Onaireves Moura é preso acusado de desviar R$ 5 milhões na FPF

O ex-presidente da Federação Paranaense de Futebol (FPF), Onaireves Nilo Rolim de Moura, 60 anos, foi preso e mais oito pessoas foram detidas na manhã de ontem pelo Núcleo de Repressão a Crimes Econômicos (Nurce), da Polícia Civil, na Operação Cartão Vermelho. Segundo a investigação, Moura seria o mentor da quadrilha que há alguns anos desvia dinheiro da FPF, através de empresas ?laranja?, para contas particulares. Laércio Polanski, 47, superintendente da entidade, tentou escapar da polícia fugindo pelo telhado de sua casa. Ele caiu e teve que ser encaminhado ao Hospital Cajuru.

As investigações começaram em junho e, durante esse período, foi constatado desvio de aproximadamente R$ 5 milhões da FPF através da Comissão Fiscalizadora de Arrecadação (Comfiar), do Feirão de Automóveis -realizado semanalmente no estacionamento do Estádio Pinheirão – como também do Colégio Técnico de Futebol do Pinheirão. ?Como a FPF está com todo o recolhimento penhorado pela Justiça, exclusivamente para o pagamento de ações trabalhistas e contas fiscais, a quadrilha desviava antes mesmo de o valor ser contabilizado?, explicou o secretário da Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari.

Mandados

A polícia cumpriu os mandados de prisão temporária na sede da FPF e nas residências dos detidos. Documentos foram apreendidos em São Paulo, no escritório de contabilidade da MPT3 e também na sede do Galo Adap, em Maringá.

Segundo o delegado Robson Barreto, além das empresas utilizadas para ?lavar? o dinheiro desviado da FPF, Moura havia fundado a igreja Rede de Deus. ?Ela já estava em funcionamento em Santa Catarina e já tinha até um esquema de dízimos, com sócios ouro, prata e bronze?, contou o delegado.

Segundo ele, todos os detidos foram encaminhados para Piraquara e serão ouvidos amanhã. ?Esperamos que, no máximo em cinco dias, todo o processo de interrogatório e aquisição de documentos esteja completo?, finalizou o delegado.

Superintendente despenca

Foto: Walter Alves

Detenções foram feitas nas residências e na sede da FPF.

O superintendente da FPF, José Laércio Polanski, 47 anos, recentemente foi denunciado pelo artigo 234 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva e suspenso por 210 dias, no caso Batista. Esse artigo se refere à falsificação, total ou parcial, de documento público ou particular, ou omitir declaração, perante a Justiça Desportiva.

Na manhã de ontem, antes que pudesse ser detido pelos policiais do Nurce, na Operação Cartão Vermelho, tentou fugir pelo telhado de sua casa e caiu.

Ele foi socorrido e levado ao Hospital Cajuru com ferimentos na costela, mas passa bem. Assim que for liberado pelos médicos deverá se juntar aos outros detidos no Centro de Triagem, em Piraquara.

Igreja era ?Rede de Arrecadação?

Márcio Barros e Rodrigo Feres – especial para Tribuna


Igreja virtual teria sido usada pra lavar dinheiro. (Reprodução)

Moura criou uma igreja, supostamente com sede em Camboriú (SC), chamada Rede de Deus. Através dela faria lavagem de dinheiro da bilheteria do Campeonato Paranaense e Brasileiro, segundo a polícia. ?Temos a informação que Moura era o controlador e tinha como comparsas nessa empreitada César Alberto Teixeira de Oliveira, 43, ex-fiscal da Comfiar, e José Johelson Pissaia, 59, diretor administrativo da FPF e homem de confiança de Moura?, explicou o delegado Robson Barreto.

A igreja deveria estar localizada nos municípios de Balneário Camboriú ou Camboriú. Só que ninguém na cidade conhece ou ouviu falar da tal igreja. Porém, a empresa Matéria Virtual, que cria sites, foi a responsável pelo da igreja Rede de Deus. Um dos responsáveis pela empresa, que não quis se identificar, relatou à reportagem que a igreja não seria localizada nunca.

A entidade não existia fisicamente, e sim apenas no ?plano virtual?, através da internet. ?Eles deveriam depositar entrada de R$ 1.500, mais o pagamento mensal de R$ 600. Foi feito apenas o pagamento mensal. Como eles não deram a entrada combinada, resolvemos retirar a página do ar?, relatou.

