Que existem, existem!

A questão do homossexualismo tratada na atual novela das 8, Mulheres Apaixonadas, está causando polêmica, como era de se esperar. Afinal já aconteceu algo parecido em 1998, durante Torre de Babel (em que Sílvio de Abreu teve que explodir junto com um shopping o casal “alternativo” interpretado por Christiane Torloni e Silvia Pfeifer) e em várias outras novelas que tentaram tocar no assunto de forma séria. Apresentar o homossexual pelo ângulo caricatural nunca gerou a mesma reação. Pelo contrário, sempre deu muito ibope. Basta lembrar a galeria de bichas de Jô Soares e Chico Anysio e de todos os programas de humor que tinham ou que têm nesse tipo o seu ponto forte. O mesmo acontece em novelas, como em Suave Veneno, onde Luiz Carlos Tourinho fez tanto sucesso com a bichinha escrachada Edilberto que foi convidado a ingressar no extinto Sai de Baixo. O que gera protestos, portanto, não é a presença do homossexual na tv, mas o fato de ele ser tratado com seriedade.

O destino de Rafaela (Aline Moraes) e Clara (Paula Picarelli), as duas adolescentes lésbicas em Mulheres Apaixonadas, segundo a Folha de S. Paulo, será decidido nas próximas semanas, com a pesquisa que a emissora fará com telespectadores para avaliar o grau de aceitação das personagens. Até lá, o autor, Manoel Carlos, informa que as jovens continuarão “no armário”, apesar das evidências, como a troca de carinhos e as manifestações de ciúmes. Ou seja, dependendo do resultado ou somente da pressão de executivos globais, poderão ser sumariamente “executadas”.

O argumento de quem condena cenas como as de Rafaela e Clara, mesmo com a sutileza com que vem sendo tratadas, é que seriam mau exemplo aos jovens. Esses censores não percebem que homossexualismo não se “passa” dessa forma, nem de outra. Ou se é ou não. Existe desde que o mundo é mundo. E mesmo que se negue, continuará existindo, assumido ou não. E por existir deve estar nas tramas televisivas que pretendam retratar a realidade.

Todo tipo de segregação deve sempre ser combatido, pois denuncia o desrespeito à diversidade, que é o germe do totalitarismo e raíz de todas as guerras. Por isso, ao lado dos judeus, os homossexuais também foram perseguidos e mortos, sendo ainda hoje vítimas dos skinheads e outros neonazistas. Sem acabarmos com todas as segregações nunca teremos um mundo justo e pacífico.

A novela acerta ao enfocar um tema que todos vemos no dia-a-dia, mas que permanece tabu na tv. Entre os próprios artistas, assumir a homossexualidade é para poucos. Imagine quantos Rock Hudsons e Mazzaroppis já passaram ou passam a vida real encenando. Ao invés de nos afrontarmos com eles na tv, deveríamos lutar pela inclusão de outros grupos discriminados, como os negros, os portadores de deficiências e até os pobres e miseráveis, estes sempre alijados das tramas classe média de Manoel Carlos.

Apesar disso, o autor é um dos mais antenados com a atualidade urbana. Talvez seja a cria mais legítima da novela Beto Rockfeller, de 1968, quando Bráulio Pedroso revolucionou a teledramaturgia nacional ao tratar pela primeira vez da realidade brasileira. Muitos, porém, querem voltar às tramas irreais da cubana Glória Madagan.

Douglas de Souza

(domingo@parana-online.com.br) é editor de Cidades e Jornal da TV em O Estado.

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