Sai sentença por golpes em Guaratuba

Uma decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) pode abrir precedentes para confortar as pessoas que foram enganadas com os golpes de venda de terrenos em Guaratuba, no litoral do Paraná. No mês passado, o advogado e corretor de imóveis Cotingo José da Silva Mota foi condenado, por estelionato, a cumprir pena de um ano e seis meses de reclusão. Mas a pena foi substituída por prestação de serviços à comunidade, na razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, e por prestação pecuniária no valor de R$ 5 mil ao empresário Marcos Arroio, vítima do golpe, e outras duas pessoas. Cabe recurso à decisão.  

O caso de Arroio foi relatado em março de 2005 por O Estado. Três anos antes, ele comprou 31 lotes do Residencial Vil-lage, no valor de R$ 110 mil. A operação foi feita por Cotingo José da Silva Mota, então seu advogado e dono da Imobiliária Araguaia, em Joinville. Arroio relata que foi mostrada a ele uma área diferente daquela onde realmente estão os lotes, em um manguezal dentro do Parque Estadual Boguaçu. A intenção do empresário era realizar investimentos imobiliários e vender os lotes para fins de construção civil, segundo informações do processo judicial. Arroio também pretendia construir uma pousada no local. Antes de descobrir o golpe, ele ?revendeu parte dos lotes para as também vítimas Eraldo Rosa e Nivaldo Pinheiro, que descobriram posteriormente tratar-se de área imprópria para a construção civil?, conforme a ação penal. Rosa e Pinheiro são as duas outras pessoas que vão receber prestação pecuniária no valor de R$ 5 mil.

O Jardim Village é um loteamento formado por 476 quadras, com cerca de 40 terrenos em cada uma, na década de 1970. Existem mais de 16 mil matrículas de compra e venda de lotes no Jardim Village. Quando descobriu o golpe, o empresário Marcos Arroio tentou desfazer o negócio e reaver o dinheiro, mas ele e sua família foram ameaçados. ?Muita gente foi enganada com esses golpes de lotes em Guaratuba e muita gente continua oferecendo os terrenos?, afirma Arroio. Agora, ele pretende entrar com uma ação na esfera cível para reaver os valores que aplicou na compra dos lotes.

A decisão da Justiça catarinense tem uma grande importância no caso dos golpes. Quem cai, normalmente, são pessoas de fora de Guaratuba, pois os moradores da cidade conhecem as histórias de gente que comprou o lote e, quando chegou para ver onde era, se deparou com um manguezal. E a situação não se restringe apenas ao Jardim Village. Há quase uma dezena de loteamentos similares em Guaratuba.

Quem oferece e vende esses lotes alegam ser procuradores que podem realizar esse tipo de negociação, e não proprietários da área. Quem compra são pessoas de boa-fé ou por indivíduos com a intenção de fraudar financiamentos bancários ou compensação de créditos tributários. Na sentença do Poder Judiciário de Santa Catarina, o juiz João Marcos Buch, da 2.ª Vara Criminal de Joinville, descreve que ?… o delito foi cometido com alto nível de organização, incluindo a utilização de laudos de avaliação inverídicos, documentação aparentemente hígida, cadeia sucessiva de substabelecimentos de procuração, sendo que proprietários anteriores também estão envolvidos em delitos da mesma natureza em outras comarcas, e constantes coações para silenciar as vítimas. As conseqüências foram graves, haja vista que as vítimas tiveram ingente prejuízo e não foram ressarcidas, tendo seus direitos cerceados. O comportamento das vítimas em nada contribuiu para o delito?.

Cotingo José da Silva Mota informou que vai recorrer da decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Ele alegou ser apenas o procurador nessa negociação da compra dos lotes do Jardim Village.

Projeto pode pôr fim ao impasse

O caso dos loteamentos irregulares em Guaratuba está sendo estudado para a elaboração de um projeto que termine com o impasse. O assunto é discutido pelo Conselho de Desenvolvimento Territorial do Litoral (Colit), vinculado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema). ?Estamos buscando mecanismos para que o projeto atenda os interesses do Estado, responsável pela gestão dos recursos naturais (no caso, a conservação irrestrita destas áreas); do município (que não perderá a receita obtida com estes terrenos na cobrança do IPTU); e ainda a população guaratubana, que terá mais uma opção de exploração turística destas áreas preservadas?, informa o secretário-executivo do Colit, Luiz Fernando Braga, por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa da Sema.

Segundo o órgão, Guaratuba possui 83 loteamentos situados em áreas protegidas e um deles é o Jardim Village. Desses loteamentos, 19 são clandestinos – sem qualquer documentação junto à prefeitura ou cartório de registro de imóveis. Outros 11 são considerados irregulares, nos quais há processo de registro em cartório, mas os documentos não foram emitidos.

O Colit ainda comunica que o Jardim Village tem 93% de sua extensão em área protegida com mangues ou floresta atlântica em estágio secundário ou avançado de desenvolvimento. A Lei Federal 11.428/06, conhecida como Lei da Mata Atlântica, proíbe a ocupação destas áreas.

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