Uma guerra desnecessária

Especialistas em assuntos estratégicos do Oriente Médio que podem emitir sua opinião com isenção, sem a tutela de Washington, já chegaram a um consenso: os Estados Unidos vão à guerra contra o Iraque de olho nas reservas petrolíferas do país. Por mais que o presidente George W. Bush e seu secretário Collin Powell esgrimam argumentos belicosos para defender a invasão do território iraquiano, sob a alegação de que o ditador Saddam Hussein continua fabricando e estocando armas químicas, biológicas e de destruição em massa para patrocinar atentados terroristas e ameaçar seus vizinhos, a comissão de inspetores da Onu designada para investigar as denúncias ainda não encontrou provas concretas de que isso esteja ocorrendo.

Não há evidências de que o regime iraquiano esteja armado até os dentes, e mais, não há provas suficientes para associar Saddam à rede terrorista Al-Qaeda, responsável pelo atentado contra as torres do World Trade Center.

O caso da Coréia do Norte é exemplar para evidenciar a obsessão paranóica de Bush pelo ataque ao Iraque. O regime coreano admitiu, com todas as letras, que mantêm armas nucleares em seus arsenais e que não se intimidaria com as advertências de Washington. O que fez o presidente dos EUA diante da bravata coreana? Absolutamente nada, embora tivesse à mão todos os instrumentos bélicos necessários para deflagrar uma ação militar, além da justificação moral para uma eventual iniciativa desta natureza.

Bush esqueceu a Coréia e centrou sua atenção no Iraque.

Os governos da França e da Alemanha mostraram autonomia suficiente para rejeitar a argumentação e as pressões da Casa Branca. O premier britânico Tony Blair – que se revelou um títere de Bush – ainda nesta semana tentou persuadir o presidente francês Jacques Chirac a aderir à operação militar. Chirac respondeu com um argumento impecável: vamos deixar os inspetores da Onu decidir; se não encontrarem as armas, não há necessidade de guerra, há outras soluções menos amargas.

Infelizmente, Paris e Berlim estão cada vez mais sitiadas, na Europa, na reação à beligerância de Washington. Vários outros países renderam-se à prepotência arrogante de tio Sam – e é com pesar que vemos nesta lista ignominiosa de apoio à guerra os governos da Itália, da Espanha e de Portugal.

Não estamos aqui defendendo Saddam, longe disso. Psicopata como todo ditador sanguinário, ele deixou o país em petição de miséria nestes mais de 20 anos de poder absoluto. Depois de duas guerras – a primeira contra o Irã e a segunda na invasão do Kwait – e da imposição de um regime sanguinolento que não admite opositores, Saddam impôs sofrimentos atrozes ao povo de seu país.

Por causa do boicote imposto pela ONU, a renda per capita caiu de U$ 3 mil, no final dos anos 80, para pouco mais de U$ 200; os indicadores de desenvolvimento humano colocam o país na rabeira do ranking da Onu; não há liberdade de imprensa nem de movimento. O próprio Estado, seria melhor dizer que os sequazes de Saddam, patrocina seqüestros à luz do dia. As ameaças a adversários políticos se estendem à família, aos amigos e até aos vizinhos.

Numa palavra: instalou-se lá um estado policial no pior estilo stalinista, que destroçou as relações de cidadania.

É preciso lembrar, porém, que Saddam foi apoiado, armado e patrocinado pela Casa Branca em sua guerra contra o emergente regime xiita iraniano, em 1980. Lembrança essa que traz à tona a atitude farisaica dos EUA, de mudar sua política externa ao sabor de suas conveniências.

Diante da omissão e da indiferença de muitos, é preciso que os mais conscientes se mobilizem contra a guerra do senhor Bush, uma guerrinha quase particular, com um toque freudiano, mas que acarretará graves consequências para todos nós. Por isso o PPS paranaense vai promover, no dia 14 de fevereiro, a partir das 10h, um ato público pela paz e contra a guerra. A mobilização na Boca Maldita, centro de Curitiba, terá a participação de várias entidades, partidos e lideranças que comungam com nosso repúdio à beligerância de Bush.

Em sua genial História da II Guerra Mundial, Winston Churchill conclui o relato com uma definição singela, até prosaica, do confronto que matou cerca de 50 milhões de seres humanos: “Uma guerra desnecessária”. Esta mesma definição podemos adotá-la desde já para a guerra do Iraque.

Rubens Bueno é presidente regional do PPS paranaense.

Voltar ao topo