Quando respirar cansa

O simples ato de pentear o cabelo cansava a artista plástica Maria do Rosário Costa Mauger. Para caminhar por alguns metros, ela precisava parar e descansar. Não conseguia dar dez passos. ?A constante falta de ar me levava a pensar que a vida estava acabando para mim?, lembra emocionada. Ela sofria de hipertensão arterial pulmonar (HAP), uma síndrome rara, mas grave, fatal e de difícil diagnóstico. ?Dos pacientes não tratados, 32% morrem em um ano; 52% em três anos e 66% em cinco anos?, adverte o pneumologista Mauro Zamboni, presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT). A entidade acaba de lançar uma campanha nacional de combate à doença.

Os sintomas da HAP – falta de ar e cansaço físico – são comuns a outras doenças pulmonares, fato que prejudica e atrasa o correto diagnóstico da doença, que é de, em média, dois anos. ?Ou seja, muitas vezes a pessoa morre sem saber que contraiu a doença?, realça o presidente. De acordo com a pneumologista Jaquelina Sonoe Ota Araraki, presidente da Comissão de Circulação Pulmonar da SBPT, a doença pode ter característica congênita ou surgir como conseqüência de outras doenças, entre elas a esclerose sistêmica e a esquistossomose. No caso de Maria do Rosário, a doença surgiu em decorrência de doença reumatóide.

Cansar em repouso

O mecanismo da doença é parecido com o da conhecida hipertensão arterial sistêmica, na qual a pressão nos vasos sangüíneos do coração está aumentada, deixando-os mais estreitos. Na HAP essa pressão acontece no pulmão. Com efeito, o coração precisa de muita força para fazer com que o sangue passe pelos pulmões. ?Isso leva a um quadro progressivo de insuficiência cardíaca e respiratória?, diz o pneumologista Rogério Souza.

Conforme o especialista, no caso de Maria do Rosário, foi percebido o principal sintoma da doença – a falta de ar progressiva, que vai limitando a vida da pessoa. ?Muitas vezes, acompanhada de dor torácica, a HAP pode chegar a um estágio em que a pessoa se cansa até em repouso?, alerta. Para diagnosticar precisamente a doença é necessário realizar uma extensa investigação, com teste de caminhada, exame de sangue e observação dos sintomas nas tarefas diárias. Na maioria das vezes, um ecocardiograma ou eletrocardiograma podem acusar a doença. O último recurso é submeter o paciente a um cateterismo.

Via judicial

No Brasil, a estimativa é de que ocorram anualmente entre um e dois casos por milhão de habitantes. Assim, cerca de três mil pessoas sofreriam da doença no País. A SBPT lançou, em 2005, as diretrizes brasileiras para manejo da hipertensão pulmonar, tornando oficiais as práticas de diagnóstico e tratamento da doença. A iniciativa teve por objetivo, além de esclarecer e divulgar a doença, traçar orientações práticas para diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes.

O pneumologista Jairo Sponholz Araújo observa que o diagnóstico precoce é a única forma de as pessoas serem tratadas em fases menos avançadas (veja o quadro). Apesar de ainda não haver cura, o especialista diz que hoje existem tratamentos disponíveis para aumentar a qualidade de vida e, em alguns casos, a sobrevida do paciente. Só que o acesso às terapias que podem aposentar a bomba de infusão – técnica praticamente inviável, mas ainda hoje utilizada nos tratamentos – ainda é bem complicado. É comum os pacientes terem que recorrer à Justiça para que o Estado forneça as drogas mais modernas. Entre elas, a bosentana, que bloqueia uma substância e impede o fechamento das artérias, e o citrato de sildenafila, mesmo princípio ativo do Viagra, só que em dosagem específica, usado para dilatar os vasos bloqueados. ?Estes medicamentos deixaram de ser absurdamente caros para se tornarem muito caros?, frisa Sponholz, esclarecendo que a missão da SBPT é fazer com que eles cheguem a quem realmente precisa e não aos que têm mais condições de ?lutar? por ele.

*Nosso jornalista participou do lançamento da campanha a convite da SBPT.

Causas da HAP

Apesar de não ter sua causa definida, a hipertensão pulmonar pode surgir por fatores hereditários ou em decorrência de outras doenças, entre elas:

* Esclerose sistêmica.

* Lúpus.

* Cardiopatias congênitas.

* Enfisema e embolia pulmonar.

* Apnéia do sono.

* Complicações do vírus HIV.

* Cirrose.

* Esquistossomose.

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