Ser ou não ser

Ouvindo o presidente Lula em seus repetidos pronunciamentos, tem-se a impressão de que seu drama é o shakespeariano ?ser ou não ser?. Ele tenta fazer crer que está em dúvida sobre se será ou não candidato à reeleição. Entretanto, quando fala às camadas mais humildes da população, não por coincidência as de menor escolaridade e menos informações, fica claro que ambiciona ser candidato à reeleição, que acredita que será eleito e já está em plena campanha.

Nisso ele muito se parece com o presidente venezuelano Hugo Chávez, um militar de esquerda que logrou se eleger depois de haver tentado tomar o poder através de um golpe. A diferença essencial entre os dois presidentes e amigos pessoais é que Lula busca manter boas relações com o governo norte-americano, enquanto Chávez não perde nenhuma oportunidade para hostilizá-lo. No mais, ambos procuram cercar-se das massas desassistidas, pois elas não têm informações para aquilatar o que vai mal no governo e por que este merece críticas que, para outras camadas da população, dão a certeza de que não deve ser reeleito.

O eleitorado para o qual Lula fala não sabe o que é PIB, superávit primário, política fiscal nem se sente desalentado quando o presidente declara, agora que o governo enceta o fim de seu mandato, que nunca prometeu dez milhões de empregos. Promessa que fez e, ao longo de todos os primeiros anos de mandato, nunca desmentiu. Só se desculpou.

Esse eleitorado aceita como suficientes as cestas básicas, os programas assistencialistas e os discursos em que o Corinthians é invocado como grande cabo eleitoral do candidato petista. Os eleitores que arrebanha não sabem o que é caixa 2 nem outras maracutaias praticadas no seio das forças situacionistas. Assim, mantém uma inabalável fé que remove montanhas. No caso, montanhas de promessas não cumpridas, de irregularidades, ilegalidades e procedimentos que atentam contra o regime democrático. Muitas dessas irregularidades e ilegalidades nem Lula nega. Mas julga bastar um pedido de desculpas.

Na Venezuela acontece a mesma coisa. A parcela majoritária do povo que apóia Chávez não vê, porque lhe faltam conhecimentos, que o militar golpista está destruindo a democracia daquele país vizinho, dando o golpe que tentou pelas armas e fracassou, agora através de eleições contestadas, fraudadas talvez e, de qualquer forma, distorcidas pela força da demagogia e enorme abstenção.

Salvo motivo de força maior, que não será de ordem ética nem legal, Lula será candidato à reeleição e é bem possível que se reeleja. O problema de financiamento da campanha ele diz que não o preocupa, embora todos saibamos que neste imenso País, mesmo uma campanha eleitoral modesta custa muitos milhões. Não o preocupa o fato de o PT estar falido. Tão falido que seus funcionários andaram em greve por não receberem seus salários e vários credores estão recorrendo à Justiça, procurando receber o que o partido lhes deve.

Para reeleger-se, Lula chega a desafiar o Congresso, criando uma situação que em um país mais sério ou, digamos melhor, severo, seria um conflito entre poderes. José Dirceu acaba de ser cassado pelo Congresso e Lula não só critica essa decisão do Legislativo, como declara que levará seu ex-chefe da Casa Civil ao palanque de campanha. Pela lógica, a atividade política está vedada ao parlamentar cassado e sem direitos políticos por oito anos, mas isso não importa para o presidente.

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