Coronel quer “anistia branca”

O advogado do tenente coronel Valdir Coppeti Neves, Cláudio Dalledone Júnior, apresentou ontem à Polícia Federal um documento no qual entrega todas as armas encontradas na casa do oficial à polícia. Com isso, Dalledone pretende "invocar a anistia branca" e dar o primeiro passo para pedir o relaxamento da prisão em flagrante de Neves, capturado na terça-feira por porte ilegal de armas e acusado de chefiar milícias armadas que recebiam dinheiro de fazendeiros para patrulhar fazendas e impedir invasões de sem terras.

De acordo com Dalledone, a prisão em flagrante de Neves é ilegal, uma vez que a Medida Provisória 229 – que trata do Estatuto do Desarmamento – prevê a entrega ou regularização de armas de fogo até 23 de junho deste ano. "Até esta data, nenhum brasileiro pode ser preso por porte ilegal de armas, sejam elas de uso restrito, proibido, obtidas de forma ilícita ou não. A prisão do meu cliente é ilegal", afirma.

Quando a PF chegou na casa de Neves, na terça-feira, tinha um mandado de busca e apreensão e um mandado de prisão preventiva do coronel. No entanto, como foram achadas armas na casa, Neves acabou preso em flagrante. O próximo passo da defesa do oficial será de se inteirar sobre o conteúdo do mandado de prisão preventiva – expedido pela 1.ª Vara Criminal Federal de Ponta Grossa – e tentar derrubá-lo.

Dalledone disse ainda que é normal que Neves tenha em casa muitas armas. "Ele é um policial e a vida toda esteve à frente de grupos para combater o crime organizado. Não seria normal se ele tivesse em casa coleção de bichinho de pelúcia ou perfumes", ironizou.

Calado

Depois de ter sido preso, o coronel Neves se negou a responder qualquer questionamento dos policias federais. Dalledone disse que esta postura será mantida enquanto ele não consiga saber o teor das provas que a PF diz ter contra o coronel. "Eu não aceito a forma de investigação utilizada pela Polícia Federal, não acredito na licitude das provas que eles dizem ter."

Sobre as supostas interceptações telefônicas feitas pela PF durante as investigações, Dalledone disse que vai procurar saber de que maneira as gravações foram obtidas. "Não tenho dúvida nenhuma de que vai aparecer alguma irregularidade, ainda mais vindo de uma investigação chefiada pela polícia secreta da Secretaria Estadual de Segurança Pública e chefiada pelo secretário Delazari." A reportagem da Tribuna procurou o secretário de segurança – Luiz Fernando Delazari – que preferiu não se manifestar sobre o assunto.

Dalledone disse ainda que repele os métodos de interrogação da PF. Ele afirmou que seu cliente é o tempo todo "sugestionado, induzido a respostas e recebe sucessivamente sugestões de delação premiada". A PF, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que não adota nenhum procedimento ilegal nas investigações, e que as afirmações de Dalledone fazem parte da estratégia da defesa.

PF prossegue com os interrogatórios

Quatro das oito pessoas presas durante a operação "Março Branco", da Polícia Federal, foram transferidas para o quartel da Polícia Militar de Curitiba. O tenente coronel da PM, Valdir Coppeti Neves, acusado de chefiar uma milícia armada que atuava contra ocupações de terra no Estado, está desde a noite de terça-feira detido na sede da corporação. Com ele também foram transferidos os militares da reserva Ricardo José Derbes, José Valdomiro Maciel Nereu e Paschoal Moreira. Permanecem na carceragem da Polícia Federal os ex-PMs João Della Torres Neto e Adair João Sbardella, e Silvana Araújo de Almeida e Carlos Ney Ferreira, que se passavam por sem terras.

A Polícia Federal informou, através de sua assessoria de imprensa, que os acusados continuavam sendo ouvidos, e que desses depoimentos poderiam surgir novos fatos sobre o caso. No entanto, a PF não forneceu nenhuma informação obtida durante estes depoimentos. Uma vez finalizado o inquérito pela PF, o caso segue para a Justiça Federal de Ponta Grossa.

O deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR) sugeriu ontem ao relator da CPI da Terra, deputado federal João Alfredo (PT-CE), a convocação do tenente-coronel Neves para prestar depoimento à comissão.

Ministério Público faz esclarecimento

Sobre a matéria "Oficial acusado de torturas", publicada pela Tribuna do Paraná em 6 de abril de 2005, a Promotoria junto à 2.ª Vara do Tribunal do Júri de Curitiba esclarece:

Um inquérito foi instaurado para apurar as torturas que as rés Celina e Beatriz Abagge sustentaram que sofreram quando foram presas sob acusação da morte do garoto Evandro Ramos Caetano, ocorrida em Guaratuba, em 1992. O tenente-coronel Valdir Neves, que chefiava o Grupo Águia quando da prisão dos sete réus, foi ouvido em tal inquérito, que foi arquivado pela Justiça por não ter sido comprovada a suposta tortura.

As rés Celina e Beatriz Abagge foram absolvidas em julgamento ocorrido no Fórum de São José dos Pinhais, em 1998, porque os jurados entenderam que o corpo não seria de Evandro Ramos Caetano. A absolvição não se deu em função da alegação de que teriam sido torturadas para confessar o crime. O Tribunal de Justiça do Paraná anulou o julgamento, considerando que havia prova científica de que o corpo era do garoto e que os jurados não poderiam desconsiderar tal prova. Elas vão a novo julgamento no Tribunal do Júri em Curitiba. Serão também julgados outros dois réus, Airton Bardelli dos Santos e Francisco Sérgio Cristofolini.

O Ministério Público, já quando do júri dos réus Osvaldo Marcineiro, Vicente de Paula Ferreira e Davi dos Santos Soares, que foram condenados, requereu que o tenente-coronel Neves fosse ouvido diante dos jurados, mas ele não pôde comparecer, apresentando atestado médico.

O Ministério Público Estadual não avalia nesta oportunidade os fatos que resultaram na prisão do tenente-coronel Valdir Neves, mesmo porque já estão sob o crivo da Justiça. Manifesta-se exclusivamente em virtude de entrevista concedida pela defesa dos réus do caso Evandro a esse jornal e no único intuito de trazer outros esclarecimentos à população, que ainda julgará quatro acusados pela morte de Evandro Ramos Caetano.

Nota da redação

Em nenhum momento a reportagem publicada pela Tribuna afirma que a absolvição das rés Celina e Beatriz Abagge se deu por causa da confissão feita mediante tortura. Matheus Gabriel Rodrigues de Almeida, advogado do réu Airton Bardelli dos Santos – que será julgado em 16 de junho – disse que antes mesmo de Neves ser preso, já havia a certeza de convocá-lo para depor. "Vamos provar que estas pessoas foram vítimas de tortura e isto está demonstrado nos autos", afirmou o advogado.

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