A silenciosa epidemia de tromboembolismo

Ao sofremos um ferimento qualquer, perdemos certa quantidade de sangue. Logo, o organismo reage e aciona um sistema de coagulação que faz o sangue parar de jorrar. São plaquetas se dirigem para o local

do ferimento e formam uma barreira, conhecida por trombo. Depois de algum tempo, este coágulo se dissolve e a circulação volta ao normal.

No entanto, para muitas pessoas esse “processo” é interrompido. A situação se complica quando, por diversos motivos, criam-se bloqueios em locais onde não houve sangramento, principalmente nas pernas ou coxas.

Estatísticas mundiais revelam que a trombose venosa profunda (TVP), como é conhecida o distúrbio, é responsável pela morte de cerca de um milhão de pessoas anualmente, nos Estados Unidos e na Europa.

Trata-se da terceira doença cardiovascular mais frequente no mundo depois dos problemas de coração e do derrame (AVC). O ortopedista Luiz Sérgio Marcelino Gomes, especialista em cirurgia do quadril, explica que a TVP ocorre quando se forma um coágulo sanguíneo no interior de veias profundas, causando o entupimento desta veia.

Na fase inicial ocorre um processo inflamatório nas regiões próximas que causa dor, inchaço, aumento da temperatura e endurecimento dos músculos próximos ao local da trombose. “Um dos maiores desafios é o grande numero de TVP silenciosa ou assintomática que pode ocorrer em até 80% dos casos”, adverte o médico.

Embolia pulmonar

Além disso, a imobilidade, principalmente em pacientes idosos é um fator que aumenta muito a chance de ocorrência de trombose venosa. “Normalmente, isso ocorre em casos de imobilização por internação, cirurgias ou mesmo fraturas que requeiram imobilização prolongada”, esclarece o especialista, salientando que as cirurgias ortopédicas de grande porte, em idosos, como por fratura de quadril e colocação de prótese de joelho, por exemplo, apresentam risco bastante elevado, entre 40% e 60% dos casos em que não se faz prevenção.

Isso também acontece nos casos mais graves de síndrome da classe econômica ou tromboembolismo venoso (TEV). Essa doença engloba duas manifestações clínicas distintas: a trombose venosa profunda – quando o coágulo obstrui o fluxo sanguíneo das veias dos membros inferiores – e sua maior complicação, a embolia pulmonar, situação em que o trombo se desprende, migra para os pulmões, podendo levar ao bloqueio parcial ou total das artérias pulmonares. A embolia pulmonar é uma circunstância potencialmente fatal, que leva à morte em até 1/3 dos pacientes quando não tratados adequadamente.

Prevenção possível

“A veia entupida não exerce mais a sua função de levar o sangue venoso de volta ao coração, ainda que as veias vizinhas possam fazer esse papel, elas ficam sobrecarregadas, se dilatam e podem ficar insuficientes”, realça Luiz Sérgio Marcelino Gomes.

De acordo com o cirurgião, essa situação, por si só, tem consequências importantes, pois pode originar aos que os especialistas chamam de síndrome pós-trombótica, originando a presença inchaço, feridas e infecções crônicas no membro afetado, e que podem se tornar extremamente incapacitantes.

Com efeito, cerca de 30% dos pacientes com TVP desenvolvem síndrome pós-trombótica nos primeiros dois anos depois do evento, período em que também quase 20% dos pacientes apresentam novo episódio de TVP.

Além disso, a TVP também aumenta o risco de eventos cardiovasculares no primeiro ano da doença. Estudos comprovam que em comparação com as pessoas que nunca tiveram um coágulo sanguíneo, o risco de infarto do miocárdio aumenta em 60% e de derrame cerebral em 119% nas vítimas da doença.

Por ser uma doença muitas vezes assintomática, a trombose venosa é considerada de difícil diagnóstico. Além da avaliação clínica e dos fatores de risco do paciente, o médico pode s,olicitar a realização de exames específicos como o doppler (que permite visualizar a circulação do sangue nas pernas) ou raramente a flebografia (raio-x das veias após a injeção de contraste).

A prevenção e o tratamento da trombose são amplamente estudados, mas o grande problema é que grande parte dos medicamentos disponíveis no mercado ou são injetáveis ou necessitam de monitoramento e ajuste constantes da dose, o que dificulta a adesão ao tratamento.

Mais comodidade

A rivaroxabana (principio ativo de Xarelto®, anticoagulante oral da Bayer Schering Pharma), substância que age especificamente sobre o fator que atua na formação dos coágulos é a mais recente opção de tratamento do tromboembolismo.

A aprovação do medicamento foi baseada nos resultados de uma série de estudos clínicos mundiais com mais de 12.500 mil pacientes submetidos à cirurgia ortopédica de grande porte (artroplastia de joelho e quadril), e que usaram a rivaroxabana para a prevenção da TVP.

Os estudos revelaram uma redução bastante significativa do risco de ocorrência de fenômenos tromboembólicos quando comparados com a terapia padrão (enoxaparina). O medicamento garante comodidade ao paciente, pois é administrada via oral em dose única diária, enquanto a maioria dos tratamentos é injetável.

Características e hábitos

Em condições normais a coagulação sanguínea é um processo de defesa do organismo contra um sangramento que pode ocorrer em consequência de doenças ou algum tipo de traumatismo.

Além disso, existem algumas características próprias ou hábitos que podem aumentar as chances de desenvolver a trombose venosa, como a menor velocidade de circulação pela veia (frequente em pessoas com varizes acentuadas); pessoas com lesões nas paredes das veias ou com tendência a hipercoagulabilidade – normalmente ocorre em pessoas com doença genética, usuários de drogas e grávidas. Outros fatores de risco são: idade, obesidade e excesso de nicotina.

Segundo Cyrillo Cavalheiro Filho, chefe do laboratório de hemostasia do Instituto do Coração (Incor) de São Paulo, nos hospitais, a doença é, na maioria das vezes, o resultado da imobilização do paciente durante as internações, ou após cirurgias mais complexas. “Sem os movimentos, a circulação se torna mais difícil e as chances de formação de trombos aumenta”, esclarece.

Com efeito, de acordo com Ana Thereza Rocha, do serviço de pneumologia do Hospital Universitário Edgard Santos, de Salvador, na Bahia, elevar os pés das camas do paciente, recomendar o uso de faixas ou meias de compressão, fisioterapia e acelerar a retirada do paciente do leito, quando for possível, ajudam a reduzir o risco da trombose. “Nos casos mais complicados, a profilaxia deve começar pela indicação de anticoagulantes”, garante a médica.

Fatores de risco

* Idade acima de 40 anos
* Obesidade
* Varizes grandes
* História anterior de trombose
* Uso de anticoncepcionais orais ou da reposição hormonal
* Fumo
* Alterações genéticas que afetam o mecanismo de coagulação
* Cirurgias de médio e grande portes
* Infecções e doenças graves
* Gravidez e pós-parto
* Imobilização prolongada

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