Página

Gentilmente, a empresa colocou a página no ar por alguns minutos, para que fosse analisada pela reportagem. Vídeos, orações, mensagens bíblicas serviam apenas para mascarar o real objetivo de arrecadação da igreja. Havia dois jeitos de doar dinheiro: pelo provedor UOL, onde poderia ser feito depósito por cartão de crédito; ou direto em conta corrente. ?A página não ficou mais que uma semana no ar?, disse um dos funcionários da Matéria Virtual.

Arrecadação de jogos e ?negócios? faziam o caixa do grupo

Márcio Barros

Foto: Walter Alves

Documentos apreendidos em São Paulo e no Galo Adap, em Maringá.

A Operação Cartão Vermelho, além de desmatelar a quadrilha comandada por Moura, identificou diferentes formas que o bando usava para desviar dinheiro da FPF. Segundo o delegado Barreto, a investigação começou em junho, na Comissão Fiscalizadora de Arrecadação (Comfiar). Segundo ele, a empresa foi criada exclusivamente com a intenção de desviar dinheiro da FPF. ?A Comfiar recebeu as arrecadações do Campeonato Paranaense de Futebol 2006/2007, do Campeonato Brasileiro de Futebol e da Copa do Brasil 2007, além de outros pagamentos que deveriam ir para os cofres da federação?, explicou Barreto.

Ele disse ainda que, do valor arrecadado nos campeonatos, 10% (no caso dos estaduais) e 5% (no caso do campeonato brasileiro) são destinados à federação. No entanto, a quadrilha fazia a partilha deixando apenas 5% para a entidade e a outra metade para a Comfiar e em seguida dividia o valor entre seus integrantes.

A FPFTV também foi usada pela quadrilha como forma de desviar dinheiro. Segundo a investigação, a entidade recebeu de uma emissora de televisão R$ 350 mil pelos direitos de transmissão do campeonato paranaense de 2007. O delegado disse que esse valor deveria ser depositado para a FPF e que teria uma parte repassada para os clubes de futebol, mas foi aplicada na criação da FPFTV (com veiculação pela internet) e teria sido depositado também na conta da Comfiar. Os clubes, que também deveriam ser beneficiados com o dinheiro, foram lesados.

Feirão

Pelo arrendamento do estacionamento do Pinheirão, o empresário Roberto Tiboni, 54, havia fechado um contrato de 2001 a 2006, de R$ 100 mil por ano. Em 2006, o contrato foi renovado e o valor teria aumentado para R$ 130 mil por ano, mais 50% da arrecadação do feirão.

O delegado informou que, aos sábado, mais de 600 veículos participavam do feirão. E todo o dinheiro, de alguma forma, passava pela Comfiar.

Fundo mais que perdido

Entre outras maracutaias, o Fundo de Assistência ao Atleta Profissional (FAAP) também se tornou vítima das irregularidades de Moura. O AAP, pela Lei 9.615/98, tem direito a 1% das arrecadações de competições nacionais, contudo, desde 1994, a FPF não teria repassado recursos à entidade. No Paraná, quem deveria ter recebido seria o sindicato dos jogadores. De acordo com o inquérito, teriam sido apropriados indevidamente R$ 1.182.676,71.

Em maio, o procurador do FAAP apresentou denúncia junto ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), que decidiu multar a FPF em R$ 1 mil e passar a recolher os valores descontados dos borderôs para o FAAP e suspender o presidente da FPF por 3 anos.

Onaireves Moura tem uma extensa ficha policial

Foto: Walter Alves

O ex-presidente da FPF foi preso, ontem, com mais oito pessoas por lavagem de dinheiro.

Uma personalidade polêmica, que está envolvida em várias histórias estranhas, mas com uma impressionante capacidade de recuperação. Podia-se resumir assim Onaireves Nilo Rolim de Moura, preso novamente e desta vez pelo Núcleo de Repressão a Crimes Econômicos – Nurce, órgão da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Paraná. A denominação da Operação Cartão Vermelho não poderia ser mais apropriada para o ex-chefão da Federação Paranaense de Futebol – FPF. Além dele, outros cinco diretores da entidade e mais três pessoas ligadas ao presidente também foram detidas por desvio de dinheiro e outras irregularidades. Confira os nomes e funções dos demais integrantes que serão investigados nas páginas 6, 7 e 32.

