Tabelamento de preços

O governo pode tabelar o preço do gás de cozinha. Foi como foi interpretada a exigência do presidente Fernando Henrique Cardoso de que a ANP (Agência Nacional do Petróleo), tenha um papel mais ativo no controle dos preços dos combustíveis e do gás de cozinha. Ele defendeu, em casos extremos, até uma intervenção. Muitos deram ao episódio uma leitura político-eleitoral. Verificou-se que o aumento das taxas de inflação, superando metas antes previstas, está se dando principalmente por causa dos preços públicos e administrados. Os preços entregues à competição do mercado, sujeitos à lei da oferta e da procura e formados no âmbito das negociações privadas, têm se comportado melhor que os preços públicos ou sob influência do poder público. Caso dos derivados do petróleo, inclusive a gasolina e o gás de cozinha. Fácil dizer, pois, que é culpa do governo. E concluir que o candidato situacionista a presidente da República, José Serra, por isto deve pagar, caindo nas pesquisas de intenções de voto.

Pode até ser que a interferência de FHC tenha sido impulsionada pelos últimos e maus resultados das pesquisas para o seu candidato. Mas, a bem da verdade, José Serra já era a favor do controle de preços dos derivados do petróleo, mesmo quando parecia ocupar com folga o segundo lugar nas pesquisas. Argumentava que, mesmo quebrado o monopólio da Petrobras, a empresa estatal tinha 80% da produção do petróleo que consumimos, que é nacional. E, por isto, não deve sofrer tanta influência dos aumentos do dólar ou mesmo do óleo no mercado internacional. Raciocínio de um economista social-democrata, contrário à liberdade absoluta de preços. Nisto, contraria a equipe econômica do governo. Daí, e por algo mais, suas divergências com o ministro Pedro Malan.

É de se temer que a grita do presidente não resulte em nada efetivo. Primeiro, porque seria um retrocesso voltar a preços controlados e até tabelados, como se anuncia. Isto é de se esperar do novo governo, seja ele de Lula, Ciro, Serra e até de Garotinho. Todos eles são, uns mais e outros menos, favoráveis à intervenção estatal na formação de preços e na produção. Contrário, só o governo FHC e ainda por forte influência do PFL, que hoje está (mais ou menos) na oposição. Seria um retrocesso, entretanto, se olharmos para onde caminha o mundo, abraçando até nos antigos países socialistas a economia de mercado.

Valem as boas intenções, mesmo que tenhamos de esquecer possíveis objetivos eleitoreiros. Acontece que a Agência Nacional do Petróleo, que o presidente quer que defina os preços, intervenha ou até tabele, segundo especialistas não tem tais atribuições. Suas atribuições são fixadas por lei. Segundo seu ex-diretor, David Zylbersztajn, “a ANP não tem competência legal para definir preços de combustíveis”. Pode interferir quando, através de denúncias de organismos de defesa dos consumidores, estiverem sendo praticados abusos de ordem econômica. Assim sendo, para que a bronca de FHC dê resultados, é preciso mudar a legislação, o que demanda uma mensagem ao Congresso, com tramitação na Câmara e no Senado e posterior sanção.

Isso exige estudos, negociações, tempo e, até lá, outro será o governo. Aí sim, com embasamento ideológico, a política de formação de preços de combustíveis poderá ser modificada, dispensados os discursos e indispensável nova legislação.

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