identificação plena. “É uma obra toda emblemática. Cada frase te recoloca, te faz repensar sobre as atitudes”, diz.

Inventiva, a montagem marca os 15 anos da companhia que dirige, a São Jorge de Variedades. Para manter a precisão que o texto exige, Georgette convidou Claudia, do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, com quem divide a direção.

No enredo, Fausto leva uma vida ordinária, até o momento em que percebe que seu comportamento não rendeu frutos como ele gostaria ou imaginaria. Decide, então, fazer um pacto com Mefistófeles, o diabo, em nome dos prazeres mundanos. “Em geral, as histórias mostram uma vida pregressa obscura, que, depois, é iluminada”, diz Claudia. “Aqui o caminho é descendente: ele vem de uma trajetória delicada e vai para o oposto. É por isso que a obra pega tanto.”

Apesar da trajetória relativamente longa da companhia, esta é apenas a segunda vez que o grupo apresenta um espetáculo no formato tradicional de palco italiano (com atores encenando de frente para a plateia). Livres de padrões, os integrantes do coletivo costumam montar as peças de acordo com o que sentem do texto. Em Barafonda (2012), por exemplo, 25 atores e quatro músicos contavam a história do bairro paulistano da Barra Funda, misturada às tragédias gregas Prometeu Acorrentado e As Bacantes. Para tal, ocupavam as ruas, fazendo um cortejo pela região. “No início não sabíamos se dávamos continuidade a esta pesquisa do teatro de rua”, diz Georgette. “Depois resolvemos que seria bom ir para um caminho oposto, para olhar melhor, com mais distanciamento e aí, sim, voltar.”

Ao mesmo tempo em que é limpa, Fausto é uma montagem de elementos grandiosos. Um bom exemplo desse aspecto é a cena em que o protagonista conversa com o diabo sobre as condições do pacto. Os atores montam duas pirâmides de cadeiras de plástico – uma branca, em cujo topo senta Fausto, e uma preta, para Mefistófeles. O acordo é feito no alto, com os personagens falando de igual para igual.

Na maior parte dos seus 150 minutos, a cenografia se mostra maniqueísta: em determinado momento, o palco ganha um piso claramente dividido em vermelho e azul, em uma representação do bem e do mal, do certo e do errado. Sendo um homem de boas intenções que cede às tentações do diabo, é neste cenário que Fausto circula, mantendo o cerne de seu espírito mesmo após selar o pacto.

Formado por seis atores, o elenco se reveza pelos personagens. As dores de Fausto, por exemplo, podem aparecer nas atrizes em corpo enquanto surgem em forma de um coro entoado pelos homens da peça. Em alguns momentos, o protagonista aparece duplicado. Segundo as diretoras, a força que cada ator coloca na interpretação pode sugerir diferentes relações entre Fausto e outros personagens. “A Paula (Klein) faz um Fausto de energia mais forte, quase relacionado ao Mefistófeles”, diz Georgette. “Já o Fausto da Patrícia (Gifford) tem um tom diferente.”

Característica marcante nos espetáculos da São Jorge de Variedades e do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, a trilha da peça é um espetáculo à parte. Claudia musicou excertos do poema de Goethe, adicionando frases sem modificar a dramaturgia. Três músicos acompanham os atores em cinco instrumentos: piano, violoncelo, guitarra, baixo e bateria. “As canções facilitam momentos dramáticos. Às vezes a palavra dita não chega à potência do texto cantado, com a força da banda”, diz Claudia. O vídeo também ganha importância na montagem. Além do ciclorama, ele aparece também em uma cena, dentro de uma televisão. Em vez de servirem como mero apoio, as imagens, bem produzidas, mostram passagens essenciais ao enredo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Voltar ao topo