Crimes pela internet

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado votará hoje, se houver quorum, o que não é comum no parlamento brasileiro, um projeto de lei que obriga os usuários da internet a se identificarem. Isso deverá ser feito antes de iniciada qualquer operação que envolva interatividade. Exemplos são o envio de e-mails, conversas em salas de bate-papo, criação de blogs, captura de dados, etc. Quem acessar tais serviços sem identificação prévia será punido com reclusão de dois a quatro anos. A responsabilidade pela veracidade dos dados de identificação seria dos provedores, que teriam de manter um cadastro dos usuários. Os provedores serão também punidos se admitirem que pessoas não cadastradas acessem os serviços. Esta seria a primeira tentativa de, finalmente, tratar de crimes via internet.

O surgimento da gigantesca rede mundial de comunicações e serviços, um avanço fantástico no relacionamento entre pessoas físicas e jurídicas, gerou e continua gerando progresso em todos os países, notadamente os que melhor desenvolveram o sistema. E o Brasil está entre eles. Mas, como sempre, o mau uso de instrumentos que são criados para o bem não escapa à fértil imaginação dos malfeitores. A mesma internet que dissemina conhecimentos e possibilita comunicações úteis entre pessoas, sem que as distâncias sejam impedimento, tem sido utilizada para a exploração da pedofilia, do tráfico de pessoas e de entorpecentes e para o desvio de recursos de contas bancárias para as de ladrões ou mesmo organizações do crime organizado.

Quem usa a internet, recebe e-mails falsos identificados como sendo da Receita Federal, da Justiça Eleitoral ou de outros organismos públicos, dando conta de que graves irregularidades foram descobertas a respeito do usuário. E ele é levado a, inadvertidamente, fornecer dados seus que permitem o acesso às suas contas bancárias, que logo são copiados pelos malfeitores. O dinheiro some das mesmas, de uma hora para outra.

Os instrumentos disponíveis para a descoberta desses bandidos da internet existem, mas são de difícil utilização. E inexistem leis que definam os crimes e cominem penas para o mau uso dos modernos meios de informática colocados à disposição dos cidadãos e empresas. Evidentemente que esta lei deve merecer acurados estudos, uma vez que é preciso, em primeiro lugar, preservar a privacidade dos usuários. Mas, em nossa cultura, a privacidade não tem o mesmo significado e amplitude que se verifica em outras culturas que por aqui tem gente procurando macaquear. Nos Estados Unidos, por exemplo, a cultura anglo-saxônica sempre desenvolveu um apreço pela privacidade, que é muito maior que entre os latinos. E, mesmo assim, depois do atentado de 11 de setembro as autoridades daquele país invadiram e invadem a privacidade das pessoas até abusivamente, em nome do que consideram um bem maior: a segurança.

Assim, que se preserve a privacidade o quanto possível, ou melhor, o quanto necessário, mas que não seja este o impedimento para que tenhamos uma legislação que facilite a descoberta dos marginais que utilizam a internet até para praticar crimes hediondos, como a pedofilia. A lei exige apenas um cadastro e limita o acesso a certos serviços interativos somente aos cadastrados, aos identificáveis. Entre os críticos, há diversas organizações não governamentais que parecem estar vendo chifres em cabeça de cavalo. O texto da nova lei em votação, embora mereça estudos para aperfeiçoamento, não contém nada que signifique uma agressão aos direitos civis ou políticos dos cidadãos e pessoas jurídicas.

Se o Congresso, depois do longo recesso do período eleitoral, apreciar e aprovar esta lei e, se possível, também a das microempresas, que está em pauta, o ano legislativo estará ganho.

Voltar ao topo