De JK- Juscelino Kubitschek de Oliveira

d71.jpgJuscelino Kubitschek de Oliveira nasceu na cidade de Diamantina, Estado de Minas Gerais, no dia 12 de setembro de 1902. Seu pai João César de Oliveira, que pelo sobrenome Oliveira indica descendência de cristãos novos; trabalhou como lapidador de diamante, caixeiro viajante e no final como fiscal de renda. João César de Oliveira faleceu em 1905 com a idade de trinta e três anos, justamente quando Juscelino, seu filho, ainda não havia completado três anos de idade.

A família de Juscelino por parte materna ascende da região da Moravia, hoje parte da República Checa centrada na Europa Central. Seu bisavô, João Nepomuceno Kubitschek, quando migrante, registrou sua procedência da Boemia, que na época fazia parte do império austro-húngaro. Os checos quanto os da Moravia são um povo dado ao conhecimento científico, vide a velha e aristocrática Universidade de Carlos ou Carolíngia, fundada por Carlos IV (1316-1378) imperador germânico (1346-1378), mais conhecida como universidade de Praga e irmã gêmea da Universidade de Viena/Áustria, também fundada por Carlos IV. Foi em Brno (Brünn) que o monge Johann Gregor Mendel (1822-1884) fez público seus estudos de hibridação de plantas que a partir de 1866 ficou conhecido como "lei de Mendel" (lei da transmissão dos caracteres hereditários). Na Universidade Carolíngia também exerceu o magistério, e em Praga está sepultado, o astrônomo danes Tycho Brahe (1546-1601), precursor de Johannes Kepler (1571-1630) e de Galileu Galilei (1564-1642) e sucessor de Mikolaj Kopernik (1473-1543), astrônomo polonês que em 1543 rompe com a concepção de Ptolomeu publicando seu tratado denominado: De revoluionibus orbium coelestium libri VI, que rompe com a concepção geocêntrica do mundo. Nepomuceno veio para o Brasil no final do primeiro reinado (1830) e estabeleceu na região de Diamantina, onde exerceu a profissão de carpinteiro. Casou com uma brasileira da qual obteve três filhos. Dos três filhos, um morreu na infância, o segundo, João Nepomuceno Jr., foi excelente educador e chegou ao cargo de diretor de Instrução Pública de Minas Gerais na época imperial. Abandonou o cargo de diretor de Instrução Pública para dedicar-se à campanha abolicionista e à propaganda republicana. Com o advento da República, João Nepomuceno Jr. foi eleito senador estatal e colaborou na elaboração da constituição do Estado de Minas, na parte que lhe coube, que foi a do ensino público. Chegou à vice-presidente de Minas Gerais na gestão de Bias Fortes. O terceiro filho, avô materno de Juscelino, Augusto Elias Kubitschek, casou com uma filha de Diamantina, neta de ingleses, que permaneceu por toda vida na região.

Juscelino foi felicitado em três grandes fatos que lhe deram estabilidade emocional, política e cultural ao longo de sua vida. Teve uma mãe de linhagem de conhecimento e de comportamento exemplar, permitindo-lhe uma formação técnica-científica sólida, esteve ao lado dos vencedores da Revolução de 1932 e casou com Sarah (que pelo nome indica descendência de cristãos novos), membro da aristocracia mineira. Juscelino chega ao poder Imperial Republicano aos 31 de janeiro de 1956, com o suporte militar da ala nacionalista da forças armada brasileira e eleito pelo voto direto das forças nacionalistas desejosas de fazer frente aos avanços dos interesses internacionais no espaço econômico brasileiro. Juscelino cresceu politicamente sob o amparo do suporte político de Getúlio Vargas; e quem o leva à vitória nas urnas em 1955, foi o seu vice de chapa, João Belchior Goulart, que inclusive foi mais votado que Juscelino: Juscelino obteve 3.077.411 votos e Goulart 3.591.409 votos. Goulart, membro do Partido Trabalhista Brasileiro, herdeiro direto de Vargas e sucessor natural de Getúlio, era alvo das forças conservadoras brasileiras e dos interesses do capital internacional em expansão no pós-guerra. Goulart cheirava aos capitalistas internacionais, o capitalismo endógeno de Vargas que os dificultava a aplicação de seus capitais no Brasil com rendimento acima da média internacional. E para os pseudoliberais assimilados dos trópicos, Jango representava a ameaça do retorno da ditadura de Vargas, que com a inexperiência de Goulart de administrar as forças trabalhistas do império, a república sindicalista estaria às portas. Juscelino seria um "imperador/regente interino até a maior idade de Goulart" sucessor natural de Vargas na política econômica nacionalista brasileira. Que diga de passagem, a família Vargas era (e ainda o é) para intelligentsia americana, mais perigosa para os interesses norte-americanos no sul do hemisfério ocidental do que a família Preste. A família Preste devia obediência e agia de acordo com os interesses de Moscou; e a família Vargas de acordo com os interesses nacionais, do capitalismo tupiniquim. Para os pseudoliberais dos trópicos, pós Juscelino voltaria o getulismo, e o pior, Jango como imperador e Brizola como eminência parda.

