Se melhorar, estraga

Pesquisa divulgada há alguns dias pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) informou que o número de homicídios no Rio de Janeiro pode aumentar em 66% se, nos próximos quatro anos, as condições socioeconômicas e os investimentos em segurança pública permaneçam como estão. Em São Paulo, o aumento seria de 26%. Resumindo: quanto pior a distribuição da renda, maior a criminalidade.

É uma conclusão simples, mas que parece não chegar às mentes de quem comanda o país. É só olhar para detalhes simples, que todos nós passamos: será que algum governante já andou de ônibus em Curitiba (ou em qualquer cidade)? Será que já se apertou nos ?articulados?, correndo risco de ficar sem bolsa, carteira, relógio ou telefone celular? Eles andam no centro da cidade, onde a vigilância nunca está onde deve?

Claro que não. E também não dirigem tendo que olhar para os lados quando parados no sinal, preocupados com avanços de ladrões. Um caso prático: uma jornalista saía do prédio da PUC, no Prado Velho, em um dia de verão. Janela aberta, ela estava parada no sinal quando alguém (ela não conseguiu sequer ver direito) passa pelo carro e arranca, isso mesmo, arranca, os óculos do rosto dela.

E isso aconteceu em Curitiba, há dois anos. Em comparação com as duas maiores metrópoles do país, somos pequenos, provincianos e ?felizes?, já que a violência ainda não tomou conta das instituições, o que acontece no Rio e no Espírito Santo, por exemplo. Nesses estados você sequer tem a quem recorrer, porque a estrutura social é totalmente viciada.

Muitos diriam que o problema, no final das contas, é psicológico, a mente do criminoso é assim, Freud explica e etc, etc, etc. Mas não é isso, e quem vive nas grandes cidades sabe. Muitos roubam para comer, para sustentar um bando de filhos, para arrumar o dinheiro da bebida e (o que é pior) para conseguir comprar drogas. São forçados pelas circunstâncias, são frutos de uma sociedade malformada desde o descobrimento.

E o mais incrível, que não é necessário nem tanto investimento para recuperar parte do problema. Segundo o Ipea, se houver um aumento de 10% na verba de segurança pública, o acréscimo de 4% na renda per capita e a diminuição de 2% na concentração de renda, haveria uma redução de 76% nos assassinatos. Isso mesmo: uma mudança drástica no assustador panorama da violência no país.

Custa pouco, portanto. Afinal, o bolo é grande o suficiente para ser distribuído. E são as classes dominantes que podem ajudar. O presidente Lula deixou isso bem claro, ao discursar para metade do PIB nacional, um prato de comida na mesa dos brasileiros é muito mais barato que um prato de comida em uma cadeia. Mas cabe ao governo abrir caminhos para que a sociedade possa agir.

Mas porque isso não acontece? No futebol, há uma teoria: se o treinador não escala os jogadores em suas posições, ele na verdade tem medo que o time melhore. Quem sabe não seja esse o problema do Brasil. Para muitos, se melhorar, estraga.

 Cristian Toledo 

(esportes1@parana-online.com.br) é repórter de Esportes em O Estado

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