Pesadelo

Nada é melhor para corruptos que a difusão do estado de corrupção. A sabedoria é de Anadyr de Mendonça Rodrigues, ex-procuradora da República que, no cargo de corregedora-geral da União, ostenta o título de ministra. Depois de dezesseis meses à frente do órgão que nasceu para abortar uma CPI da corrupção, ela contabiliza 466 punições contra servidores federais e mais de quatro mil processos analisados. Apesar de sua vida ser consumida em cima de hipóteses de corrupção de todos os gêneros, Anadyr é o que se poderia chamar de otimista. Nem tudo está perdido. “Há interesse ? sentencia ? em vender uma imagem de ampliação da corrupção exatamente por parte de quem dela se beneficia.”

No campo dos conceitos, entretanto, nem sempre prevalece o que parece nortear as ações da corregedora-geral. Na prática, a morosidade da Justiça oferece notável contribuição ao crescimento da difusa sensação de impunidade. Essa “imagem de ampliação da corrupção” tem, portanto, outros ingredientes em sua construção que o simples interesse de corruptos. Pode, também, atrapalhar os justos.

É inconcebível, por exemplo, o que se passa em Curitiba: desde que foi reeleito para o comando da capital, uma espada pende sobre a cabeça do prefeito Cássio Taniguchi, acusado de ter manipulado um enorme caixa 2 durante a última refrega eleitoral. Permanecer sob suspeita é um pesadelo para todos. Não é bom para ele, que perdeu a chance antes vislumbrada de ocupar o Palácio Iguaçu; não é bom para a cidade, um dia vendida como modelo para o Brasil e para o mundo; não é bom para ninguém que, estando próximo do prefeito, sai com as mãos chamuscadas nesta atual eleição de muitas dúvidas.

Os fantasmas que minam a reputação de Taniguchi começaram a agir quando o jornal Folha de S.Paulo publicou matéria, em novembro do ano passado, sobre um suposto caixa dois da coligação “Curitiba Sempre com Você”, que reelegeu o prefeito. Ao Tribunal Regional Eleitoral, conforme a denúncia original, a coligação declarou terem sido gastos R$ 3,11 milhões na campanha, quando atrás dessa soma estariam quase dez vezes mais ? outros R$ 29,8 milhões. O uso de um caixa paralelo foi confirmado pelo tesoureiro da campanha, Francisco Paladino Júnior, e comprovado num inquérito aberto pela Polícia Federal. Mas, desde então, num vai-e-vem impressionante, as dúvidas persistem, os processos se amontoam e, a despeito dos sucessivos pedidos de afastamento dos eleitos, tudo segue normalmente.

Seria salutar que os fatos tivessem sido esclarecidos antes da atual campanha. Embora o prefeito sob suspeita tenha se abstido da disputa, seu vice que também teria sido beneficiário do mesmo caixa 2, segundo denúncia do Ministério Público ? ora pleiteia a confiança do eleitorado para sagrar-se governador de todos os paranaenses. E diante da suspeita que pode ainda tornar nula a diplomação dos dois (uma hipótese decorrente da denúncia e das investigações até aqui realizadas), como imaginá-lo merecedor do sufrágio, mesmo que se lhe dê o benefício da dúvida? Aos varões de Plutarco não cabem sombras de dúvidas, muito menos acusações envolvidas com a fumaça do bom direito.

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