Não fosse pela pandemia da Covid-19, a esta altura de um ano qualquer, parte de nós já estaria pensando na programação do Festival de Curitiba. Com ela, porém, não tem Festival. Ou grandes shows na Pedreira. Ou belos espetáculos unindo a Orquestra Sinfônica do Paraná e o Balé Guaíra. Quase um ano depois da chegada da pandemia ao Brasil e, com ela, da suspensão dos eventos criativos e culturais que provocam aglomerações de pessoas, o cenário é ainda de incerteza para este setor.

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“A essa altura do ano, eu geralmente estou com a pauta do teatro fechada. Este ano não tem nada, ela está vazia”, conta a diretora do Centro Cultural Teatro Guaíra, Monica Rischbieter. A fala de Monica reverbera entre outros profissionais da área. Alguns arriscam palpites sobre a possibilidade de retorno de algumas atividades no segundo semestre de 2021, mas tudo depende da situação da pandemia e da imunização da população. “Estamos completamente amarrados à vacinação, que começou. Resta saber se ela vai levar seis meses ou mais de um ano”, diz o diretor da Prime, Mac Lovio Solek.

Apesar disso, a ideia não é só esperar que tudo volte a ser como era antes – até porque os profissionais do setor precisam trabalhar e a demanda por cultura e lazer é contínua, principalmente em um período de adversidades. “Vamos ao cinema, ao teatro etc. porque é alimento para o espírito. Saímos felizes depois de vermos algo bonito ou então refletindo sobre algo. Esses eventos são fundamentais para sobrevivermos nesse momento”, reflete Monica.

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Assim, quem tem recursos está planejando ações, envolvendo principalmente o uso de ferramentas digitais. “Esse ano vamos ter muita coisa online, porque os resultados da Lei Aldir Blanc [no Paraná] são produtos para consumo online. Esse mercado só tem a crescer”, afirma a produtora cultural e proprietária da Santa Produção, Bina Zanette.

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Bina é uma das idealizadoras do projeto Brasis no Paiol, uma série de apresentações mensais de artistas brasileiros realizada desde 2012 no Teatro do Paiol – e que em 2020 migrou para a internet devido às restrições impostas pela pandemia: os dez shows presenciais foram substituídos por cinco edições online, cada uma com dez apresentações gravadas de meia hora, com artistas de projeção local e nacional.

Brasis no Paiol, realizado desde 2012 no Teatro do Paiol, em 2020 migrou para o formato digital; e artistas fizeram suas apresentações em casa. Foto: Reprodução

Resolvemos mudar o foco para colocar mais artistas de Curitiba, porque vimos a necessidade de incentivar o mercado local. Toda verba que usaríamos em logística, usamos para gravar as pessoas em casa. E aí, além de pagar um cachê legal para os artistas, demos um material audiovisual de qualidade para eles”, explica a produtora. Esses registros podem, por exemplo, ajudá-los a serem contratados para novos shows.

A experiência, que terminou em janeiro, a deixou animada e o objetivo é repeti-la – embora com menos edições pois, em 2021, o projeto não vai contar com o incentivo do programa de apoio e incentivo à cultura da Fundação Cultural de Curitiba como foi em 2020.

Quem também aposta no uso do audiovisual e da internet é o Teatro Guaíra. As ideias ainda estão sendo levantadas, mas as experiências de 2020 foram boas. No período, além de disponibilizar gravações de espetáculos no YouTube – o que foi chamado de Guaíraflix –, o centro cultural produziu vídeos envolvendo todos os corpos artísticos (Escola de Dança Teatro Guaíra, Balé Teatro Guaíra, Orquestra Sinfônica do Paraná e G2 Cia. de Dança) e projetos como o Teatro de Comédia do Paraná. No total, eles tiveram 418 mil visualizações, um recorde para o teatro.

O Teatro Guaíra realizou exposições na fachada. Foto: Divulgação/ Teatro Guaíra.

Parte dos vídeos produzidos, como os da Orquestra em parceria com a cantora Uyara Torrente e a atriz Letícia Sabatella, foram produzidos nas casas dos participantes; outra parte reuniu pequenos grupos no teatro para a gravação – uma ideia que pode ser repetida. “A Orquestra já vem fazendo os grupos de câmara. Se tiver três músicos, por exemplo, podemos gravar no Guaíra. Mas estamos num momento delicado [da pandemia] e agora eu prefiro não arriscar”, diz Monica.

Museu híbrido

O uso de ferramentas digitais também abriu novos horizontes para os museus, que passaram a realizar projetos com participação popular via redes sociais, simpósios online e até podcasts. O Museu Oscar Niemeyer, por exemplo além de ter exposições virtuais, fez oficinas artísticas online. Em oito meses, foram mais de 50 atividades adaptadas para serem feitas a distância – as quais tiveram cerca de 5 milhões de visualizações. No programa Arte para Maiores, voltado ao público com mais de 60 anos, houve até participação de pessoas de fora do país.

