Tribunal de Contas

A idéia da criação de um Tribunal de Contas surgiu no Império, sendo, porém, apenas concretizada na República, graças à iniciativa de Rui Barbosa, com a finalidade de fiscalizar as contas públicas da União.

O Tribunal de Contas é um tribunal administrativo, dotado de ampla independência e autonomia, mas que não integra o Poder Judiciário, sendo órgão auxiliar do Legislativo, exercendo, portanto, uma jurisdição administrativa. As atribuições do Tribunal de Contas estão enumeradas no art. 71 da Constituição Federal, merecendo especial destaque aquela prevista no inciso I do aludido dispositivo constitucional, ou seja, a apreciação das contas do presidente da República.

No exercício dessa competência atribuída ao Tribunal de Contas da União, onde é examinado se na execução do orçamento o Executivo agiu de acordo com as autorizações legislativas e as regras de contabilidade pública, funcionando como controlador da legalidade de tais atos, sem emitir juízo político das despesas e receitas públicas, que incumbe exclusivamente ao Congresso Nacional, reside, talvez, a mais delicada e importante das atribuições conferidas pela Constituição àquele Tribunal.

Ficou célebre no Brasil, como escreveu Aliomar Baleeiro, em trabalho publicado na Revista de Direito Público, n.º 11, a decisão proferida pelo ministro Francisco Thompson Flores, na qualidade de relator das contas do presidente Getúlio Vargas, pouco antes do advento do Estado Novo, oportunidade em que o Tribunal de Contas da União rejeitou as contas do então presidente da República, em decisão até hoje sem precedentes na história da Corte de Contas.

Tão importante foi esse julgamento, até pelo seu caráter inédito, criando um embaraçoso tormento ao presidente Vargas, a ponto de expô-lo a um processo de impeachment, que Baleeiro o considera como uma das causas do golpe de novembro de 1937.

Realmente, basta referir que o ministro Francisco Thompson Flores, logo após a implantação do Estado Novo, em represália à decisão tomada pelo Tribunal de Contas, da qual foi relator, foi aposentado compulsoriamente pelo ditador, que se valeu dos poderes excepcionais que lhe conferia a Carta de 1937.

A jurisprudência do STF, reafirmada recentemente pelo TRF da 4.ª Região, em acórdão de que fui relator, orienta-se no sentido de que o julgamento proferido pelos Tribunais de Contas, ao apreciar as contas do chefe do Poder Executivo, configura tal competência uma jurisdição especial, na expressão do saudoso jurista Ruy Cirne Lima, insuscetível de revisão pelo Poder Judiciário, no que diz com o seu merecimento, o que revela a importância que a Constituição conferiu às Cortes de Contas, cuja conseqüência imediata é afastar da vida pública aquelas autoridades que não observaram, no desempenho de suas atribuições, as regras do direito administrativo e de contabilidade pública.

Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

é desembargador federal do TRF da 4.ª Região.

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