Pecados íntimos testa padrões éticos

São Paulo (AE) – Mesmo se Clint Eastwood ganhasse seu terceiro Oscar (após Os Imperdoáveis e Menina de Ouro) por Cartas de Iwo Jima, a Academia de Hollywood não estaria premiando o melhor filme de 2006. Os demais indicados dividem os críticos – Os Infiltrados, Babel, temos A Rainha também; Pequena Miss Sunshine seria uma escolha simpática -, mas a verdade é que o melhor filme americano de 2006, se não for A Conquista da Honra, o outro Clint sobre a batalha de Iwo Jima, é Pecados íntimos. O longa de Todd Field estréia amanhã (9). Baseia-se no romance Criancinhas, de Tom Perrotta. Ganhou indicações para melhor atriz (Kate Winslet), melhor ator coadjuvante (Jackie Earle Haley) e melhor roteiro adaptado (pelo diretor e pelo próprio romancista). É maravilhoso.

Todd Field é o diretor de Entre Quatro Paredes, que foi indicado para o Oscar, em várias categorias, anos atrás. Ele fez um filme-coral, um pouco no estilo que Robert Altman adorava (e sabia) fazer – veja-se o exemplo de Nashville -, mas sua referência mais próxima é o Paul Thomas Anderson de Magnólia. São várias histórias que se desenrolam simultaneamente, traçando o retrato de uma comunidade que parece concentrar as virtudes e os defeitos dos EUA. Todos os personagens parecem viver no limite, e são imaturos diante de certas situações que desafiam padrões éticos até de ?normalidade?. São várias histórias de casais (nem todas) e o que une todos os personagens é a sua solidão, mesmo quando parecem estar no centro de intensos processos de comunicação.

Kate Winslet faz uma mestra em literatura desempregada. Casada com um executivo, ela passa os dias no parque, com a filha, cercada de vizinhas cujas vidas infelizes as levam a fantasiar sobre o bonitão (Patrick Wilson) que também vive no parque, com o filho. Ele é casado com uma documentarista workaholic (Jennifer Connelly). Inicia um tórrido affair com Kate. E existem as outras histórias. A do policial que persegue o molestador de crianças que acaba de sair da cadeia e vive com a mãe. Há algo de profundamente doloroso no personagem que bem poderia (e até deveria) valer a Jackie Earle Haley o Oscar de coadjuvante, se o prêmio não parecesse destinado ao Eddie Murphy de Dreamgirls – Em busca de um sonho.

De perto, ninguém é normal – como sabe a mãe do molestador, quando grita ao policial que deixe de perseguir seu filho, porque ele também tem uma mancha em seu passado. Jackie personifica o limite do desespero. Todos os personagens parecem ter um lado infantil, mas ele mais do que todos. Jackie – seu personagem chama-se Ronnie – não consegue conter suas pulsões sexuais. Comete um ato radical que provoca a compaixão daquele de quem menos se espera vir. Todd Field gosta dessas histórias sombrias de sexo e morte, nas quais, apesar de tudo, se vislumbra, mesmo na miséria, a grandeza do ser humano. Seu filme tem um roteiro poderoso, sobre o qual Field erigiu uma mise-en-scène (o ato de dirigir) igualmente forte.

Serviço:

Pecados íntimos (Little children, EUA/2006, 130 min) – Drama Direção Todd Field. 16 anos. Cotação: Ótimo.

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