Voto-vista do ministro Eros no STF

Comentário de Luiz Edson Fachin,
professor titular de Direito Civil da UFPR

O ministro Eros Grau vem de beneplacitar o que de mais expressivo pode emergir da superação da técnica jurídica formal ao consagrar, com justiça para o caso concreto, o verdadeiro sentido e alcance da hermenêutica jurídica. A hipótese fática tratava de debate sobre decisão que mantém seqüestro de verbas em situação excepcional. Em suma, o plenário do STF negou provimento a recurso de agravo regimental em reclamação (RCL 3034), aforada pelo Estado da Paraíba, preservando decisão do TJ-PB que havia determinado o seqüestro de verbas para quitação de precatório que beneficia pessoa acometida de doença grave e incurável.

A leitura e a análise do voto-vista é relevante para estudantes e estudiosos do Direito, e bem revela a função extraordinária da Corte Suprema em nosso País.

Um dos elementos que avulta no substancioso e lúcido voto do ministro Eros Grau, se vincula, em nosso modo de ver, à incidência completa e material do ?substantive due process?, colhido entre nós pela contribuição crítica da doutrina que não se limita a reproduzir saberes estrangeiros, como se fez com o direito norte-americano, em especial a partir das emendas à Constituição norte-americana, frise-se da 5.ª à 14.ª.

Ademais, está implícito no voto-vista o princípio constitutivo do Estado Democrático de Direito que é o devido processo legal interpretado materialmente (e não apenas formalmente, como técnica abstrata) como postulado fundamental e fonte irradiadora da qual decorre o rol principiológico previsto no texto constitucional. Ao fazê-lo como acolheu a situação fática, o voto-vista abriu portas imprescindíveis para concretização do efetivo respeito prático às garantias fundamentais. É nessa toada que nos ensina José Joaquim Gomes Canotilho:

a garantia dos direitos fundamentais exige, para sua realização, uma participação no procedimento (…). Daí a necessidade de as leis dinamizarem as dimensões participatórias procedimentais a fim de, através de um due process, se garantirem posições jurídicas fundamentais. Para além dos clássicos direitos processuais, a participação procedimental alargou-se aos procedimentos legislativos e administrativos. (1)

Eis aí uma dentre muitas razões que levam a caracterizar o voto-vista como verdadeira lição de justiça, coerente com o que decidiu, e por unanimidade, o plenário do Supremo.

Nota

(1)    CANOTILHO, J.J. G. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1992. p. 592.

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