Questão de ordem

Embora o povo coloque a geração de empregos em primeiro lugar, nas prioridades que entende deveriam ser as de Lula, é certo que o governo prioriza a reforma da Previdência. Tem medo do déficit que o atual modelo produz e que cresce assustadoramente, podendo chegar à inviabilização do sistema. Ou melhor, dos vários sistemas hoje vigentes no Brasil, distinguindo funcionários públicos civis, militares, da Justiça, do Legislativo e da iniciativa privada, estes a parte mais sacrificada. A reforma vem sendo discutida mais com palpites do que com estudos concretos e propostas consolidadas. E, diga-se de passagem, dando vazão a muitos preconceitos e até pruridos de lutas de classes.

Essa discussão extemporânea, antes que alguém se sente à mesa para pelo menos esboçar um projeto, está multiplicando inimigos da reforma, ao invés de granjear-lhe adeptos. A situação está se tornando tão difícil para a aprovação da reforma, no tempo recorde desejado pelo governo, que já estão até desenterrando o projeto rejeitado (pelo PT e aliados) de FHC, concluindo que ainda é o mais conseqüente. Existem privilégios e consertos que já poderiam estar sendo equacionados para, desde logo, se transformarem em propostas capazes de reduzir o déficit da Previdência e facilitar a desejada reforma. Um desses privilégios é a aposentadoria precoce, que precisa acabar, pois já está provado que o sistema não é capaz de sustentar aposentadorias e pensões de pessoas idosas, quanto mais de trabalhadores do serviço público civil e militar que param de trabalhar às vezes antes dos 50 anos de idade. Outro é as pensões ainda pagas para filhas de militares solteiras, benefício vitalício que não é dado a filhas de outros trabalhadores. Evidente privilégio que, se não estiver protegido pelo direito adquirido, tem de acabar desde já.

Outra sangria no sistema vem das renúncias previdenciárias, aquela plêiade de entidades às vezes supostamente assistenciais que não pagam contribuições ao INSS. Acrescentaríamos o enorme contingente de trabalhadores informais que produzem, ganham e não contribuem.

Acrescentemos a sonegação, à qual se deve dar um tratamento de verdadeiro crime, com combate sem tréguas. Já para não falar nos desvios e roubalheiras, cujo combate já começou, mas parece tão difícil a recuperação dos bens públicos que enriqueceram um bando de malandros. Pensemos ainda na contribuição patronal do serviço público. Ele é empregador, mas não paga a sua parte, como o faz o empregador da iniciativa privada. E se tudo isso não bastar, que se reestudem as aposentadorias precoces das mulheres, professores e o que mais for necessário, mesmo que isto soe antipático.

Na maioria dos países não existem aposentadorias precoces como no Brasil e sempre há uma aposentadoria complementar, geralmente voluntária, via fundos de pensão. Pois o nosso fundo de pensão (a não ser os abertos das instituições financeiras), parece que nem começou a ser estudado. O que se está procurando não é o consenso. O caminho da dita reforma da Previdência está começando pelos pontos de mais difícil aprovação, como o questionamento do direito adquirido, das justas expectativas de direito, a unificação dos sistemas, nivelando todos os trabalhadores por baixo, via fixação de tetos de aposentadoria minúsculos, que desagradam a um número muito grande de trabalhadores. Número suficiente para barrar a tão necessária reforma.

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