O apartamento de luxo (um por andar) do Edifício Rio Sena, no Juvevê, onde foi preso o falso médico Jamhar Amine Domit, era muito mais que fachada para atrair mulheres que seriam mantidas como escravas sexuais. Era um verdadeiro circo dos horrores.

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O libanês naturalizado brasileiro, dono de uma pequena fortuna e muitos imóveis, apesar de ter 78 anos, mostrou-se um especialista em crueldade. Cada mulher que aprisionava no imóvel era submetida a humilhações e ameaças, inclusive de morte. Muitas foram agredidas. Outras obrigadas a aberrações sexuais. Há queixas contra ele desde 2000.

No nono andar, o apartamento permanecia trancado por todo o tempo. As vítimas eram atraídas por anúncios em jornal. Quando aprovadas, apresentavam documentos e imediatamente eram impedidas de sair do imóvel.

Só então o patrão, que até então se apresentava como médico e oferecia salário de R$ 1.200,00, mostrava sua verdadeira face. Dizia que elas não poderiam desobedecê-lo, teriam direito a cinco pães por semana e água. O restante da alimentação seria o que sobrasse de prato dele. Muitas vezes os restos eram jogado no chão para que elas se alimentassem como animais.

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Incomunicáveis

Os relatos das vítimas de Domit são de arrepiar. Ele mantinha os telefones em seu escritório, trancado a chave. Também apreendia o celular da vítima, que sequer podia pedir ajuda pelo interfone, já que o aparelho apenas recebia chamadas.

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O idoso ainda assegurava que a síndica e o porteiro eram pagos por ele (o que não é verdade). Desta forma não adiantava pedir socorro, porque eles não ajudariam.

Também o quarto delas não tinha fechadura, o que as obrigava a ficar em permanente vigília, para evitar ataques sexuais. Nas raras vezes em que permitia que atendessem o celular, obrigava-as a dizer que estava tudo bem e o patrão era ótimo. Ainda mantinha um circuito interno de TV, em que exibia filmes pornográficos e as obrigava a vê-los.

Tratamento psiquiátrico pra superar trauma

Mara Cornelsen

Uma massoterapeuta, de 55 anos, moradora em Planalto, no interior do Estado, que permaneceu durante 16 dias presa no apartamento (de 14 a 30 de maio) e que atualmente está em tratamento psiquiátrico pelo trauma sofrido, foi quem deflagrou o processo que culminou na prisão de Domit.

Ela foi obrigada a trabalhar das 7h às 2h todos os dias. Ele ainda exigia serviços sexuais e, nessas ocasiões, ela se trancava num pequeno banheiro até Domit desistir. A mulher tentou fugir de várias formas.

Falou com o porteiro, mas não foi atendida. Jogou bilhetes para a rua e até pediu ajuda a pedreiros de uma obra, que não entenderam nada e passaram a xingá-la sempre que aparecia na janela.

No auge do desespero, a empregada desafiou o patrão, dizendo que caso ele não a soltasse, iria se jogar da janela. No dia seguinte, ele a enxotou do apartamento, ofendendo-a e enfatizando que era muito rico, amigo de juízes, desembargadores e autoridades. E ficou com os documentos dela.

Ajuda

A vítima pediu ajuda ao porteiro, que dizendo que era “comum” aquilo acontecer, chamou a polícia. Ela foi levada a um abrigo para mulheres vítimas de violência, próximo à Rodoferroviária, e depois registrou queixa na Delegacia da Mulher.

Quando conseguiu voltar para sua cidade, procurou o advogado Patrique Mattos Drey, que fez pesquisas minuciosas dos antecedentes de Domit, anexando-os à representação criminal que entregou na Delegacia da Mulher.

Muitas das denúncias apuradas foram feitas no Juizado Especial e estão arquivadas. Não se sabe se o acusado fez acordo com as vítimas ou se elas desistiram das acusações, por medo.

A delegada Sâmia Cristina Coser, que atendeu à denúncia e encaminhou ao Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher um minucioso pedido de prisão temporária, mandad,o de busca e apreensão e recolhimentos do passaporte do acusado, deve pedir agora a prisão preventiva, já que novas vítimas estão aparecendo.

Mais vítimas


Janaina Monteiro

Quatro mulheres entraram em contato com a delegacia e disseram ter sido vítimas de Domit. Segundo a delegada Sâmia Cristina Coser, uma delas é de Guaraqueçaba e relatou que ficou mantida por 30 dias no apartamento do empresário. “Ela comentou que não denunciou na época, porque ficou com medo”, contou a delegada. Outra alegou ter sofrido assédio sexual.

As câmeras de segurança do edifício registraram a entrada de 117 candidatas. Aquelas que não agradavam ao idoso eram dispensadas. Uma das vítimas ficou 16 dias presa no apartamento de Domit, onde a polícia apreendeu 12 carteiras de trabalho, além de objetos eróticos. Outra relatou que foi obrigada a fazer sexo oral no ancião.

Autuações

A delegada contou que o empresário se reservou no direito de ficar calado e não respondeu a nenhuma pergunta feita pela polícia. Ele permanece preso no Centro de Triagem II e responderá pelos crimes de cárcere privado, redução a condição análoga à de escravo e estupro.