A noite ficou mais violenta depois que o guarda noturno foi embora

“Noite alta, céu risonho, a quietude é quase um sonho”. A noite antiga pode ser resumida nos versos de Cândido das Neves. Além dos boêmios, só um profissional ficava acordado. O guarda noturno. A presença dele era notada pela brasa do cigarro aceso. Em seguida a saudação na voz conhecida: “Boa noite, Sr. Armando”. Ao passar pela rua escura, a pessoa sabia que a área estava protegida. Às vezes ele trocava um curto diálogo com o morador, que perguntava. “Será que vai chover esta noite?”.

O guarda olhava o tempo e respondia: “Não. Hoje o céu está estrelado”. Então encerravam a discussão com os protocolares: “Boa noite!”. Olhei no calendário e vi que hoje é Dia do Guarda Noturno. E fiquei pensando: mas ainda existem guardas noturnos? Era uma instituição que perdurou por várias décadas do século 20. Era o sujeito que cuidava de uma área numa determinada rua, remunerado pelos moradores. Ele chegava por volta das 19 horas, munido de apito, cassetete e fardamento que lembrava o de policiais americanos. Sapatos pretos, calça, camisa e quepe azuis, gravata preta. Estava sempre barbeado e cabelo penteado.

O guarda noturno fazia a ronda à noite e de vez em quando para que soubessem de sua presença, entoava o apito, não a ponto de perturbar o sono de quem dormia e o suficiente para saberem que estava acordado. Ele sabia da vida dos moradores, porque conversava com eles. E também os moradores sabiam da vida do guarda. Não eram agredidos, nunca soube de roubo de casa na minha rua à noite enquanto o guarda esteve de serviço. Quando alguma família viajava de férias, o guarda noturno reforçava a atenção. Normalmente quando a família retornava trazia lembrança para ele.

Quando se tratava de empresas, havia relógio para guardas noturnos. Era uma forma de verificar se realmente estavam vigilantes. Aliás, foram as empresas que deram início à mudança de nome do profissional. De vigilante noturno de empresas, eles passaram a funcionários de empresas de vigilância como ocorre hoje. E o guarda noturno desapareceu. Hoje o serviço é feito por empresas de vigilância. Um profissional passa de moto por certa área. Eles são monitorados pelas centrais, estão mais protegidos e armados, inclusive usam algemas, porque a violência atual não permite ninguém trabalhar à noite sem meios de defesa. O guarda noturno foi embora, mas a noite não ficou tranquila.