Reuniões sem decisões

Quando candidato e com o objetivo de desacreditar seu concorrente Lula, o senador José Serra disse, por mais de uma vez, que para presidir o Brasil era preciso saber decidir e fazê-lo, sem muitas consultas, assembléias, comissões e reuniões. O ditado é que quem quer fazer, faz; quem não quer, faz uma reunião. No caso de Lula e seu governo, é evidente que o objetivo de tantas e tão numerosas comissões, repetidas consultas a especialistas, políticos e segmentos organizados da sociedade, para que se moldem propostas, não significa que o presidente nada quer fazer. Nem que não está disposto a assumir responsabilidades. Diríamos que se trata de uma filosofia de governo, inspirada nos hábitos petistas e de outros partidos de esquerda, de procurar consenso ou maioria para poder impor as soluções aos votos vencidos. Seriam soluções previamente apoiadas pela sociedade e que, portanto, não admitiriam contestações. Ou seria o caminho para o pacto social, um sonho irrealizado e possivelmente irrealizável do atual presidente?

A verdade é que os dias, as semanas e os meses passam e o governo parece ainda em campanha eleitoral, repetindo reuniões, assembléias, consultas, discursos e manifestações com cheiro de comício. Nem o projeto pioneiro do Fome Zero parece caminhar. Quanto mais as reformas da Previdência, tributária, política e tantas outras.

Esse complicado e lento processo de decisão começou a levantar críticas da oposição, mas já faz eclodirem revoltas no seio das próprias forças governistas. O presidente da Câmara dos Deputados, petista João Paulo, criticou o governo por não pautar o Congresso, perdendo tempo “batendo cabeças”, sem formular propostas concretas ao Poder Legislativo. José Genoíno, na qualidade de presidente do PT, saiu em defesa do governo e de seu partido, dizendo que cabe ao presidente da Câmara presidir e não decidir.

Os arrufos foram abafados, mas já surgiram outros parlamentares e políticos, a maioria do próprio governo, repetindo as mesmas críticas.

Defensores argumentam que o governo não está parado, tanto é que conseguiu eleger o presidente da Câmara. Uma desculpa esfarrapada, pois, como bem disse Genoíno, presidir não é decidir e o País precisa é de decisões. Outra decisão tomada e anunciada com trombetas foi, na revoada de prefeitos a Brasília, a liberação de recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço para obras de saneamento nas cidades do interior. Só que logo se descobriu que o conselho curador do FGTS já havia aprovado a liberação desses recursos em dezembro, no fim do governo Fernando Henrique Cardoso. Isso não tira o mérito de os recursos serem liberados neste governo, mas sem dúvida empana a providência como decisão governamental.

Os atuais dirigentes do País estão esquecendo que, embora seja útil a consulta a especialistas e mesmo a conselhos e entidades organizadas da sociedade, quando é para tomar importantes e urgentes decisões ou formular propostas, a verdade é que o presidente tem mandato. O povo deu-lhe, nas urnas, por esmagadora maioria, uma procuração para gerir a nação. Ou pelo menos o Executivo, acionando o Legislativo e curvando-se apenas às decisões de última instância do Judiciário. Os votos de milhões de brasileiros dispensam tantas assembléias e reuniões, tantos conselhos e consultas, se há efetiva urgência e se o governo sabe o que é para fazer e como fazer. Está na hora de começar a governar.

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