Vannuchi: é hora de reconhecer erros do debate eleitoral

O ministro da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, voltou a criticar a polarização da questão dos direitos humanos nas eleições presidenciais, principalmente o debate sobre o aborto, e disse ter a “impressão” de que o tucano José Serra, derrotado no pleito de outubro, vai reconhecer seu erro de estratégia na campanha. “Houve um equívoco do Serra, e equívocos acontecem com importantes dirigentes. Tenho a impressão de que ele vai se dar conta disso”, afirmou hoje, durante o lançamento do 4.º Relatório Nacional sobre Direitos Humanos no Brasil, produzido pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP).

Vannuchi criticou a abordagem de temas como aborto e união civil homossexual na campanha e disse que agora, passado os debates, é o momento de reconhecer os equívocos. “É inadmissível ter momentos de fundamentalismo com uma regressão medieval”, afirmou.

Em seus últimos dias como ministro, Vannuchi disse que o aborto clandestino leva 250 mil mulheres à internação por ano no Brasil devido a complicações na interrupção da gravidez. Depois, alegou que o Estado não pode ser regido por crenças religiosas. “Uma coisa é a palavra de Deus e outra é a interpretação que os doutores fazem dessa palavra de Deus. Ou aprendemos a relativizar a noção de verdade ou teremos o que houve em relação ao Plano Nacional de Direitos Humanos”, disse o ministro, ao se referir às críticas ao plano, que aguarda aprovação do Congresso.

Relatório

O levantamento apresentado hoje pelo Núcleo de Estudos da Violência revela que a distribuição de renda, a morosidade da Justiça (80% dos processos seguem em primeira instância), a violência, a discriminação racial e a situação social de mulheres, afrodescendentes e índios ainda são entraves para a garantia dos direitos fundamentais no Brasil. “Temos avanços, mas temos enormes desafios que demandam novas políticas”, comentou o ministro.

O documento elogia as políticas de direitos humanos nas gestões do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, principalmente as melhoras no combate ao tráfico de pessoas, implementação de políticas para crianças e adolescentes, programas sociais de geração de renda, luta contra a tortura e o direito “à memória e verdade” por meio do Plano Nacional de Direitos Humanos.

“Entre as várias iniciativas inovadoras desse programa, está a proposta de preparação de um projeto de Comissão da Verdade, no bojo do processo desencadeado pelo reconhecimento da responsabilidade do Estado brasileiro pelas graves violações de direitos humanos cometidas na ditadura militar”, destaca o documento.

O relatório critica a repercussão do 3.º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), lançado em dezembro de 2009. “As reações violentas e desinformadas que acolheram na chamada classe política o PNDH-3 foram uma demonstração clara dessa resistência (…). Parece que muitos políticos temem que o apoio aberto à promoção e proteção dos direitos humanos possa significar um enfraquecimento de suas posições conservadoras nas campanhas eleitorais, ou ainda a extensão de direitos, muitas vezes considerados privilégios, a parcelas da população que, segundo eles, não se enquadrariam na categoria ‘cidadãos de bem'”, ressalta o documento.

O relatório foi produzido com base em informações sobre violações de direitos humanos repassadas por governos estaduais e organizações não-governamentais (ONGs). O documento, que avalia a questão em cada Estado, não aborda, por falta de informações oficiais, a questão da inclusão de deficientes físicos e violência de cunho homofóbico.