Progresso incomoda moradores de Paranaguá

Mau cheiro. Muita poeira. Tráfico intenso de caminhões pesados e trens. Fumaça. Barulho constante. Depósitos, armazéns e terminais imensos que comportam os mais variados produtos, inclusive tóxicos e inflamáveis. Este é o cenário normal de áreas industriais ou portuárias, porém certamente não é o vizinho que ninguém deseja. No entanto, com o passar dos anos muitas pessoas viram o ?progresso? crescer em volta das suas casas e ficaram acuadas no meio da imensidão econômica que estas empresas representam. Um exemplo claro deste problema, e que se evidenciou no último mês por causa de explosão em uma indústria, que destruiu diversas casas, é a área retroportuária de Paranaguá.

Diversas empresas cresceram em volta do Porto de Paranaguá e, conseqüentemente, em volta de diversas casas que já estavam lá. A mistura do residencial com o industrial cresceu ao ponto de empresas que lidam com produtos tóxicos estarem sediadas ao lado de casas onde moram diversas famílias. ?Eu moro aqui há quase dez anos. A casa está sempre suja e o mau cheiro é o tempo todo?, contou o motorista Gerson Gonçalves, que mora em frente a uma indústria de adubos e fertilizantes, onde a chaminé não pára. Na portaria da indústria, a menos de dez metros da casa dele, até o segurança que fica na guarita da entrada usa máscara de proteção por causa do mau cheiro.

O local onde Gonçalves mora se chama Vila Becker. Lá cerca de 400 famílias dividem o lar com a rotina das indústrias. ?De repente as firmas cresceram e o porto aumentou em volta das casas. Aumentou o movimento de caminhões e agora tem muitos acidentes. E tem muita fumaça e poeira?, reclamou a dona de casa Adriana Martins da Silva. Sua casa fica em uma rua estreita próxima a diversas estruturas industriais. Na Vila Becker fucionam seis indústrias que trabalham com produtos líquidos, entre eles inflamáveis. Lá estão os produtos mais perigosos, mas o acidente que aconteceu há cerca de um mês no bairro Guadalupe, onde um armazém de sal explodiu e casas foram queimadas, provou que o perigo também está presente em pelo menos seis outros bairros da cidade.

?Todo lugar tem perigo. Não me incomoda. Tem gente que reclama do trem. Mas cada um tem sua função?, afirmou a aposentada Maria Pina, que mora no Guadalupe há 50 anos. Sua casa e as de seus inquilinos estão em frente à empresa de sal onde o armazém explodiu e a 50 metros da linha do trem. A aposentada é exceção, mas muitos moradores que se incomodam não querem sair do local. ?Eu moro aqui há 37 anos. E eu tinha autorização do porto para morar aqui. Quando fiz minha casa não tinha nada aqui. Eu não quero sair daqui para ser colocada em um lugar pior?, explicou a comerciante Berenice de Oliveira Santos, que viu a casa de todos os seus vizinhos queimarem na última explosão.

Regularização

Muitas pessoas compraram ou até receberam autorização para construir suas casas nestes bairros há mais de 20 anos. No entanto, 30% do território de Paranaguá pertencem à União e muitas destas casas são consideradas ocupações. A secretaria de Urbanismo de Paranaguá afirmou que o ideal é relocar as famílias que moram nos locais de risco, no entanto não haveria áreas suficientes para alojá-las. A Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar) fez o cadastro das famílias que moram na Vila Becker para saber a quantidade exata. Futuramente um plano de retirada pode ser formulado.

Comunidade treinada para emergências

O Corpo de Bombeiros, em parceria com as seis empresas que estão instaladas na Vila Becker, está preparando um plano de evacuação, em conjunto com a população. Mas, ao contrário do que o nome parece, o plano não é para retirar as pessoas da região. A intenção é prepará-las para agir em alguma situação de emergência. O plano visa cumprir o Decreto Estadual 6.416/02, que regulamentou o Sistema Integrado de Comando e Operações em Emergência (Sicoe). O objetivo da legislação é ?integrar os órgãos públicos, com a iniciativa privada e com a comunidade, para fazer frente aos desastres causados pela natureza ou ação humana?.

?A iniciativa foi de duas empresas e as outras se interessaram em participar também. A comunidade aceitou participar e agora estamos fazendo as inscrições para o treinamento prático?, explicou o subcomandante do Corpo de Bombeiros do Litoral, capitão Jonas Emmaneul Benghi Pinto. A idéia de fazer o plano de evacuação surgiu em abril do ano passado e desde então a corporação está se reunindo com a iniciativa privada e a população para organizá-lo. A expectativa do Corpo de Bombeiros é realizar o treinamento prático no próximo dia dez de novembro, quando uma das empresas vai simular um vazamento de gás para treinar seus funcionários.

O Corpo de Bombeiros espera a participação de pelo menos 150 moradores no treinamento de novembro. E a idéia é estendê-lo para outros bairros que estão no meio das grandes empresas. ?O importante é que todas as forças sejam convertidas para um único local em uma situação de emergência?, explicou o capitão. O subcomandante do Corpo de Bombeiros afirmou que este tipo de treinamento já é feito em diversos locais do País onde há casas em meio a locais de risco. (AB)

Terminal de álcool gera polêmica

Foto: Allan Costa Pinto

Sem alvará, construção gera atrito entre Prefeitura e Appa.

A construção de um terminal público para armazenamento de álcool na Vila Becker, ao lado das outras empresas já presentes na região, está causando discordância entre a Prefeitura e a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa). O terminal paranaense foi construído em uma área de 32 mil metros quadrados e tem sete tanques com capacidade de armazenamento de 35 milhões de litros. A Prefeitura alega que os tanques estão próximos aos moradores e por isso não deu alvará para realização da obra.

?O problema é que eles começaram a obra sem submeter o projeto à aprovação da secretaria de Urbanismo. Apesar de agora aquela região ser considerada zona de interesse portuário, à época da construção o zoneamento urbano determinava que aquela área era destinada à regularização fundiária e entramos com uma Ação Civil Pública para embargar a obra?, explicou o secretário municipal de Urbanismo, Ayro Cruz Neto. A Prefeitura conseguiu uma liminar em primeira instância, que a Appa reverteu no último dia 10. O secretário afirmou que a Prefeitura deve entrar com mais um recurso na Justiça caso o terminal comece a funcionar.

O engenheiro da Appa responsável pela obra do terminal público de álcool, Ogarito Linhares, garantiu que os tanques foram construídos seguindo normas internacionais de segurança. ?Só não temos alvará porque a Prefeitura não quis dar com alegações que a Justiça já superou em segunda instância?, garantiu. Linhares garantiu que a distância entre os tanques e as casas é maior que os 30 metros mínimos exigidos. Questionado se o problema do terminal é fruto de uma briga política, já que Linhares foi opositor pelo PMDB do atual prefeito, José Baka Filho (PDT), nas últimas eleições, o engenheiro afirmou apenas ?que isto está vinculado a outros interesses?. (AB)

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