SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA – Confissão espontânea (II)

Observe-se que em nenhuma das leis que tratam da confissão, a reparação do dano é primordial, tanto que as Leis 8.137/90 e 9.034/95 sequer fazem referência à reparação do dano, bastando para elas que os co-autores ou partícipes sejam identificados para que a confissão mereça a aplicação de diminuição da pena.

Para a Lei 9.613/98, basta para a aplicação da diminuição da pena tão-somente a confissão quando levar à descoberta da autoria da infração, ou, à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime. E mais: nesta hipótese o julgador foi mais benevolente, porquanto, determinou que, no caso de fixação de pena, seja ela cumprida em regime aberto, independentemente do quantum atribuído. Diz-se, no caso de fixação da pena, por que esta norma vai, além da atenuação da pena e do respectivo regime de cumprimento, permitindo ainda que o juiz deixe de aplicar sanção, ou substitua esta por restritiva de direito.

Temos também a Lei 9.807/99, que, numa primeira hipótese, autoriza o juiz a conceder perdão judicial a acusado primário que confessar voluntariamente todas as circunstâncias do crime, de forma a resultar na identificação dos demais co-autores ou partícipes, localização da vítima com sua integridade física preservada, ou a recuperação total ou parcial do produto do crime. O juiz, para conferir este benefício, deverá levar “em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso”. Nota-se que esta hipótese, a princípio, é uma faculdade do juiz, se considerarmos o sentido ao verbo aplicado (poderá), quando preenchidos os requisitos atrás relacionados.

A segunda hipótese ocorre quando o acusado, condenado nas circunstâncias anteriores, por não preencher os requisitos atrás indicados à concessão do perdão judicial, terá a pena reduzida de um a dois terços. Esta diminuição da pena já não pode mais ser considerada faculdade do juiz, pelo sentido do verbo utilizado pelo legislador.

Feitas estas observações, constata-se a importância que efetivamente tem a confissão do acusado para descoberta da verdade sobre os fatos criminosos e suas conseqüências, a qual, inegavelmente, vem sendo admitida pelo legislador pátrio em delitos que entende graves, como causa de diminuição de pena, perdão judicial, e até como fator a ensejar a extinção da punibilidade.

Dentro desta conjuntura, por diversos aspectos legais, entendemos que as disposições das leis atrás discutidas aplicam-se a todos os delitos, estejam eles previstos no Código Penal ou em outras legislações, bastando para isso que preencham os requisitos ditados por estas normas. Portanto, quando a confissão gerar os efeitos previstos nestas normas, o juiz aplicá-las-á, preferindo primeiro as causas de extinção de punibilidade ou perdão judicial, e como última possibilidade, diminuição de pena, e, somente quando elas não estiverem presentes, aplicará a confissão como mitigação da pena na modalidade de circunstância atenuante.

Para aqueles submissos ao princípio da especialidade das leis, para os quais cada lei representa, v.g., os gomos de uma laranja, onde o sumo de um não se comunica com o outro, no caso ora em discussão relativamente a estas leis “especiais”, não lhes será possível negar a aplicação da Lei 9.807/99, de 13/7/1999, a todos delitos previstos no Código Penal ou legislação esparsa, em vista de que esta lei apenas cuida da questão processual relativa à proteção das pessoas cujos depoimentos facilitam a descoberta da verdade, e, de conseqüência, a realização da justiça, sem fazer qualquer restrição quanto à aplicação a este ou àquele delito, nem mesmo aos crimes hediondos.

Constata-se, assim, que a confissão do acusado como circunstância atenuante de pena sofreu recentemente inúmeras alterações pelas disposições destas leis, que, em algumas vezes, conferiram tratamento até mesmo de perdão judicial ou extinção de punibilidade, e em outras, de diminuição de pena. Somente quando os fatos concretos não se enquadrarem nas hipóteses previstas nesta lei é que deverá o juiz aplicar a confissão como causa atenuante da pena prevista na Parte Geral do Código Penal.

Algumas outras considerações devem ser feitas em relação à confissão do acusado.

Existem entendimentos no sentido de que a confissão policial por si só não tem o efeito de configurar a confissão espontânea, principalmente quando a acusado é preso em flagrante, o que retiraria a espontaneidade da admissão da prática do crime. Para outros, a retratação da confissão realizada na fase policial quando o réu for interrogado em juízo, ensejaria a inaplicabilidade de qualquer benefício ao agente relacionado com a confissão, porque o objetivo da atenuante é a colaboração para a solução da prova para o processo criminal, que restaria prejudicada com a retratação. Ainda temos, dentre outros, aqueles que não aceitam a aplicação de benefício quando o acusado nega na fase policial e confessa em juízo o cometimento de delitos.

A questão da voluntariedade também é objeto de exigência para alguns, havendo também quem diga ser importante apenas o motivo da confissão. Há também aqueles que não aceitam a cindibilidade da confissão, exigindo que seja total.

Cremos que para restar configurada a hipótese, basta que a confissão do acusado tenha utilidade para o processo, ainda que seja posteriormente retratada, e o crime seja de autoria conhecida.

Ao nosso ver, a confissão do acusado deve ser valorada quanto a sua efetiva utilidade para o processo na descoberta da verdade dos fatos, pois é o que interessa para os fins da aplicação da justiça na medida exata, sem mais nem menos. Portanto, quanto mais o acusado colaborar para a descoberta da verdade, mais deverá ser valorada; quanto menos, menor deverá ser a mensuração, independentemente da confissão ser ou não voluntária.

A possibilidade de cindibilidade da confissão é matéria expressamente prevista no Código de Processo Penal, o qual autoriza a divisão e a retratação do acusado, não prevendo qualquer ônus ao réu.

Portanto, no momento de o juiz valorar a confissão do acusado, deve, se for necessário, cindi-la, aplicando a maior ou menor mitigação da pena à conduta infracional do réu, quanto mais ou menos tiver a confissão do acusado servido para convencer o julgador, seja extraído este convencimento da fase policial ou judicial. Isto é, a mitigação será atribuída quanto mais ou menos tiver servido a confissão do acusado à possibilitar ao juiz chegar à verdade dos fatos relacionados com o crime.

Jorge Vicente Silva

é pós-graduado em Pedagogia a nível superior e Especialista em Direito Processual Penal pela PUCPR, autor de diversos livros publicados pela Editora Juruá, dentre eles, Tóxicos, análise da nova lei, estando no prelo, SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA, com lançamento em 10/10. E-mail: jorgevicentesilva@hotmail.com. Site: jorgevicentesilva.com.br

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