Bala perdida tira a vida de dona-de-casa em Curitiba

Poderia ter sido a mãe de qualquer pessoa, mas foi a dona-de-casa Natalina dos Santos Lima, 54 anos, cinco filhos, a vítima de uma bala perdida. Enquanto lavava louças, a mulher foi atingida por um tiro na cabeça e morreu junto à pia, às 21h de segunda-feira, na Rua Birigüi, esquina com a Rua Jacir José Ferreira, Vila Nossa Senhora da Luz, na Cidade Industrial.

A rotina era a mesma. Natalina estava na cozinha, o cômodo da frente da casa, enquanto sua filha e seu genro estavam nos fundos. O barulho vindo da rua fez com que ela virasse a cabeça e uma bala acertou-lhe o rosto. O projétil, vindo de cerca de 50 metros, pela Rua Jacir José Ferreira, atravessou o vidro da janela e acertou a mulher. Quatro cartuchos de pistola calibre 380, foram recolhidos no local e entregues ao perito Fontoura, da Polícia Científica.

Motoneta

De acordo com levantamentos dos soldados Lamy e Provenzi, do 13.º Batalhão da Polícia Militar, os autores dos disparos estavam em uma motoneta Biz verde. “Eles teriam atirado contra outras pessoas que estavam na calçada”, relataram o soldado. Porém, um dos filhos da vítima afirmou que só crianças jogavam bola próximo à residência, naquele horário.

Testemunhas disseram ter ouvido vários tiros, um dos quais teria acertado também a parede da casa de Natalina. “Não é a primeira vez que nossa casa é atingida por tiros”, comentou o filho dela. “A gente não tem confusão com eles”, completou.

Suspeitos

Os investigadores Sérgio e Gilmar, da Delegacia de Homicídios, apuraram, junto aos curiosos que cercavam a entrada da casa, a identificação parcial de dois suspeitos. Na noite anterior, policiais militares perseguiram uma motoneta com as mesmas características daquela que estaria carregando os assassinos. Ao perceber a presença da polícia, o veículo fugiu e foi perseguido. Mas os policiais perderam a motoneta de vista, no labirinto de ruas da Vila Nossa Senhora da Luz.

Segundo o delegado da Homicídios, Marco Antônio Góes Alves, responsável pelo caso, a ação não pode ser caracterizada como bala perdida e sim como erro na execução. “Eles tinham a intenção de atirar e matar, apenas erraram o alvo”, explica.

No mesmo dia em que a dona-de-casa foi assassinada, a polícia recebeu uma denúncia anônima de que os autores – um menor e outro maior de idade – estariam escondidos numa casa no mesmo bairro. Assim que os investigadores chegaram no local indicado, encontraram a casa abandonada. “A denúncia procede, pois o menor morava ali, mas infelizmente a dupla conseguiu fugir. Provavelmente os comparsas deles chegaram antes para avisar que a polícia estava a caminho”, contou o delegado. Há indícios de que um dos suspeitos esteja envolvido na morte de um funcionário da Prefeitura, ocorrido na Vila Nossa Senhora da Luz, na semana passada.

O que se via só pela TV vira drama cotidiano

Clewerson Bregenski

Os casos de balas perdidas matando ou ferindo pessoas, são muito mais comuns em Curitiba e Região Metropolitana do que se imagina. A morte da dona-de- casa Natalina dos Santos Lima, ocorrida na noite de segunda-feira, na Vila Nossa Senhora da Luz, mais uma vez traz à tona o problema da insegurança. Nos primeiros nove meses deste ano, duas mulheres e duas crianças morreram e outras quatro pessoas foram feridas por balas disparadas a esmo, conforme apurado junto aos arquivos da Tribuna.

Pelas estatísticas da Delegacia de Homicídios, apenas três casos foram considerados “balas perdidas” em Curitiba, neste ano. As vítimas são: Danielle da Silva Rebello Campos, 4 anos; Vanira Costa, 63, e agora Natalina dos Santos Lima, 54. A quarta morte ocorreu em Colombo, sendo vítima o garoto Luís Carlos dos Santos, 12 anos.

Atentados

Em janeiro de 2003 aconteceu o primeiro caso. Na tarde do dia 8, um jovem de 18 anos foi baleado quando passeava pela Rua Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Capão Raso, ao lado do terminal do Pinheirinho. O disparo acidental, que feriu a vítima no peito, foi conseqüência de um assalto que estava ocorrendo em uma lanchonete situada nas proximidades. Dois marginais realizaram o roubo e, durante a fuga, efetuaram um tiro. O jovem foi encaminhado ao Hospital do Trabalhador.

