Processo do mensalão

No mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal começou a examinar a admissibilidade ou não do processo contra quarenta envolvidos no escândalo do mensalão, autoridades do Rio de Janeiro, em cerimônia pública, pediam desculpas a um jovem estudante morador de uma favela por ter sido preso sob a acusação de ser traficante de drogas, quando na realidade foi alvo de arbitrariedade policial.

Referimos os dois fatos concomitantes porque para um jovem pobre, estudante favelado, há a presunção de culpabilidade. Ele apresentava evidentes indícios de que fora autor do crime de tráfico de entorpecentes, pois era pobre, negro, morava numa favela e foi pego no fogo cruzado entre bandidos e policiais. E quem está nesse meio ou é criminoso ou alvo de balas perdidas. Desgraçadamente, esta é a realidade que vivemos.

Já no Supremo Tribunal Federal, dois ex-ministros do governo, vários deputados federais, altos funcionários e diretores de um banco, donos e funcionários de empresas de publicidade, o marqueteiro da campanha petista e a alta direção do PT exigiam a presunção de inocência.

Queriam porque queriam, num ato da suprema corte que visava apenas decidir se os fatos denunciados pela Procuradoria Geral da República eram indícios suficientes de que houve mensalão e gente envolvida nesse processo de corrupção ativa e passiva, que desde logo se presumisse sua inocência. De José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares e uma penca de outras pessoas influentes, inclusive ex-ministros, todos exigiam que previamente fossem considerados inocentes. Para eles, nada justificava o processo, embora a decisão requerida não condenasse nem absolvesse ninguém. Era uma mera prévia. Ao longo do processo, uma vez admitido, sobrarão oportunidades de ampla defesa. E o que não faltam para esses componentes do que o procurador-geral qualificou de quadrilha criminosa são advogados, escora política e colarinhos brancos. Os próprios e os que estão nas bases situacionistas prontos para defendê-los e procurar inocentá-los. Um pobre pode ser preso e acusado, condenado perante a opinião pública sem culpa formada. A politicalha quer que se acredite em sua inocência e não só até prova em contrário, pois nem admite que esta seja produzida.

Felizmente existe neste País uma instituição chamada Ministério Público. Há o federal, que atua no caso do mensalão, um esquema para comprar votos e apoios para o governo, e os ministérios públicos estaduais, que na sua jurisdição devem defender os interesses da sociedade e indigitar os que contra eles atentam. Se não, teríamos de aceitar que não houve o mensalão, quando todos dele tomaram conhecimento e foi até confessado tanto por quem pagou quanto por quem recebeu. Negar a existência do crime e de que muitos o praticaram é zombar das leis, da Justiça e das instituições. Já basta termos de acreditar que nessa história toda o presidente da República sai ileso porque de nada sabia…

Não se deseja que num caso tão rumoroso e que já havia levado à nação a frustração de ver as ridículas absolvições ocorridas no plenário da Câmara dos Deputados, ao som de um samba mal dançado por uma deputada obesa de espírito corporativo, ocorram condenações sem provas. Poderá haver, e muito provavelmente haverá, dentre os quarenta indigitados, alguns que escaparão pela necessária razão de que não se deve condenar ninguém sem provas suficientes. O que não se pode admitir é a lavagem da honra do governo, do Congresso e das instituições públicas manchadas com essas negociatas de compra de apoios e votos antes de um julgamento adequado, com amplo direito de defesa, plena ação do Ministério Público e da Polícia Federal.

Há no processo instaurado no Supremo a esperança de que o escandaloso caso do mensalão, no final, não acabe como mais um gigantesco escândalo. Escândalo tão grande como nunca na história deste País, desde a proclamação da República, se viu. Nem tão vergonhoso.

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