Racismo abre nova temporada do “Vai Fazer o Quê?”

Você está passando pela praça de alimentação de um shopping center quando, involuntariamente, testemunha cenas de racismo velado entre o pai de uma mocinha loira e o namorado dela, negro. “Vai fazer o quê?”, pergunta Ernesto Paglia, em referência ao nome do quadro que ganha sua terceira temporada no Fantástico, a partir deste domingo, 21. Vai passar reto, já que o assunto não lhe diz respeito, ou vai tomar as dores do rapaz ofendido? A safra da vez prevê cinco episódios, novamente sob o comando do diretor Jorge Espírito Santo.

Além da questão racial, haverá um enredo sobre assédio sexual e, gravados em São Paulo, episódios sobre o uso da água e a ocupação da bicicleta no cotidiano. Precavido contra a cobiça da concorrência, Paglia faz segredo sobre um dos temas.

Vai Fazer o Quê? é uma adaptação do What would you do?, da rede norte-americana ABC, formato que também começou lá como quadro e depois se transformou em programa solo. A Globo prefere poupar a seção de tal desgaste, até para evitar que os transeuntes percam a espontaneidade que têm tido quando tomam a iniciativa de meter a colher no angu alheio.

“A gente aborda as pessoas no momento em que elas acabaram de passar por uma descarga de adrenalina, incomodadas com a situação a que assistiram. Então, elas falam com extrema autenticidade, elas desabafam. E é muito legal a reação que a gente consegue porque são pessoas invariavelmente do bem. Quem se abala para entrar numa discussão alheia só pode ser alguém de extrema boa intenção”, diz ele. “É óbvio que a maioria passa reto, vira o rosto e faz que não viu. Mas tem aquela minoria que se dá ao trabalho, que não engole, não consegue assistir a uma cena visivelmente injusta, de intolerância, sem interferir. Isso nos dá condição de registrar o que tem de melhor no ser humano, no brasileiro, que é a disposição de dar a cara à tapa por alguém que não tem condições de se defender.”

Há aqueles que, ao tomarem conhecimento de que a situação não é real, nem autorizam o uso de sua imagem para o quadro. E tem até quem diga, ao saber que é tudo pura encenação: “ah, mas então é uma pegadinha?”. “Desculpe, isso não é uma pegadinha”, diz, incisivo, o repórter que desmonta a cena, normalmente quando o diálogo esquenta e ameaça se transformar em briga física. A chegada de Paglia, um rosto conhecido do grande público, nessa hora, pesa no arrefecimento da temperatura. Mesmo assim, a equipe sempre sai a campo escoltada por seguranças à paisana. “A situação dos atores ali é muito vulnerável”, diz Paglia.

O quadro consome pelo menos cinco câmeras e uma dúzia de microfones. Cada episódio demora uma semana para ser gravado, fora o período de treinamento dos atores e da edição – áudio e vídeo são gravados separadamente, com apoio de uma unidade móvel. Em cenas de shopping, a equipe só pode trabalhar de madrugada, sempre instalando todo o aparato de fios, microfones e câmeras.

A princípio, Paglia conta que titubeou diante da percepção de que isso não é bem jornalismo. Mas logo veio a certeza de que o formato lhe dá a oportunidade de jogar holofotes sobre situações que nunca frequentam as primeiras páginas de jornais, a não ser quando viram tragédia. “Esses temas só vão para a manchete quando o mendigo é morto, o homossexual é agredido: são situações extremas, é fácil condenar. Mas situações como o racismo do dia a dia, do abuso e da discriminação diária são agressões pequenas, repetidas, que vão amesquinhando a vida, isso é triste. E a maioria dos agressores nem percebe.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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