No início da noite do dia 16 de janeiro, uma bala perdida atingiu o pescoço da agente comunitária Márcia Portela de Oliveira, 23, que estava no portão de sua casa, na Rua Estevão Ribeiro de Souza Neto, Cajuru. Os tiros foram disparados por dois indivíduos que duelaram em frente onde ela estava. Márcia foi conduzida ao Hospital Cajuru pelo marido, o garçom Valdecir Wilson de Almeida Carneiro, 29 anos. Na ocasião, ele acabou preso e encaminhado ao 6.º Distrito (Cajuru). Na residência dele foram encontrados dois quilos de crack. A agente comunitária morreu no início de março, no mesmo hospital onde estava internada.

Em 16 de fevereiro, uma troca de tiros entre policiais militares do 13.º Batalhão da PM e dois assaltantes resultou em ferimentos em um jovem de 20 anos, identificado no local apenas por Sidnei. O confronto aconteceu na esquina da Rua Eduardo Sprada com Avenida Juscelino Kubitschek, Cidade Industrial de Curitiba. Dois marginais, após praticarem assaltos relâmpagos no centro, tomaram de assalto um Golf branco. Aconteceu uma perseguição policial e os bandidos bateram o Golf em um Santana. Tentaram fugir a pé, mas houve troca de tiros. Os marginais morreram e um PM ficou gravemente ferido. Sidnei que passava pelo local, de motocicleta, foi atingido no ombro por uma bala perdida.

Mais tiros

Outro caso foi registrado em 6 de março: tiroteio envolvendo traficantes na Vila das Torres resultou em ferimento em Alessandra dos Santos, 11 anos. Ela estava em frente da sua residência na Rua Florisval Almir Zagonel, quando foi atingida na barriga e encaminhada ao Hospital Cajuru, por familiares. Seriam quatro os indivíduos que trocaram tiros e tudo leva a crer que estavam disputando algum ponto de venda de drogas.

Mortes

Uma semana depois uma bala perdida vitimou outra criança. Luís Carlos dos Santos, 12 anos, morreu às 19h40 quando saiu de casa para fazer compras para a família em um supermercado. Quando estava andando pela Rua Rio Negro, Jardim Osasco, em Colombo, foi atingido nas costas. Conseguiu andar por mais alguns metros e caiu morto. O tiro foi disparado por um dos freqüentadores de um bar que fica no final daquela rua.

Na Rua Catulo da Paixão Cearense, Cajuru, por volta das 16h30 do dia 27 de julho, Danielle da Silva Rebelo Campos, de apenas 4 anos, foi atingida por uma bala perdida na cabeça, quando estava dentro da casa de uma tia. Naquele horário quatro rapazes que estavam em um Chevette cruzaram com David de Oliveira Pompeu, 22 anos, o “Farol”, que andava pela rua. “Farol” se escondeu em um terreno baldio e efetuou vários disparos contra os ocupantes do veículo. Um dos tiros acabou por acertar a menina. Ela morreu dias depois, no Hospital Cajuru. “Farol” foi preso posteriormente. Era fugitivo do 11.º Distrito Policial (Cidade Industrial).

Costureira

Em 2 de agosto, durante a madrugada, mais uma morte. A costureira Vanira Costa, 63 anos, conhecida por “Dona Nena”, foi atingida por um tiro na cabeça, dentro de casa – na Rua Visconde de Abaeté, Bairro Alto. Ela estava sentada em frente à máquina de costura, fazendo o vestindo da neta – Gabriela – que estava completando 4 anos. Dois meses depois, a delegacia de Pinhais elucidou o caso prendendo quatro acusados. Segundo a polícia, Juliano Gomes Ribeiro, 18, menor de idade à época do fato, matou Vanira. Ele e os amigos Marvim Cristiano Szpack, 21; Luciano de Lima, 23, e um adolescente de 17, desentenderam-se com um homem ainda não identificado, que era o alvo dos tiros. O desconhecido não se feriu.

Em 18 de agosto, mais uma criança foi ferida por bala perdida. Gabriele dos Santos Belmiro, 4, foi atingida na perna, de raspão, quando passeava com a mãe pela Rua Pedro Andreatta, Vila Sabará, CIC. Ela foi internada no Hospital do Trabalhador e recebeu alta no dia seguinte. O motivo dos disparos seria uma rixa entre duas gangues da Vila Sabará.

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