Apesar de Juscelino ter sido eleito pelo suporte das forças nacionalista, a defensora de um desenvolvimento econômica nacional, um capitalismo endógeno, fará durante sua gestão presidencial, uma política econômica de estreita colaboração com o capital internacional. Num de seus discursos à nação, Juscelino deixa claro que abandonará a linha política econômica pregada pelos adeptos de Vargas e executará a sua, de acordo com sua visão de mundo de pós-guerra; e assim ele o diz: "Ao que toca à política geral, outra medida que o governo atribui grande importância se refere a atrair empresários estrangeiros, que com suas técnicas e capitais, podem prestar valiosas ajuda na construção de nosso parque industrial. São condições essenciais de uma política de estímulo ao capital estrangeiro as estabilidades políticas, cambiais e monetárias… fato de grande importância ocorrido em 1956 foi o renascimento dos interesses dos capitais estrangeiros pelo desenvolvimento industrial do país. Renascimento que se deve principalmente ao clima de confiança que o novo governo conseguiu estabelecer no exterior. A verdade é que hoje se transformou o conceito em relação ao Brasil, o nosso país está ocupando o primeiro lugar como mercado para os capitais estrangeiros".

A política de atrair capitais externos para explorar o espaço econômico brasileiro será a marca de administração de Juscelino até o seu final. Não vacilou em beneficiar o capital externo no usufruto do território brasileiro. Deu-lhe privilégio de câmbios especial (preferenciais) tanto para as importações de capitais-maquinários como para remessa de lucros e dividendos. Como forma de administração política econômica cria o que é hoje conhecido como Plano de Metas de Desenvolvimento Econômico, que compreendia um conjunto de empreendimentos realizáveis em diversas etapas e nas mais variadas áreas econômicas, que de grosso modo concentrava-se em trinta itens, alguns com término na sua administração em 1961, e outros com espaço de 10, 15 ou mais anos de maturação. Seu plano abrangia: energia, transporte, indústria de base, agricultura e educação. Para tal Juscelino precisava da poupança externa, pois o Brasil nessa época dependia ainda das exportações de café, que chegava a contribuir com mais de 60% da receita das exportações e a classe capitalista brasileira, na sua maioria não ia além de capitão de indústria familiar. Juscelino via no automóvel, este objeto de desejo do macho tropical, a indústria chefe para o desenvolvimento do Brasil, para isso não vacilou sucatar as ferrovias brasileiras em nome das rodovias. Em 1950 a malha ferroviária brasileira constava de 36.681 quilômetros, e no final da gestão de Juscelino, contava com 37.548. A malha rodoviária contava com 7.063 quilômetros pavimentados em 1957, e Juscelino a deixou no final de sua gestão com 13.875 quilômetros pavimentados. A população de veículos motorizados no Brasil compreendendo automóveis, ônibus, caminhões e outros, em 1957 era de 736.033, no final do governo de Juscelino subia para 1.075.354. Das montadoras internacionais que mais se beneficiou dos incentivos dados por Juscelino foi a Volkswagen, que no começo de pós-guerra, sua unidade produtiva na Alemanha Ocidental contava com mais de 90% da mão-de-obra imigrante, principalmente composta por de italianos e turca; somente a cúpula da administração era composta por germânicos. Ter acesso a um mercado virgem e mão-de-obra a preço tropical, para a V.W foi a maior fonte de renda até então desfrutada, os germânicos da V.W descobriram o "pote de ouro" das Américas.

