Frágeis

Delegacia da mulher registra menos boletins de ocorrência

Levantamento da Delegacia de Mulher (DM) revela que houve queda na maioria dos índices de violência contra mulheres, em Curitiba, nos primeiros nove meses do ano, na comparação com o mesmo período do ano passado. Os números apontam redução nos casos de violência física e psicológica, entre outros, enquanto que os piores índices se referem a casos de violência patrimonial, com aumento de 62%. Também houve aumento, de 4%, nas ocorrências de violência sexual.

A delegada-titular da DM, Maritza Haisi, lembra que nem todos os casos são registrados. “As mulheres, às vezes, passam a vida inteira sofrendo todo tipo de violência até decidir registrar seu caso”, enfatizou.

Índices

No entanto, é inegável (veja infográfico) que houve uma redução. Agressões físicas como lesão corporal, a violência doméstica e familiar, ou as vias de fato, apresentaram redução de 17% em relação aos mesmos meses do ano passado.

Apesar da queda, os números ainda são assustadores. Foram 1.913 ocorrências registradas contra mulheres. Foram 4.863 registros de ameaça, injúria, calúnia, difamação, perturbação da tranquilidade e casos de sequestro e cárcere privado, mesmo que a estatística aponte redução de 6%.

Já outros tipos de violência, como constrangimento ilegal, desobediência de decisão judicial e perturbação no trabalho e sossego alheio, obtiveram o melhor resultado, com queda de 44%.

Especialistas

Segundo a mestre em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (USP), Clair Castilhos Coelho, e integrante da Rede Feminista de Saúde (entidade com representação em 15 estados), a violência está enraizada na sociedade. “Quando pega o lado mais frágil, essa violência extrapola. Por isso temos esses números”, aponta Clair. “Faltam um conjunto de equipamentos para essa parcela da população, e vontade política para isso”.

Heliana Hemetério, integrante da Rede de Mulheres Negras (RMN) do Paraná,

acredita que a violência é a resposta do machismo, sexismo e racismo. Para ela, é preciso conscientizar essa parcela da população sobre sua cidadania. Ela fala que há mais violência quando se acumulam estereótipos como o da sexualidade das mulheres negras. “Nos meios de comunicação, são apresentadas como símbolo sexual”.

De herói a carrasco

Um caso de violência familiar explícita ocorreu com Rosa (nome fictício), 33. Mãe de três filhas, a maior com 17 anos, ela deixou o marido Marcelo há cerca de dois meses e meio. A história entre o casal começou quando ela ainda tinha 13 anos. Marcelo foi o primeiro e o único homem da vida dela por 20 anos.

Ainda durante a primeira gravidez, Rosa sofreu com ameaças veladas, agressões verbais e, esporadicamente, era espancada pelo companheiro. “No começo, eu idolatrava meu marido. Não sei se por ele ter sido o primeiro homem da minha vida, mas eu o amava muito”, declara.

Decisão

Há cerca de cinco anos, quando a filha mais nova ainda tinha 8 anos, ela começou a pensar em se separar. Mas, pelas filhas e para manter a família unida, Rosa permaneceu junto com ele. “Sempre escondi da família as agressões”, revela. Mas, à medida que o tempo foi passando, Rosângela foi tomando consciência de sua condição.

Foi somente em julho que ela comunicou às meninas sua decisão de separar-se de Marcelo. Quem ajudou foi a filha mais velha, que soltou a frase que faltava: “demorou, né mãe?”. Hoje o que mais lhe faz falta é não poder ver as filhas diariamente. “Isso me faz chorar às vezes”.

O estopim para a separação foi ele, apesar dos insistentes pedidos de separação amigável, ter adquirido uma arma. Rosa foi entrevistada quando decidiu formalizar a denúncia na Delegacia da Mulher, no fim de setembro.