Chega uma hora, que chega! 

Foto: Pexels

E se eu disser que tá tudo bem, é mentira

A Gabi mandou o ultimato por direct, no Instagram: “me encaixa em qualquer almoço na semana, nem que seja 20 minutos no Mac”. Faz uns quatro ou cinco anos que eu só consigo encontrar a Gabi uma vez por ano. E isso não me deixa orgulhosa. A Gabi faz parte de um grupo bem pequeno, de umas cinco pessoas no máximo, que ainda insistem.

Sabe aquelas pessoas que te escolheram apesar de você? Apesar do “desculpa desmarcar”? Apesar do “tá insana a minha rotina”? Pois é. Ainda tenho a sorte de ter alguns desses no rol de amigos. 

A Gisele é outra. Já até tivemos uma briguinha por conta do meu eterno desnaturamento. Ela ficou chateada. Eu fiquei chateada. Depois ela ficou de boa. E, apesar de mim, ela nunca me abandonou. Continua reagindo aos meus stories. Continua mandando mensagem e fazendo questão. Apesar de mim. E eu nem sei como reagir a isso porque, se fosse eu, já tinha largado faz tempo.

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Uma das maiores dificuldades da geração milênio (que é meu caso) é assumir a responsabilidade pelas próprias escolhas e assumir os próprios BO’s. Isso inclui admitir que você falha miseravelmente em quase 80% dos aspectos da vida moderna e que, no exaustivo equilíbrio de pratos da rotina, você não passa de um adulto funcional: mantém em dia as contas, come direito uma vez por dia (o resto vai o que tem), se exercita, dorme umas 6h por noite e trabalha que nem um camelo. E é isso. Quando não é isso e eventualmente “sobra” um tempo, às vezes você só quer fazer nada mesmo. Ver um Netflix, ir à feira comprar queijo e voltar pra casa. Ficar na toca.

E nessa correnteza que vai arrastando de segunda a sexta, entre o horário do ônibus, as reuniões e a opressão dos 10 milhões de grupos de whatsapp de jornalista, eventualmente aparece um: “amiga, tô com saudade” que, se eu não respondo na hora, corro o risco de esquecer depois, no meio da enxurrada de atualizações de notícias, tragédias, atendimentos e urgências. Às vezes nem é isso. Às vezes eu só dormi mesmo. E isso não me deixa orgulhosa. E fico culpada. E eu peço desculpa depois.

Teve quem desistiu e foi embora. Teve quem foi tentando e saindo aos pouquinhos. Teve quem confrontou e saiu bem bravo. E se eu disser que tá tudo bem é mentira. Eu senti as perdas. Me culpei. Tentei justificar. A verdade é que eu tive que assumir os meus BO’s. Sim, eu desmarquei. Verdade, eu esqueci de responder. Desculpa. Assim mesmo. Desculpa! Sem banalizar. De todo o meu coração. Eu também não aguentaria. Não recorro ao “quem me conhece sabe”, mesmo porque todo mundo já tá cansado de saber: tá corrido. Tá exaustivo. Tá demais. Não deu. Não consegui. Podemos marcar semana que vem?

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“As pessoas são passageiras”, é o que diz a positividade tóxica de Internet. Em alguns casos eu até concordo. Pra ser sincera, em alguns casos, é até melhor que algumas pessoas vão embora mesmo. Mas em vários outros, as pessoas passam por entre os meus dedos de pleno direito. Não são obrigadas a ficar. 

As pessoas se cansam e têm toda a razão. Relações pedem reciprocidade e chega uma hora, que chega e se eu disser que tá tudo bem é mentira. Não tá. Pessoas não são e jamais serão substituíveis e eu preciso aceitar isso. Reconhecer a perda sem flagelo ou sem fazer dessa fatia da vida um fator de culpa ainda é difícil.

Minha versão desnaturada não se gosta tanto, mesmo sabendo que não vai dar pra dar conta de tudo e de todo o mundo. E tá tudo mais ou menos bem. Sentimentos se transformam, pessoas mudam e, no fim, a solução é agradecer – mesmo que seja só uma vez por ano – aquelas que insistem, apesar de mim.

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