Técnica chinesa para produção de papel brasileiro

O papel, como é conhecido hoje, foi inventado pelo oficial do Império Chinês Tsai Lun, em 105 d.C. A técnica empregada foi divulgada cinco séculos depois no Japão por monges budistas. E foi nesse país que a arquiteta Daniela Fernandes foi estudar para produzir, em Belém (PA), o Amazon Paper, resultado do aproveitamento de diversas fibras vegetais da região amazônica para a confecção de papéis artesanais.

Brasília

(ABR) – A fibra vegetal mais utilizada pelo projeto Amazon Paper, da Unidade de Desenvolvimento de Produtos (UDP), do Poemar, unidade que põe em prática as atividades do Programa Pobreza e Meio Ambiente (Poema), da Universidade Federal do Pará (UFPA), é o curauá. Todavia, também são processadas as fibras do açaí, do palmito e de outros resíduos da flora amazonense.

O curauá “é apontado como uma das fibras mais resistentes do mundo”, informa Daniela. A técnica oriental empregada para a confecção do Amazon Paper é a denominada Uachi, “que fortalece ainda mais o entrelaçamento das fibras, resultando num papel diferenciado e com alta resistência”, explica a arquiteta.

O papel, produzido numa pequena unidade fabril no centro de Belém, é direcionado ao aproveitamento artesanal. “É um nicho de mercado específico”, diz Daniela. Hoje, o grande concorrente do papel brasileiro é o produzido na Ásia. Por essas particularidades, o Amazon Paper não é um produto consumido em alta escala e tem preço diferenciado, “até porque a produção artesanal também não é barata”, lembra Daniela.

Atualmente, a unidade de Belém, onde trabalham 14 pessoas, tem capacidade para produzir diariamente entre 400 e 500 folhas de papel no formato 98X64cm. A meta, conta Daniela, é chegar a mil folhas. A unidade é vendida a R$ 10, mas no atacado esse preço cai para R$ 5 ou R$ 6. No preço estão embutidas as dificuldades de produção impostas, por exemplo, pelo clima da cidade. A umidade relativa do ar, normalmente alta em Belém, prolonga a fase de secagem, e “no inverno o entrave é a proliferação de fungos”, diz a arquiteta.

Para contornar parte desses empecilhos e oferecer uma alternativa de renda às comunidades carentes da região, o Poema, no âmbito da Bolsa Amazônia, vem treinando famílias para a produção do papel e seu aproveitamento no artesanato local. Em Abaetetuba, por exemplo, município a 65 quilômetros de Belém, 15 pessoas aprendem a técnica de fabricação de papel.

Da comercialização do que é produzido recebem de 5% a 10%. Hoje, o papel é aproveitado na confecção de porta-retratos, capas de agenda, calendários, objetos para escritório, quadros, cartões de visita, convites, entre outros. Mas Daniela informa que outras formas de aproveitamento são pesquisadas constantemente. “Já temos abajur com formatos diversos e, no momento, testamos o papel em divisórias para ambientes”.

Polpa é colocada para cozinhar

Para a produção do Amazon Paper, as folhas do curuá são cortadas em pedaços de até 2 cm que são cozidos por algum tempo. A polpa resultante é colocada numa máquina, adaptada na própria sede do projeto, para ser batida. “É dessa forma que separamos a celulose e a lignina, componentes do vegetal, das fibras”, explica Daniela.

A massa formada no batimento é levada para um tanque com água onde é constantemente remexida. É nesse recipiente, com capacidade superior a 500 litros, que se mergulha a sugheta, uma tela de malha extremamente fina presa a uma armação de bambu, para recolher a mistura em suspensão. O tamanho de cada folha é determinado pela medida da sugheta, mas “a espessura é dada pela técnica e sensibilidade da pessoa que recolhe a massa do tanque”, enfatiza Daniela.

Ela informa que a sugheta foi inventada há 2 mil anos no Japão e até hoje é empregada na confecção de papéis. “Cada folha é produzida individualmente num processo lento que exige muita atenção, paciência, destreza e sensibilidade de quem opera a sugheta”. Assim, não é qualquer pessoa que consegue manobrar com facilidade a tela.

As folhas de papel formadas na tela são empilhadas para secar separadas por um barbante. Para colorir o papel são aplicados corantes também extraídos de vegetais da própria região. Com o urucum se obtém a cor vermelha, da casca da mangaratiba se consegue o amarelo, do murici se retira o marrom e da tinta que sai da casca de uma árvore conhecida como tinteiro se consegue a tonalidade ocre.

Com a ajuda técnica do Poema e o aporte financeiro da União Européia (EU), por meio da Bolsa Amazônia, Daniela acredita na expansão do Amazon Paper. A arquiteta reconhece que “ainda não temos condições de atender a grandes demandas”, até porque faltam não só equipamentos mais modernos, como tocar a sensibilidade de pessoas com as quais o projeto acaba cruzando.

Este ano, por exemplo, o Amazon Paper ganhou da Holanda uma máquina para acelerar uma das etapas de produção do papel artesanal, mas para conseguir a “liberação da alfândega foi uma luta”, lamenta Daniela. “Mesmo tratando-se de uma doação sem ônus para o país, quebrar a malha burocrática não foi nada fácil”, ressalta. (ABR)

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