Moura já havia sido preso em outras duas oportunidades, a última em março de 2006 pela Polícia Federal, por falsidade ideológica, sonegação fiscal e formação de quadrilha. O dirigente ficou dois meses na cadeia. A primeira vez que o cartola foi detido foi em 2000, quando ficou um mês na Colônia Penal Agrícola por não recolher tributos ao INSS (das rendas dos jogos) por um ano e meio. Em maio deste ano, Moura foi suspenso e afastado por três anos da direção da FPF, pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva – STJD. Desta vez a bronca eram fraudes nos borderôs de jogos e o não-repasse de recursos à Associação dos Atletas Profissionais, entre outras irregularidades. A ?expulsão? de Moura da entidade que dirigiu durante 22 anos – o presidente com mais tempo de mandato na Federação Paranaense, e um dos maiores ?reinados? da história do futebol brasileiro – foi coroada ontem, desta vez com a designação de chefe de quadrilha.

Mais sujo que pau de galinheiro

O nome de Onaireves Moura está ligado a várias pendengas jurídicas e problemas com o Poder Público. São diversos processos envolvendo o nome dele e também a Federação Paranaense de Futebol. Até mesmo o automóvel que está vinculado à FPF tem problemas -quase R$ 31 mil entre multas e impostos devidos, além de estar bloqueado por uma ordem judicial.

Em uma rápida pesquisa junto ao Tribunal de Justiça do Paraná, encontram-se, entre 1986 e 2006, 29 processos que contém o nome do presidente da Federação – não necessariamente com Moura como acusado. São ações como a de Hélio Cury, que pretendia destituir toda a diretoria da FPF, pedido indeferido pela 7.ª Câmara Cível, em janeiro deste ano.

Há também ações trabalhistas de funcionários pedindo direitos, pedidos de penhoras de rendas e verbas destinadas à FPF. Para alguns casos, foram feitas penhoras de cadeiras vitalícias do Pinheirão, o que alguns juízes não aceitam mais. Também há reclamações por conta da empresa Top Avestruz, que enfrenta processos por prejuízos causados a investidores. A empresa foi criada em 2004, e prometia ?gordos? lucros para quem investisse na compra e criação de avestruzes. A atividade acabou sendo suspensa um ano depois a pedido do Ministério Público que constatou irregularidades, como a falta de registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que regula a atividade. Os investidores continuam tentando reaver na Justiça o dinheiro aplicado nos avestruzes de Moura.

Outro caso peculiar é o do automóvel Mercedes-Benz que está em nome da Federação. Segundo o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), o veículo tem pendências na ordem de R$ 30.438,61. É quase o valor de mercado do carro. Só em multas são mais de R$ 21 mil reais, todas elas vencidas.

Muitos baixos e poucos altos no reinado na FPF

Após conseguir fazer de Foz do Iguaçu a concentração da seleção brasileira na Copa América de 1999, Onaireves Moura era de novo um dirigente forte em termos nacionais. No Paraná, ele não tinha adversários nas disputas pela presidência da Federação. Só que em 2000 mais um revés atingiu em cheio o dirigente. Ele foi preso pelo crime de sonegação fiscal.

A FPF deixou de recolher R$ 525 mil das taxas destinadas ao INSS nas rendas de partidas realizadas entre dezembro de 1995 e julho de 97. Segundo a Justiça, o dinheiro teria sido usado para obras no Pinheirão. A Justiça Federal de Curitiba o condenou a quatro anos e dois meses de prisão, e Moura foi levado para a Colônia Penal Agrícola.

Ele foi libertado um mês depois da prisão, após receber um habeas corpus por supostas falhas no andamento do processo. Em concorrida entrevista coletiva no dia de sua ?nova posse?, o presidente da FPF disse que iria emoldurar o dinheiro que conseguiu com o trabalho social na Colônia Penal.