Ao abrir o espaço econômico brasileiro Juscelino valoriza o capital internacional, e ao seu projeto de modernização e não de desenvolvimento do Brasil, não lhe faltara financiamento. Entre 1958 e 1961 o Brasil receberá em forma de financiamento 1.257 milhões de dólares dos países exportadores de capital, sendo os três maiores financiadores: E.U.A com 511.6 milhões, R.F.A. com 219.7 milhões e Japão com 137.1 milhões de dólares. E na forma de investimento direto 489.5 milhões de dólares, sendo os maiores investidores: E.U.A com 223.7, R.F. A com 94.5, Suíça com 37.6, Reino Unido com 23.5, França com 22.4 e Japão com 15.3 milhões de dólares. Para receber estes investimentos e financiamentos Juscelino teve que abandonar a política nacionalista e independentista desenvolvida durante a administração Vargas e associar-se às relações internacionais econômicas e políticas da chamada civilização ocidental capitaneada pelos Estados Unidos. Que noutras palavras, o Brasil alinhavava ao lado dos Estados Unidos e dos demais países capitalistas da Europa Ocidental na guerra fria contra a ex-União soviética e países de sua influência. O alinhamento da administração juscelinista aos interesses norte-americanos nos países da América subdesenvolvida, faz-se mais claro quando da viajem do vice-presidente dos Estados Unidos, senhor Richard Nixon, em 1958 aos países da América hispânica. Nixon sofreu várias hostilidades por parte das forças esquerdistas dos países que visitou, composta principalmente por estudantes que viam nas relações exteriores norte-americana a causa do subdesenvolvimento da América espanhola. Juscelino, neste momento, 28 de maio de 1958, por carta transmite ao presidente americano, Dwight D. Eisenhower sua solidariedade ao vice-presidente Nixon, pelo ocorrido durante sua estância na América dos trogloditas latinos americanos, da seguinte forma: "Transmito a Vossa Excelência em nome do povo brasileiro e no meu próprio, a expressão de solidariedade e estima que se impõe em virtude das agressões sofridas pelo vice-presidente Richard Nixon, na sua recente viagem aos países latinos americanos… Mas do mesmo modo, Senhor Presidente, não é possível esconder que, ante a opinião mundial, a idéia da unidade pan-americana sofreu sério prejuízo… A propaganda dos interessados no antiamericanismo, naturalmente, procura agora converter esses supostos desentendimentos numa incompatibilidade, numa inimizade entre os povos livres da comunidade americana, o que está muito longe de ocorrer… Escrevo a Vossa Excelência, no intento de transmitir minha convicção de que é preciso fazer algo para recompor na unidade continental. Não tenho um plano detalhado para esse objetivo, se não idéias que posteriormente poderei expor a Vossa Excelência, se a ocasião apresentar".

Juscelino não era comunista, não era integralista, socialista, liberal e muito menos nacionalista. Era um "bom senhor civilizador" desejoso de "civilizar" o homem dos trópicos. Via no conhecimento técnico-científico a saída para a emancipação dos povos brasileiros, estes mozambos, mulatos, caipiras, caboclos, bugres, encardidos, misturados, mestiços e etc, mas esquecia de que conhecimento se cria e não se compra. Compra-se sim o know-how, mas jamais o know-why; este se faz em casa a duras conquistas do dia-a-dia da intelligentsia. Não entendeu o Estado de Vargas e quis criar o Estado da Tolerância em que tudo é válido em nome da modernização da economia tropicalista. Favoreceu o surgimento de uma pseudoclasse média de origem européia agarrada à locomotiva estatal, mas sem bens de capital lucrativos; favoreceu aos que vieram fazer a América e não construí-la. Viajou à Europa a procura de suas raízes e com certeza deu-se de encontro com uma Europa Central devastada pela guerra e justificadora da expulsão de seu excesso de população. Mas não foi suficiente para entender que a Europa ama os dividendos dos trópicos, mas odeia a sua população de "coulered peoples". Deixou de herança para o homem brasiliense um Estado capitalista tripés: um capitalismo endógeno subdesenvolvido dominado pelo capital nacional privado ainda a nível familiar, um capitalismo crypto/central planificado centralizado nas estatais e um capitalismo exógeno desenvolvido e modernisador centralizado nas multinacionais. Uma capital administrativa para o império republicano, centralizada no interland e projetada para abrigar 500.000 virtuais comunistas não existentes nem mesmo no Kremlin na era de Iosif Vissarionovich Dzugashvili Stalin. Uma cultura de inflação num país em que a maioria de seus habitantes desconhece o valor e uso da moeda e cheio de oportunistas afim de "fazer a América". Um culto a modernização, de que tudo é válido em nome da modernização; e folcloricamente, segundo as más línguas, um bando de viúvas da sociedade do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, saudosista da época do peixe vivo. Dizem que apoiou o golpe de 1964, sendo verdade, Juscelino de Vargas nada tem a não ser semelhança a F.H.C. acabar com o "Estado de Vargas".

Professor  Benedito da Silva – Universidade Estadual de Maringá – Departamento de Economia – Área de Economia Política –  Maringá.

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