Rivalidade e amizade não são incompatíveis

Apesar de a bola rolar na Baixada somente amanhã, nas ruas de Curitiba os torcedores já começaram um Atletiba à parte. Daqueles que mudam rotina, causam tensão pré-jogo e fazem com que qualquer outra coisa seja esquecida.

Os estudantes João Victor Bueno e Caio Augusto Growoski que o digam. No auge de seus 15 anos, os garotos passaram horas de apreensão até ontem. Foi quando realizaram a última prova da escola da semana e puderam trocar cadernos, canetas e livros didáticos do 2.º ano do ensino médio por jornais, revistas e a tela do computador.

Essa obsessiva busca por informações, no entanto, nada tem a ver com a escola. A partir deste momento eles deixaram a vida cotidiana para entrar no mundo paralelo que o clássico Atlético x Coritiba é capaz de criar em cada curitibano, desde 1924.

Troca de identidade

João deixou de ser o estudante do colégio Santa Maria e trocou seu sobrenome para atleticano. O mesmo ocorreu com seu colega de classe Caio, que agora só responde pelo nome e pelo Coxa.

Sem perder a amizade, a dupla espera o jogo para vibrar. Pois quando chega o apito final, é a hora de saber quem terá a oportunidade de dar aquele tapinha nas costas do camarada e perguntar: quanto foi o jogo mesmo?

“É assim que tem que ser, já fui até no Couto Pereira ver jogo do Coritiba só pra fazer companhia ao Caio. O legal é torcer sem exageros, sem brigas”, disse João, o atleticano.

Seu amigo também diz já ter ido até a Arena da Baixada ver jogo do Furacão, sem ressentimentos. “Uma coisa é comemorar e vibrar por um time. Outra é fazer burrada, brigar e ser intolerante. A maioria das pessoas que são assim se arrependem depois”, lembrou Caio.

Ao falar sobre o placar do jogo, apesar de toda amizade, dessa vez não existe consenso entre os amigos. João aposta no 2 x 1 para o Atlético. Em seguida, Caio responde que vai dar 3 x 1 pro Coritiba. “Só pra dizer que meu placar é maior que o dele. Vai que dá sorte”.

Depois do Atletiba, os garotos devem se encontrar. Quem vencer vai ser só alegria. Mas pra quem perder, os garotos passam umas dicas. “O negócio é ficar quieto, mesmo quando provocado”, disse o atleticano, completado pelo coxa. “É só não dar bola e ficar fora de brigas. Depois disso a vida continua, tem escola e outras preocupações”.

Famílias amigas, mas separadas

Com o DNA de bisneto do goleiro Alberto Gottardi, primeiro grande ídolo rubro-negro e irmão de Caju, João irá assistir o Atletiba ao lado de pai e mãe. Caio estará no setor visitante, ao lado de pai e tio, que mesmo nos tempos em que o garoto morou fora de Curitiba fizeram questão de presenteá-lo com camisas alviverdes do Alto da Glória.

Apesar da paixão clubística vir de berço, os pais de João chegam a dizer que a amizade de seu filho fez bem a eles. “A primeira vez que pisei no Couto Pereira foi pra comprar um presente ao Caio”, brinca Silmara Gottardi, 47 anos, antes de ser completada pelo marido Ednei Bueno. “E com a família deles foi a mesma coisa, mas na Baixada”.

Jogadores parabenizam

Um Atletiba com respeito, paz e tranquilidade. É o que querem ídolos de Atlético e Coritiba. Eles parabenizam pessoas como os garotos João e Caio, que amam seus times e torcem sem violência.

“Sempre é bom saber de torcedores que pensam em futebol, não em brigas”, disse o rubro-negro Paulo Baier. O mesmo tom de fala foi utilizado pelo zagueiro Jeci, do Coxa. “Esse negócio de briga e violência nunca foi bem-vindo. No estádio vai ter criança, pessoas de idade, pessoas que vão realmente para ver o futebol”.

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Allan Costa Pinto
Caio Augusto Growoski, coxa-branca, e João Victor Bueno, atleticano, mostram que é possível torcer sem violência.