De novo Moura reaparecia com força. Tanta que tentou voltar à política em 2002, candidatando-se a deputado estadual. Obteve pouco mais de seis mil votos e não se elegeu. Desistiu da política e voltou-se à FPF, onde foi reeleito novamente em 2004. Em agosto de 2005 começou a pipocar o famoso caso dos Bruxos no futebol paranaense – esquemas de manipulação de arbitragens. Nos julgamentos, árbitros e dirigentes de clubes foram afastados. A diretoria da entidade passou à margem do escândalo. Na temporada de 2006, a entidade criou a FPFTV – para transmissão pela internet de jogos e programas esportivos. A programação apareceu no Estadual deste ano, mas enfrentou vários problemas de pagamentos dos profissionais que trabalhavam no projeto. O projeto foi abortado. O inferno astral do cartola aumentou com a punição e afastamento do presidente do TJD do Paraná, José Roberto Hagebock, por deixar de cumprir decisão do STJD no caso envolvendo a disputa pela vaga no Estadual antes do início do certame, que foi conquistada na justiça pelo Engenheiro Beltrão.

Em maio, ainda antes de ser afastado da entidade, Moura tentou bancar o Pinheirão como estádio indicado pela Federação e pelo governo do Estado para ser uma das sub-sedes da Copa de 2014. Mas o estádio foi lacrado e interditado pela Justiça por falta de laudos técnicos. O Joaquim Américo, do Atlético, é o local pré-indicado junto à CBF.

Perguntado certa vez se sairia da entidade, Moura falou que isto só aconteceria quando ele quisesse. Não se sabe ainda se esta nova derrota na Justiça pode interromper sua trajetória na FPF. Ou se ele vai conseguir se reerguer de novo.

Trajetória complicada

Onaireves Moura apareceu no futebol paranaense ao assumir a presidência do Atlético em 1982. Com uma administração agressiva, contando com elementos da então famosa Retaguarda Atleticana (como seu vice de futebol Valmor Zimmermann) montou o time bicampeão estadual, e que chegou às semifinais do Brasileiro de 83.

Início da carreira

Em 1985, Moura candidatou-se à presidência da FPF. Concorreu com o então presidente Harold Alberge e com o diretor do Colorado e político Aziz Domingos. Venceu e retomou de imediato a construção do Pinheirão, que transformou-se no seu principal cavalo de batalha. Conseguiu trazer a seleção brasileira para jogar na inauguração do estádio e, contra o Chile, Zico foi o primeiro a sofrer com os famosos buracos do Pinheirão, torcendo o joelho.

Às vésperas da Copa do Mundo de 86, Moura foi nomeado diretor de relações públicas da CBF – um cargo que nunca existiu, segundo o relato do próprio cartola àquele período. Ele acabou envolvido no chamado ?escândalo do videoclip?, uma acusação de extorsão feita pelo publicitário Rogério Steinberg (falecido no mesmo ano) que atingia diretamente o então vice da entidade Nabi Abi Chedid. Afastado do poder nacional, o presidente da FPF voltou-se para a política regional.

Rasteiras e caneladas na política

A primeira parte da gestão de Moura foi voltada para os clubes menores e entidades amadoras. Com a força destes no colégio eleitoral, o presidente conseguiu se reeleger na FPF, e em 1990 foi eleito deputado federal. Às vésperas do impeachment de Fernando Collor, em 92, promoveu um jantar em homenagem ao então presidente da República. Na votação, optou pela saída de Collor. No ano seguinte, foi cassado por quebra de decoro parlamentar – ele foi acusado de coordenar a compra de outros deputados para que ?engordassem? a sua legenda, o PSD.

Parecia que ele recebera um golpe definitivo, mas no futebol paranaense nada aconteceu. Moura seguiu presidindo a FPF, mantendo um bom relacionamento com o presidente da CBF, Ricardo Teixeira – não sem alguns desentendimentos. Em 1998, entretanto, novo escândalo: ele foi destituído do cargo pela Justiça, por causa de uma dívida de R$ 1,2 milhão com a Prefeitura de Curitiba. Era falta de pagamento do IPTU. Foram nomeados dois interventores para a Federação – um para a parte jurídica e outro para o futebol. Mas o período de afastamento durou pouco: outras irregularidades foram descobertas e os interventores também foram afastados. Onaireves Moura voltou à FPF acusando os que ocuparam seu lugar e demitindo alguns funcionários que permaneceram na entidade. Era a terceira ?ressurreição?.

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