A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal vai votar, nesta semana, o pedido de ingresso da Venezuela no Mercosul. Há má vontade no Congresso brasileiro. O presidente venezuelano é visto com reservas não só porque impõe ao seu povo um tal de socialismo bolivariano, com forte cheiro de ditadura, como em razão da agressão gratuita ao nosso Congresso, dizendo que ele segue ordens dos EUA. O parlamento não vai posar de anjo, pois muitos são seus pecados, mas para o povo e para os analistas políticos sérios é evidente que se trata de injúria e difamação. De outro lado, o próprio presidente Hugo Chávez, em mais de uma ocasião, tem tratado o Mercosul com menoscabo e sua insistência em dele fazer parte é evidente tentativa de alijar o Brasil de uma posição de liderança. Juntando-se ou tangendo governos latino-americanos ditos de esquerda, que por aqui têm nascido como cogumelos, Chávez quer impor suas idéias, sua liderança inspirada em Fidel Castro e montar um grupo que possa desafiar os demais blocos pela força do petróleo, que a Venezuela tem, que a Bolívia também tem, principalmente na forma de gás, e que o Brasil necessita, almeja e pode ser que um dia venha a ter em abundância. É bem recente a gozação de Chávez em cima de Lula, zombando do significado da descoberta de um grande e ainda inexplorado poço de petróleo nas águas da bacia de Santos. Na reunião da Cúpula Ibero-Americana em Santiago do Chile, o presidente da Venezuela zombou do nosso governante e do Brasil, fazendo rir a platéia de chefes de Estado e de governo. E riu o próprio Lula, que depois andou afirmando que, como asseverou Chávez, o Brasil quer entrar na Opep, fazer uma empresa binacional de petróleo com a Venezuela e sair vendendo o ouro negro a preços baixos para agradar e atender aos países mais pobres e necessitados. O capítulo seguinte foi a desistência da Petrobras de um novo negócio na Venezuela, porque os venezuelanos pretendem atender o seu próprio mercado. E interessa ao Brasil vender gás de petróleo ao mundo, num mercado em que os preços são promissores.
Esses fatos e essas senão turbulentas pelo menos duvidosas relações entre os dois governos e os dois países acabaram por deslanchar num aberto, desnecessário e desarrazoado apoio de Lula a Hugo Chávez e à sua revolução socialista bolivariana. Lula declarou à imprensa que ?podem criticar o Chávez por qualquer outra coisa. Inventem uma coisa para criticar o Chávez. Agora, por falta de democracia na Venezuela não é. O que eu sei é que a Venezuela já teve três referendos, já teve três eleições, não sei para onde, já teve quatro plebiscitos?, afirmou o nosso presidente. Claramente disse que apóia o ingresso da Venezuela no Mercosul e atribuiu o episódio Espanha versus Venezuela à presença de um rei, Juan Carlos, na reunião de Santiago, pois nos encontros de chefes de Estado e chanceleres não coroados há discussões abertas e francas. Não disse, mas ao que parece nem sempre bem educadas, pois o que se viu em Santiago foi um espetáculo grosseiro. Chávez chamou o ex-primeiro-ministro espanhol José María Aznar de fascista. O atual chefe de governo espanhol, embora adversário político de Aznar, pediu um comportamento mais civilizado e ético ao venezuelano, que buscava interrompê-lo, continuando a falar. Foi aí que o rei Juan Carlos adiantou-se na cadeira e fulminou: ?Por que não te calas??.
Que há uma ditadura em construção na Venezuela todo mundo está vendo. O povo está nas ruas protestando. Chávez quer uma reforma constitucional que lhe dá plenos poderes e possibilidades de eleições sucessivas. Manietou a imprensa, a Justiça e o parlamento. Não há como chamá-lo de democrata e seu governo de democracia. E muito menos comparar sua ditadura ?presidencialista? com governos parlamentaristas existentes no mundo, como fez Lula. Nos sistemas parlamentaristas, a característica básica não é a eternização do governante no poder e, sim, a possibilidade de ele ser alijado a qualquer tempo, sempre que perde o apoio parlamentar que, no sistema, tem efetivo significado de apoio da nação.