Esperança para os portadores de ceratocone

Responsáveis por 70% da fila de espera por um transplante de córnea, os portadores do ceratocone (doença que degenera a visão) estão esperançosos com um novo procedimento, já realizado em clínicas particulares do País: o Cross Linking.

A técnica em desenvolvimento, necessária para cerca de 8% a 10% do total das pessoas que tem a doença, promete interromper a progressão da degeneração, que faz com que o portador perca partes da visão gradualmente e pode, inclusive, conduzir à perda de visão.

Até então, nos casos mais graves, o problema só podia ser remediado com transplante, pois o ceratocone deixa a córnea fina e em um formato mais cônico do que sua curvatura normal. “A técnica (Cross Linking) interrompe a progressão da doença pela aplicação de raios ultravioletas com vitamina B2 (riboflavina). Isto faz com que a córnea endureça e deixe de curvar-se”, explica a presidente da Sociedade Brasileira de Lentes de Contato, Córnea e Refratometria (Soblec), Tânia Schaefer.

O tratamento consiste em aumentar o número de ligações entre as fibras de colágeno da córnea doente e é um procedimento ambulatorial pouco invasivo, com aproximadamente uma hora de duração. Ao final, o paciente fica com uma lente de contato terapêutica que servirá como um curativo enquanto o epitélio cicatriza, o que leva em torno de sete dias.

O tratamento é realizado em sessão única e especialistas apontam que seu efeito dura pelo menos de cinco a sete anos. Não existem ainda estudos que demonstram a necessidade de novas aplicações no futuro, porém essa hipótese deve ser considerada em pacientes mais jovens.

Após a cirurgia, os pacientes devem voltar a ter uma visão satisfatória, com ou sem o uso de óculos, dependendo de cada caso. Em alguns pacientes existe a necessidade de se adaptar lentes de contato, preferencialmente as rígidas, que proporcionam melhor acuidade visual e melhor resposta fisiológica da córnea.

Cirurgia

Quem já passou pela cirurgia está confiante. Marcos Renato Semchechem, de 16 anos, começou a sentir os sintomas há quatro anos e se submeteu ao Cross Linking há poucos meses. “Tinha a visão difícil e o olho coçava muito. A lente rígida ajudava, mas o objetivo do Cross Linking é que a doença não evolua mais”, conta.

No final de maio foi a vez da paciente Márcia Rampanelli, de 31 anos, passar pelo procedimento. “Descobri que tinha ceratocone no final de 2006 e, no início de 2007, engravidei. Ninguém sabe se foi por conta da gravidez, mas a doença começou a se agravar e o médico sugeriu fazer o Cross Linking para que eu não precisasse, no futuro, de um transplante de córnea”, lembra.

A simplicidade da cirurgia foi o principal ponto destacado por Rampanelli, que estava tendo dificuldades como dirigir à noite. “O pós-cirúrgico é pouco doloroso, tem que se tomar alguns cuidados, mas nada muito complexo para o benefício que se tem. O único problema é que os planos de saúde ainda não cobrem o procedimento, porque ele ainda não foi homologado pelo Ministério da Saúde, mas tudo que é novo é assim”, avalia.

Embora seja uma degeneração frequente, nem todos os portadores de ceratocone chegam a precisar do tratamento. Cerca de 15% do total são autoresolvidos e nem chegam a ser diagnosticados, porque de forma natural a córnea volta a se enrijecer. E a maioria dos pacientes que continua com o ceratocone em desenvolvimento podem ter o problema corrigido com o simples uso de lentes de contato, sem necessidade de intervenção cirúrgica.

Geralmente diagnosticado na adolescência, o ceratocone é uma doença que, pode ter origem genética ou traumática. “Há grande incidência do ceratocone em crianças alérgicas, que têm coceira nos olhos, o que determina um astigmatismo irregular sobre a córnea, que pode ser progressivo”, aponta Schaefer.

Cross Linking do Colágeno Corneano

O que é? – O Cross Linking do Colágeno Corneano é indicado para evitar a progressão do ceratocone. O tratamento consiste em desepitelizar a córnea após anestesia tópica (colírio), instilar riboflavina (vitamina B2) e aplicar luz UV-A por 30 minutos. Tem como finalidade aumentar o número de ligações covalentes entre as fibras de colágeno para fortalecer a córnea e estabilizar a doença.

Quem pode fazer – Os pacientes devem ter mais de 14 anos de idade. É contra-indicado para casos com cicatrizes na área central da córnea.

Procedimento – O tratamento inicia-se pela anestesia, com três gotas de colírio, seguido de remoção do epitélio da córnea (células da superfície corneana que regeneram posteriormente) com espátula. O epitélio deve ser removido para que ocorra a penetração da Riboflavina (Vitamina B2) na córnea, que é aplicada através de gotas, por 30 minutos. Procede-se com a aplicação da luz UV-A por 30 minutos e uma lente de contato terapêutica é colocada no olho e retirada após uma semana.

Recuperação – Até a retirada da lente de contato pode haver desconforto ocular associado à sensação de corpo estranho, ardência, lacrimejamento e dor. A recuperação visual é gradual, em até um mês. Para alguns pacientes, entretanto, a melhora completa pode levar de três a seis meses.

Mudanças – Não há alteração estética no olho após o tratamento. Ao microscópio podem ser observadas as linhas de contração do colágeno corneano, responsável pelo aumento da rigidez corneana. Exames semestrais avaliam principalmente a curvatura corneana e o astigmatismo.