Buchecha volta bem mandado

Claucirlei Jovêncio de Souza, criado no Morro do Salgueiro, em São Gonçalo (periferia do Rio de Janeiro), onze irmãos, ex-auxiliar de pedreiro e office-boy, não se deixou abater pela perda do amigo. E a prova maior é o primeiro disco-solo do Buchecha. Dançante, com aquela alegria e a simpatia cativante de sempre, recheado de temas de amor, sem baixo-astral, sem homenagem chorosa. “É uma história muito triste, mas a dor ficou só no meu interior. Hoje ela é uma saudade”, descreve.

MC Buchecha (Universal Music) assinala a produção de Memê, que agregou ao projeto convidados bacanas como Max de Castro, o saxofonista George Israel, do Kid Abelha, e o guitarrista Carlos Coelho, do Biquíni Cavadão. Max tinha sido contatado por Memê a respeito de uma guitarra de seu próprio disco, mas resolveu, em vez de autorizar uma sampleagem, gravar pessoalmente algo na mesma linha em Vem morar comigo. É uma participação discreta, afinal, o arranjo é minimalista e a idéia era “não atrapalhar o groove”. George Israel foi fazer uma visita ao velho amigo produtor e acabou registrando frases que valem como assinatura do Kid em Insciente. Coelho socorreu Memê na tarefa de rearranjar Tédio, clássico do Biquíni e exceção no repertório de inéditas do disco.

A faixa mais surpreendente do CD, reparam os fãs, como Pedro Só, é Laços, que chama a atenção pela letra e pelo arranjo. Memê e o tecladista Hiroshi Mizutani pegaram uma carona na estética Pocket calculator do grupo alemão Kraftwerk (marco da música eletrônica de 1981), com a intenção de traduzir um clima “gelado”. “Os casais se encontravam na pracinha/ Se abraçavam e se beijavam em puro mel/ Hoje ninguém mais namora e o tapinha/ É o convite mais ativo pro motel”, introduz Buchecha, a voz distorcida por efeitos. Mais na frente, ele arremata “dias de terror e desespero, é o fruto da nova era” e uma repetição robotizada de “não, tapinha não!”. “É a minha crítica à maneira como as pessoas estão se encontrando hoje. Na minha época, tinha pracinha, aquela pipoquinha inocente. Agora é pá-e-bola. Não é exatamente moralismo ou patrulha, é o meu papo funk, minha raiz, que é falar das coisas que vejo na favela”, esmiúça Buchecha.

Buchecha, 28 anos completados dia 1.º de abril, está em seu sétimo disco, navegando pelo romantismo sensual, pelo funk e sob influência do black norte-americano, com direito a um grito de guerra: “Que saco! Tô no buraco!”

Voltar ao topo