Curitiba é um lugar privilegiado quando se quer levar tiros ou então ser esfaqueado. Nossos hospitais registram mensalmente um número impressionante de ferimentos por arma de fogo ou por arma branca. Tráfico de drogas, assaltos, briga por causa de mulher, de homem, de vizinho, de trânsito, de barulho, de bebida – sempre há um bom motivo para as pessoas tentarem se matar.
Nosso paciente de hoje é o Jeremias, mas pode chamá-lo de Jimmy. O apelido, gentilmente dado pela polícia, se refere a um cara de 23 anos que simplesmente não toma jeito na vida. Pequenos furtos, pequenos assaltos. Gente boa o moço.
Dessa vez ele assaltou uma padaria, levando na fuga a moto de um cliente. Por sorte, uma viatura da polícia passava por perto. Por azar, era uma viatura da Rone.
Como Jimmy não tem nada dentro da caixa craniana, disparou com a moto pela contramão. O resultado foi levar um sapeco de calibre 0.38 na coxa direita. Com o disparo, Jimmy perdeu o controle da motoca e acabou batendo na lateral de uma Parati.
O que sobrou disso estava agora na minha frente, algemado na maca.
Como de costume, nenhuma médica ou enfermeira se habilitou a chegar perto do nosso Jimmy. A mão boba, a quantidade de palavrões e a falta de banho afastam qualquer boa vontade para bem longe.
Pois é. Sobrou para mim.
Avalio o paciente ao mesmo tempo em que ouço todos os tipos de xingamentos imagináveis. Como o projétil transfixou a coxa sem atingir nenhuma estrutura importante, um curativo simples deve ser o suficiente. Algumas suturas também são necessárias no rosto e no couro cabeludo.
Durante os curativos fico tentando imaginar os motivos para tanta raiva.
A resposta fácil talvez seja a desigualdade social em que vivemos, mas que só pessoas como Jeremias conhecem de verdade. Tudo bem, me perdoe. É mais uma resposta fácil e idiota que fala tudo, mas não explica absolutamente nada.
Depois de duas horas, o paciente recebe alta, sendo conduzido com truculência pela polícia. Será encaminhado para uma delegacia qualquer para ser liberado logo em seguida.
É assim o dia todo, todos os dias. Até a próxima, Jimmy!