Ronda perigosa

Pouca gente haveria de crer se a posição ora assumida pelo governo, encarnada na pessoa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva – para que ninguém duvide – fosse veiculada há uns três meses. À época só se falava de crescimento da economia e do advento dos avanços sociais correspondentes. Hoje, o panorama difere e o governo que alardeava conquistas sem precedentes na história recente do País, pratica o discurso da prudência diante do ogro inflacionário que estende as garras sobre a economia industrializada e ronda perigosamente os países emergentes.

O presidente da República tem insistido no tema desagradável, mas reiterando que o governo tem instrumentos, conhecimento de causa e experiência suficientes para agir no momento certo a fim de controlar a inflação, o maior desafio da equipe econômica no atual contexto. A mudança de tom no discurso oficialista sobremodo auto-suficiente de poucos meses, é perceptível no fato de o governo admitir a necessidade de imprimir um ritmo mais moderado ao crescimento econômico, com a finalidade precípua de impedir o aceleramento do motor inflacionário. Lula asseverou com a objetividade pragmática que o tema requer, a necessidade de fazer com que o ritmo do crescimento econômico acompanhe a demanda, pois se ocorrer o contrário, ou seja, o nível do consumo superar o nível da oferta, a inflação estará de volta.

As projeções do Banco Central quanto à expectativa inflacionária para o próximo ano estão em alta, passando de 4,6% para 4,63% na semana passada. A meta de inflação definida para 2008 é de 4,5%. O chamado Top 5, formado pelos cinco analistas que maior grau de acerto têm obtido em suas projeções concorda com a elevação inflacionária: ela deverá ser de 4,96% em 2009. Há uma semana a projeção estava em 4,68%.

Para o exercício atual, o Top 5 já trabalha com o percentual inflacionário de 5,8%, deixando para trás a estimativa anterior que era de 5,55%. O preço dos alimentos consubstanciados no Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), atingiu a maior alta desde fevereiro de 2004, na primeira leitura de junho realizada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Na segunda leitura do mês foi registrado um pequeno declínio de 0,05 ponto percentual, apontando uma inflação de 1,07% no período.

Abrindo o foco da observação para o cenário mundial, é possível perceber que adversidades climáticas nas principais regiões produtoras de grãos nos Estados Unidos têm exercido pressões altistas sobre os preços do milho nas principais bolsas internacionais e também no Brasil. O exemplo claro vem da Bolsa de Chicago, referência globalizada para as cotações de commodities agrícolas de maior procura, onde o preço do milho se mantém firme no patamar mais elevado da história. O mesmo aconteceu com as cotações da soja e da carne bovina, cujos preços de mercado sofrem o impacto inevitável do aumento das matérias-primas utilizadas na produção industrial de rações animais.

Desde o final de 2006 as commodities citadas (milho, soja e trigo) ingressaram num ritmo ascendente estimuladas pelo gradativo aumento da demanda por alimentos nos países de economia em desenvolvimento. Não muito tempo depois os preços das mesmas passaram a ser contaminados pelo que os economistas passaram a denominar de ?efeito biocombustíveis? e, ainda, pelo maior aporte de recursos provenientes de fundos de investimento que anteriormente não demonstravam interesse pelo mercado agrícola.

Dentre os maiores produtores mundiais de produtos agropecuários, os preços internos no Brasil também são afetados, para mais ou para menos, pelas contingências internacionais. Lula tem razão em receitar prudência e caldo de galinha. 

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