O diabo é a comparação

O inferno são os outros, diz a memorável frase de Jean-Paul Sartre. E, partindo dessa premissa, penso ser a comparação o próprio diabo, pois dela nascem a cobiça e a inveja, verdadeiros tormentos da condição humana.

O outro sempre foi nossa medida fundamental, o critério maior para a auto-avaliação. Visitamos a existência alheia, então, pela incansável busca do auto-conhecimento. Ocorre que toda comparação está fadada ao fracasso porque, obviamente, uma pessoa nunca é igual a outra. Cada situação da vida é sempre única. Todavia, mesmo sabendo disso, insistimos em nos torturar comparando-nos uns aos outros. Eis o paradoxo: precisamos do outro para conhecer a nós mesmos, mas a sua simples presença seguidamente nos mete no abismo que é desejar ser o que não somos. Assim, ficamos num estado de suspensão dos sentidos, quase hipnótico, afastados da própria realidade, no universo das possilidades não realizadas ou frustradas.

Vivemos em função das ilusões e, uma das maiores é, sem dúvida, a de que se fôssemos como os outros, poderíamos ser mais felizes. Por isso, sempre estamos com o foco voltado para fora, na constante procura de paradigmas, modelos que nos possam ser fonte de inspiração. Mas insisto, nunca uma realidade é igual a outra. E creio que isso seja não apenas uma evidente fuga, mas também um mecanismo simplista de ver a vida, como se nos outros estivessem (no plano pessoal e material) a solução para nossas aflições mais íntimas. Se os outros parecem ser mais felizes, acreditamos realmente nisso e, num delírio mental, cobiçamos ou invejamos realidades alheias, as quais, quase sempre, não passam de apenas falsas imagens bem construídas. É um sofrimento, sobretudo inútil, porque ninguém tem as respostas que buscamos.

Direi o óbvio: se desejamos o auto-conhecimento, devemos buscar a auto-aceitação. Esse é sempre o primeiro passo (e o mais difícil), porque queremos tudo, menos olhar para dentro. Já notaram que raramente olhamos nossos próprios olhos diante do espelho? Seria por medo? Somos como aquela pessoa na beira do rio mexendo na água para evitar que ela reflita a própria imagem. Talvez o nosso olhar possa nos dar o conforto que, em vão, buscamos no outro e, quem sabe, até mesmo concluir que a resposta pode ser bem mais simples do que pensamos.

Se continuarmos, contudo, presos às garras da comparação, corremos o risco de passarmos pela vida vagando de ilusão em ilusão, vivendo todas as vidas possíveis e imagináveis, menos, infelizmente, a própria. Em outras palavras, poderemos perder a oportunidade de desfrutar do melhor da existência humana que é justamente ter a consciência de que somos todos realmente únicos.

Djalma Filho é advogado

djalma-filho@brturbo.com.br

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