Ofertas melhores para atrair novos clientes: A prática ilícita de desigualar contratantes

Tratando-se de relação de consumo, é lícito fornecer produtos ou serviços em condições mais favoráveis para novos clientes? Antes de responder, é importante consignar que esta questão não tem recebido o devido tratamento legal e jurisprudencial e mesmo as pessoas mais pró-ativas, incluindo os órgãos, associações e entidades dedicadas à proteção dos direitos dos consumidores, pouco têm agido com relação a essa problemática. Nesse contexto, então, tem sido comum vermos consumidores indignados quando sabem que algum fornecedor com o qual mantém contrato, para o mesmo tipo de fornecimento, está fazendo promoção que apresenta condições mais vantajosas destinada a atrair novos clientes, mas não as estende àqueles consumidores com contratos mais antigos. Freqüentemente, são promoções de grande porte que afetam o mercado em relação a consumidores e concorrentes. Campanhas promocionais por si só são algo regular, mas não se deve aceitar a gritante diferença de tratamento que essas empresas praticam para o mesmo tipo de fornecimento, discriminando, prejudicialmente, os clientes antigos em relação aos novos. O contrato que constitui relação de consumo tem regras jurídicas que vedam esse tipo de prática abusiva, regras que o direito à livre iniciativa não tem legitimidade para desrespeitar. O ambiente de mercado apresenta muitos exemplos nesse sentido. Para clientes novos, há TVs por assinatura que ofertam não cobrar a taxa de adesão e, ainda, liberar canais e programas pelos quais aqueles que já são assinantes têm de pagar altos valores. Já as companhias de telefonia (principalmente celular), enquanto aumentam gravosamente as tarifas de seus clientes tradicionais (sendo comum, inclusive, acontecerem cobranças indevidas), quando se trata de captar novos clientes oferecem propostas com vantagens significativas. O mesmo é comum acontecer com assinaturas de revistas, contratos com provedores de internet e fornecimento de outros produtos e serviços periódicos.

Sob o ponto de vista econômico, é comum que substancial montante dessas benesses acabe sustentado pela receita advinda da carteira de contratos que é mantida em custo superior com os clientes antigos. Então, vantagens ofertadas para novos clientes que às vezes podem significar perda de receita – são internalizadas e costumam ser sustentadas em parte pelo valor superior das tarifas, assinaturas, mensalidades ou anuidades praticadas em contratos de clientes mais antigos. Ignoradas as ?espertezas?, a alegação das empresas é que a realidade de mercado muda diariamente e impõe novas estratégias. Também argumentam que precisam concorrer e captar clientela como forma de obter ganho de escala, sendo que cada cliente tem seu contrato com cláusulas que devem ser cumpridas. Assim, elas, ou não avisam o consumidor antigo de que passaram a proporcionar condições mais vantajosas pelo mesmo produto ou serviço, ou insistem que o contrato anteriormente assinado (que normalmente é de adesão) deve ser cumprido conforme as cláusulas estabelecidas quando da contratação, mesmo que mais gravosas do que as dos contratos mais recentes. Estes argumentos podem até ser eventualmente sustentados, quando se referir a contratos comerciais ou civis mantidos entre fornecedores, mas não quando se tratar de contratos de consumo que tenham por objeto o mesmo tipo de fornecimento. Condições diferentes e discriminatórias para o mesmo tipo de contrato de fornecimento é notória prática abusiva que desrespeita especificamente o direito à igualdade nas contratações, previsto no Código de Proteção e Defesa do Consumidor (art. 6.º, inc. II). E mais, ao agir desta forma, descumprem o dever de proteger a fidelidade do consumidor, cuja confiança e contribuição representam o maior sustentáculo da empresa.

As campanhas promocionais das empresas passaram a ter certa semelhança com as campanhas políticas, onde o importante tem sido apenas prometer para cativar, sendo que depois a conversa muda. Após obter a adesão do consumidor, essas empresas não mais lhe dão atenção (relegando-o a ter contato com um telefone 0800 ou 0300), confiando que ele terá impossibilidade ou dificuldades para se livrar do contrato. Consideram que em relação ao cliente já cativo, não mais precisam competir ofertando produtos e serviços de qualidade a preços compatíveis. Adotam a lógica de que, na prática, ao consumidor pode não restar outra alternativa senão cumprir o contrato que foi assinado, já que mudar de fornecedor lhe custará ônus e dificuldades (exemplo: multa por rescisão).Nestes casos, afora as medidas legais que podem ser tomadas contra esta prática abusiva que causa dano a consumidores e concorrentes, outras de cunho prático são interessantes de serem observadas, tais como:

a) a cautela que o consumidor deve ter ao assinar um contrato para adquirir produto ou serviço de empresa da qual nunca foi cliente. Ninguém deve se iludir com as ?maravilhosas? promoções que a companhia está a lhe ofertar. Observe a qualidade dos produtos ou serviços e, principalmente, pense primeiro como será o seu amanhã, quando a empresa fornecedora não mais estiver preocupada em buscar sua preferência. No longo prazo, muitas das atraentes vantagens ofertadas para a primeira contratação, costumam custar caro a quem se deixa ludibriar por elas;

b) antes de contratar tire informações com outras pessoas que conheçam o modo de atuar da empresa. Consulte o Procon, associações e outros órgãos de proteção aos consumidores para saber a maneira como ela (empresa) se comporta no mercado. E mais, use até a imaginação para se colocar no lugar dos consumidores que já contrataram antes de você. Nunca é demais se precaver quanto a produtos e serviços cuja qualidade precisa de tantos atrativos para que você faça a primeira contratação, enquanto clientes mais antigos são esquecidos (e desassistidos), posição em que você estará no futuro.Reiteramos que o Direito proíbe expressamente que consumidores sejam tratados de forma desigual sem que exista uma justifica legal e plausível para tal procedimento. Independente disso, as normas consumeristas recomendam que a fidelidade seja valorizada, podendo essa sim, implicar em condições negociais melhores para quem já é cliente por mais tempo. Portanto, tratando-se do mesmo tipo de fornecimento para consumo, obrigar as empresas (até editando norma nova) a estender suas ofertas para todos os clientes (novos e antigos), é a única a forma de coibir-se a prática abusiva de discriminar consumidores e vir a ser cumprido o fundamental direito à igualdade nas contratações estabelecido no CDC. Será bom para os fornecedores que cumprirão a lei, saudável para a concorrência e justo para com os consumidores.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.