O MON, que em alguns períodos do ano pôde reabrir suas portas, aposta no modelo híbrido para 2021. Foto: Divulgação

Como em alguns períodos do ano, o museu pôde reabrir suas portas – com controle de público e seguindo protocolos para garantir o distanciamento e a higienização do espaço –, a expectativa para 2021 é que o formato híbrido se consolide. “A partir de 2021, a ideia é que o MON seja cada vez mais híbrido, ou seja, aberto à visitação, inclusive oferecendo várias exposições novas incríveis, mas também mantendo todas as ações virtuais que tiveram início nos últimos meses”, diz a diretora-presidente do museu, Juliana Vosnika. Novas experiências virtuais e parcerias com outras instituições também fazem parte dos planos.

E os eventos presenciais?

Embora a internet tenha sido a grande protagonista da área durante o ano de 2020, alguns eventos presenciais foram realizados. Formatos que deram certo, como o drive-thru das apresentações de Natal promovidas pela prefeitura de Curitiba em parceria com a iniciativa privada, podem ser repetidos.

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De acordo com a presidente do Instituto Municipal Curitiba Turismo, Tatiana Turra, a proposta não só atendeu à diretriz do Natal de Curitiba – a valorização dos cenários urbanos – e proporcionou momentos de lazer para as pessoas, como também trouxe benefícios que não estavam previstos. “Observamos muitos relatos de pessoas idosas e famílias com crianças de colo que acharam fantástico pelo conforto, por estarem protegidos de uma intempérie”, conta.

Formato drive-thru dos eventos de Natal da Prefeitura de Curitiba teve adesão do público e deve ser repetido em 2021. Foto: Daniel Castellano/ Prefeitura de Curitiba.

Os cinemas e espetáculos drive-in também podem ser realizados novamente. Patrick Cornelsen, diretor da Planeta Brasil Entretenimento, produtora responsável pelo Planeta Drive-in em Curitiba e Pinhais, diz que pretende incluir esse tipo de evento no calendário anual da produtora.

“Não tem porque não ter uma edição do Planeta Drive-in todo ano, mas por um período menor”, diz. Em 2020, o evento foi realizado entre junho e dezembro. Exibiu filmes e apresentou espetáculos para o público, que ficava dentro de seus carros, evitando aglomerações e o contato direto entre pessoas. Ainda assim, nada está definido e a perspectiva é de que 2021 seja mais difícil do que 2020, já que o setor seguirá enfraquecido.

Conforme o diretor do Parque das Pedreiras, Helinho Pimentel, o problema dos eventos com grandes estruturas e público reduzido é que eles não são financeiramente viáveis para as produtoras, que estão praticamente sem renda e com dificuldade de acesso a crédito há quase um ano. Argumento semelhante é usado por Monica para explicar porque ainda estuda se shows com público reduzido são uma boa alternativa para grandes teatros, como o Guaíra – embora alguns produtores, como Solek, acreditem que este tipo de evento pode ser visto em 2021.

A valorização dos cenários urbanos é a diretriz para o Natal de Curitiba. Em 2020, eventos presenciais foram adaptados. Foto: Ricardo Marajó/SMCS

Por outro lado, eventos menores ao ar livre podem ser uma opção. Desde meados de outubro, por exemplo, as apresentações do Vale da Música – projeto que promove show de música instrumental em um palco flutuante na Ópera de Arame – estão de volta, de terça a domingo, das 11h às 18h. O público pode acompanhar os shows enquanto visita os espaços da Ópera ou assisti- -las de um deck – onde funciona o restaurante do local –, respeitando o distanciamento.

Shoppings

A rota da cultura e do entretenimento também passa pelos shoppings centers, que inicialmente fecharam as portas e tiveram que suspender atividades de férias, desfiles, exposições, feiras e até shows. Enquanto estiveram fechados, eles também investiram na produção de conteúdo online para se manterem próximos dos clientes. Após a reabertura, reformularam as ações presenciais para evitar aglomerações.

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A rota da cultura e do entretenimento também passa pelos shoppings centers, que inicialmente fecharam as portas e tiveram que suspender atividades de férias, desfiles, exposições, feiras e até shows. Enquanto estiveram fechados, eles também investiram na produção de conteúdo online para se manterem próximos dos clientes. Após a reabertura, reformularam as ações presenciais para evitar aglomerações.

No mês de janeiro, o Pátio Batel promoveu o Animalia, evento contemplativo. Foto: Divulgação/ Pátio Batel

“Em janeiro fizemos a Animalia, uma exposição lúdica e colorida com esculturas de animais. Nesse e em outros eventos tivemos que ir para um lado mais contemplativo e lúdico. São ações que não têm horário específico e têm a preocupação do distanciamento”, explica o superintendente do Pátio Batel, Fernando Bonamico. A ideia é manter o formato em 2021.

Outra proposta que deu certo – e pode ser repetida – foi a de integrar o digital a ações presenciais, como no Natal. “O Papai Noel atendeu todas as crianças, com foto e bate-papo, mas ele estava num local reservado e, através de um sistema de fibra ótica, conversava com as crianças. Todos estávamos muito carentes de tudo, não poderíamos deixar as crianças sem o Papai Noel – e nem ele sem esse momento”, conta a gerente de marketing do ParkShopping Barigui, Silvia Omairy.

Papai Noel do ParqueShoppingBarigüi. Foto: Estúdio Beto Monteiro/ ParqueShoppingBarigüi