Apesar do bom relacionamento que o movimento tem com o governo estadual, as ocupações de fazendas no Paraná não estão descartadas. O aviso é do coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST no Paraná, José Damasceno. Ele fala apoiado pelo bispo auxiliar de Curitiba e vice-presidente da Comissão Pastoral da Terra, dom Ladislau Biernaski, para quem o governo prometeu a reforma agrária e criou tanta esperança no povo brasileiro, “mas já se passou um ano e meio e está muito devagar”. Antes que os agricultores percam a paciência, é preciso que a sociedade se organize e exija a reforma.

O aviso e a advertência são desnecessários. Em todo o País, os sem-terra (ou aqueles que usam a bandeira do movimento) estão “pressionando” o governo como nunca. E o fazem pela via da invasão, dando forma e cor ao “abril vermelho” anunciado pelo líder do MST, João Pedro Stédile, que impunemente prometeu “infernizar” todo o Brasil. Além das invasões “pacíficas”, há destruição do patrimônio alheio e obstrução de importantes rodovias, com evidentes prejuízos para toda a sociedade. Além de tudo, a ação do MST agrava a “anemia econômica” do País, adverte o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Não só de reforma agrária já vive o movimento. As invasões servem também para exigir, entre outras coisas, que vão da cesta básica à liberação de mais recursos para custeio, a libertação de “presos políticos”, que em outras circunstâncias poderiam ser confundidos com arruaceiros ou simples ladrões. O discurso da reforma agrária, contra o qual ninguém se levanta por uma questão de bom senso, foi transformado assim – eis o perigo maior – num abracadabra para todo tipo de violência e saque que sacode o campo de norte a sul.

O governo, como observam os fazendeiros invadidos e os telespectadores estarrecidos, está de braços cruzados. Quer no encaminhamento da reforma agrária, quer na manutenção da ordem, tem-se a sensação de que perdeu completamente o controle. E a vontade de governar. Assim como ocorre no Rio de Janeiro, onde já há quem cogite a construção de muros, cercas ou grades para separar uma sociedade cujas diferentes castas sociais entram em guerra declarada. Pior: ao repassar verbas para entidades que vivem à sombra da grife MST, o governo subsidia diretamente as invasões, como observa com muita propriedade um ministro do Supremo Tribunal Federal que desabafa atrás do biombo do anonimato. Se a gasolina do ônibus que invade é paga pelo poder público, nem há mais que se falar da ofensa direta ao Estado de Direito liderada exatamente por quem deveria estar preocupado em manter a ordem em obediência à Constituição.

Existem no Paraná, segundo dados do próprio MST, entre 12 e 15 mil famílias lutando por terra. No Brasil inteiro, seriam 200 mil famílias acampadas, totalizando mais de um milhão de pessoas – “a maior mobilização ao mesmo tempo da história”, na concepção de Roberto Baggio, outro líder dos sem-terra em nosso Estado. O muro sugerido (e prontamente rechaçado pela infeliz lembrança que ele desperta) já está na cabeça de muitos. Ou na cinta em forma de arma de fogo, ou de outras estratégias de legítima defesa do patrimônio, como já dissemos alhures. Cresce no meio rural emparedado o conceito segundo o qual invasores são como ladrões, e como ladrões devem ser tratados.

Nesse clima, o apregoado bom relacionamento existente entre o governo do Paraná (assim como o federal, que libera recursos à mancheia) com os sem-terra não é suficiente para retirar de cena essa ameaça palpável de nova onda de violência, que pode se agravar com a ameaça de resistência dos que se sentem legitimamente motivados a se defender e a defender o que é seu. O governo não existe para ser “bonzinho” ou condescendente com ninguém, mas para ser justo e cumprir suas funções constitucionais. Se assim não fizer, será sempre ele o principal construtor de muros. Imaginários ou de verdade.

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