Defensoria pública

OAB faz convênio inconstitucional com Estado

Num flagrante descumprimento ao que prevê a Constituição Federal no que diz respeito ao atendimento judiciário gratuito para as camadas mais pobres da população, o Paraná continua mantendo uma Defensoria Pública “fantasma”, criada há 19 anos, mas até hoje não regulamentada.

Pouco mais de 40 defensores públicos trabalha atualmente no órgão, que ocupa parte de um prédio na Alameda Cabral, centro de Curitiba. As precárias condições de atendimento ao carente deveriam ser solucionadas com concurso público, verbas e efetivo fortalecimento da defensoria com sua regulamentação.

No entanto, o Estado partiu para uma solução “capenga” e inconstitucional, firmando convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil seção Paraná, para a contratação de advogados dativos que receberão quantias irrisórias para acompanhar as causas até o transitado e julgado.

Convênios iguais já estão sendo contestados em outros estados, como o Rio Grande do Norte e o Espírito Santo, justamente por ferir a Carta Magna do País. Ações diretas de inconstitucionalidade já foram julgadas procedentes nos dois estados, que também lutam pelo fortalecimento da Defensoria Pública, como única maneira legal de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados.

Convênio

O convênio do Paraná, firmado em maio deste ano, provocou críticas e notas de repúdio de órgãos de defesa de direitos humanos, como a Pastoral Carcerária Nacional.

A entidade salientou que o valor empregado para colocá-lo em funcionamento (R$ 65 milhões a serem pagos em cinco anos) poderia criar e estruturar efetivamente a Defensoria Pública, que hoje sequer atende a área criminal do Direito, por falta de condições.

A estranheza maior recai sobre a OAB-PR que, pela sua própria natureza, deveria defender a Constituição Federal e exigir seu total cumprimento, não concordando com qualquer alternativa ou paliativa para o problema.

No máximo poderia fornecer assistência jurídica para a regulamentação da Defensoria Pública, mas da forma como o convênio foi firmado, ela intermediará o pagamento entre o Estado e advogados dativos, previamente inscritos através de termo de adesão para prestação de assistência judiciária criminal na capital e criminal e cível no interior do Estado.

O convênio tem a duração de cinco anos, com a transferência de R$ 65 milhões para a OAB, em parcelas mensais de R$ 1 milhão, para que ela execute o pagamento dos advogados dativos, de acordo com os trabalhos que executem.

Reprodução
Tabela mostra as quantias irrisórias pagas aos advogados conveniados.

Advocacia dativa é diferente de defensoria pública

Redação

O criminalista Matheus de Almeida, que já perdeu as contas de quantas vezes atuou de forma dativa, explica que o defensor público é contratado pelo Estado, é um funcionário público.

Já o defensor dativo é um advogado particular, que conta com a confiança do juiz que o nomeia para representar quem não tem condições de pagar advogado. Segundo ele, a advocacia dativa precisa ser vista como forma complementar e jamais substituir a Defensoria Pública, que está prevista na Constituição Federal.

Ao analisar a situação, Almeida considerou irrisórios os valores previstos no convênio para pagamento dos dativos. Na &,aacute;rea criminal, por exemplo, para uma defesa no Tribunal do Júri com recursos até o trânsito em julgado, o pagamento é de R$ 1.200,00. Pela revogação ou relaxamento de prisão preventiva ou de liberdade provisória com ou sem fiança, o valor previsto é de R$ 300,00.

Na área Cível, o mais alto valor é para ações possessórias, de R$ 1.200,00; para uma investigação de paternidade, é de R$ 800,00, e para uma ação de alimentos é de R$ 600,00.

E esta tabela do convênio é para acompanhamento integral dos processos, inclusive em segundo grau, o que poderá significar anos de trabalho até o resultado final.

De acordo com a OAB-PR, cerca de dois mil advogados já se inscreveram pelo site www.oabpr.org.pr, para participarem do convênio. Listas com seus nomes estão sendo encaminhadas aos juízes das comarcas.

Eles só podem trabalhar no município caso tenham domicílio profissional e escritório com instalações adequadas para atender os assistidos. Não é permitido subestabelecer os poderes recebidos.

A limitação geográfica na atuação do dativo, no entender de Matheus Almeida, poderá criar outro problema: o de sobrecarregar advogados da Grande Curitiba e dos pequenos municípios, já que proíbe atendimento feito por profissionais da capital.

“Eu atuo em todo o Paraná. Mas, com o convênio, se for nomeado dativo pelo juiz de São José dos Pinhais, não vou receber por isso. Só um advogado que tenha escritório lá é que poderá participar do convênio”, explicou. 

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