A ética e a corrupção

Atualmente temos motivos relevantes para nos preocuparmos com a falta de ética e honestidade no Brasil, uma vez que presenciamos em nosso país uma degradação moral acelerada nas relações políticas, jurídicas, comerciais, sociais, familiares etc. No entanto, quando isso ocorre no âmbito dos três poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário), gerando a corrupção, a reprovação é maior, pois o agir eticamente e com honestidade é de suma importância para o exercício da função pública, esta compreendida não somente em relação aos servidores públicos, mas também aos agentes políticos (senadores, deputados, vereadores, membros do Judiciário e do Ministério Público). Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu como um dos princípios da Administração Pública o da ?moralidade?. A Lei n.º 9.784/99, por sua vez, consagrou o princípio da moralidade administrativa, preconizando que ela significa ?atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé? (art. 2.º, º único, IV).

Infelizmente, a desonestidade e a falta de ética é um problema endêmico na cultura atual. Por isso, é importante a reflexão sobre tais virtudes, a fim ser combatida a imoralidade e a desonestidade em todas as relações humanas e a corrupção em todos os poderes da República.

Vivemos em mundo dinâmico, proporcionado pelas descobertas científicas e inovações tecnológicas, principalmente após a II Guerra Mundial, as quais pretendem, em tese, garantir mais satisfação e felicidade ao ser humano. Contudo, a evolução científica e tecnológica não pode resolver o problema ético e moral, pois esse não é o seu objetivo.

A crise de honestidade não é novidade no Brasil. Em 1914 Rui Barbosa já afirmava que: ?De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto? (Senado Federal, RJ. Obras Completas, Rui Barbosa. v. 41, t. 3, 1914, p. 86).

A honestidade deveria fazer parte do caráter de todo indivíduo e de qualquer instituição humana, conforme frisado por Rui Barbosa (Plataforma de 1910, 37): ?O ensino, como a justiça, como a administração, prospera e vive muito mais realmente da verdade e moralidade, com que se pratica, do que das grandes inovações e belas reformas que se lhe consagrem?.

Entretanto, a desonestidade, a imoralidade e a corrupção estão assombrando nosso país, trazendo grandes preocupações e insegurança diante da transparência do projeto de sobrevivência política que se renova a cada mandato e perpetua a cultura do favorecimento e da vantagem, da confraria dos homens notáveis, da corrupção, qual seja, a perpetuação da malandragem.

Essas atitudes nefastas geram a suprema perversão dos valores sociais, econômicos, jurídicos e políticos de uma sociedade, proclamados como legítimos pela sociedade e pelo Estado. Elas são uma forma cruel de abuso do poder, pois o agente público usa o poder que lhe foi conferido para servir a seus próprios interesses ou de outrem, de forma ilegítima e subversiva. Elas formam uma força destruidora da ordem social e dos mais elementares princípios éticos e legais. Além disso, tais atitudes podem tornar-se a ?moral? estabelecida, a ponto de gerar nos cidadãos o conformismo com o mal social e, pior ainda, o espelhamento nesse tipo de conduta. Parafraseando Rui Barbosa, de tanto ver a corrupção, o individuo já não vê sentido em ser honesto.

A história recente de nosso país tem nesse ponto um dos maiores desafios a enfrentar. Os cidadãos, as instituições, as entidades de classe e os poderes responsáveis devem reagir ativamente contra a corrupção, e os responsáveis serem punidos observando os seus direitos constitucionais. Caso contrário, o país avançará rapidamente para a desagregação. Indignar-se, resistir e combater a corrupção é um dos principais desafios éticos dos poderes constituídos e da sociedade.

Na página da Ajufe Associação dos Juízes Federais do Brasil (www.ajufe.org.br – acessado em 27 de junho de 2007) lemos a notícia de que ?Ajufe propõe campanha nacional corrupção?, destinada a sensibilizar a população a respeito do tema, tendo se reunido com parlamentares da Frente de Combate à Corrupção. Por outro lado, no mês de junho de 2007, os jornais estamparam resultado de pesquisa, feita pelo instituto Census, dando conta de que o que mais envergonha o brasileiro hoje é a corrupção (mais de 40%), seguindo-se a violência.

Sem dúvida, é preciso que haja no Brasil uma reação ética dos cidadãos conscientes de sua cidadania; uma reação contra a corrupção, para que seja efetivamente construída uma sociedade livre, justa e solidária, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, conforme prevê o art. 3.º, inc. I, da Constituição Federal.

Vera Lúcia Feil Ponciano é juíza federal em Curitiba/PR.

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